O castigo dos vencedores
Neste domingo, 1 de Julho, entraram
em vigor os primeiros aumentos de preços de energia, as ditas tarifas
transitórias, imposta pela ERSE, que visam obrigar os consumidores de energia
(gás e electricidade) a transitar para as tarifas liberalizadas.
«EDP - Sinta a nossa energia...» |
Esta imposição sobre as tarifas
reguladas é prova evidente do capitalismo autoritário em vigor, porque impõe um
castigo económico a quem quiser resistir à liberalização e se quiser manter nas
tarifas herdadas do serviço público. É ainda mostra da mentira descarada das
virtudes da concorrência: se a desregulação e privatização da energia é tão
favorável no mercado porque é que é preciso obrigar, por decreto, que as
tarifas reguladas sejam ainda mais caras do que as liberalizadas?
Mais, mesmo com estes aumentos
impostos, mesmo com os propagandeados planos de desconto e promoção para adesão
ao mercado liberalizado, as tarifas bi-horárias reguladas ainda continuam a ser
mais favoráveis. Como é expresso em vários trabalhos públicos, a comercialização
de energia apenas terá uma margem de 3%. Ora quem quer usar, aquilo que deveria
ser um serviço público, a energia como um mero negócio quer margens de lucro
seguras. Como vivemos na ditadura dos mercados, em particular financeiros, a
ERSE, que é tão isenta como a Autoridade da Concorrência, impõe artificialmente
a destruição das tarifas reguladas através de aumentos de preço trimestrais.
Extraordinário ver a GALP, de Amorim
e Isabel dos Santos, parte integrante do concubinato que mantém os preços dos
combustíveis elevadíssimos, parte integrante de uma das maiores mentiras do
país: a concorrência nos combustíveis, entrar como comercializador no mercado
da energia lançando uma promoção com descontos. Porque é que a GALP nunca fez
descer os preços do gás, gasolina e gasóleo se estava em plena concorrência? Em
rigor, isto é apenas parte do plano de espoliação da população através da
energia.
Mesmo em plena concorrência, os
preços não descerão porque:
i)precisarão de assegurar pelo menos
parte das chamadas rendas excessivas,
ii) precisarão de assegurar margens de
lucro à plena entrada da mercantilização da energia e
iii) criar-se-ão mercados
bilaterais (o produtor é o mesmo do comercializador) e os comportamentos
oligopolísticos de mercado repetirão, em Portugal, aquilo que
aconteceu na Alemanha, França, Reino Unido… Esperemos que, a exemplo dos
mercados do crude e matérias primas, os especuladores financeiros não decidam
atacar o mercado da energia elétrica…
Como demonstro no artigo “EDP, o mau da fita?”, o
PS deve ser considerado o campeão desta vitória liberal. “O programa
de privatizações para o biénio 96/97 aprovado pelo XIII Governo Constitucional,
do PS de António Guterres, é decisivo.
O socialismo já tinha sido metido na
gaveta, estava na hora de gritar: ‘todo o poder aos mercados’. A 1ª fase de
privatização da EDP ocorreu em Junho de 1997 [Dec.Lei de Abril 97],
e tal como as seguintes, as 2ª, 3ª e 4ª fases são decididas por António
Guterres e consentidas por Jorge Sampaio. Na 5ª fase estão Santana Lopes e
Jorge Sampaio. Na 6ª fase estão José Sócrates e Jorge Sampaio.
Na 7ª fase
estão José Sócrates e Cavaco Silva. E nesta última Passos Coelho e Cavaco Silva. Em
jeito de humor negro, poderemos dizer que o PS ganha ao PSD por 12-4. De facto, o PS tem
sido até agora o campeão das privatizações”.
As receitas das privatizações como
financiadoras do défice do Estado é outra burla. Como demonstro no referido
artigo, “as várias fases de privatização da EDP renderam ao Estado cerca de 10.788 milhões de euros. Ora acontece
que, se somarmos apenas os resultados líquidos da EDP para o mesmo período,
eles rondarão os 9.350 milhões de euros”.
Em cumprimento das directivas troikianas em que PSD, CDS e PS se abraçaram, o
direito do acesso à energia vai ser negado aos mais pobres, a tarifa única
nacional - igual numa aldeia do interior ao centro de Lisboa - vai estiolar e a tarifa social
vai ser uma caridade mínima suportada no máximo de requisitos e
demagogia populista.
Chegámos ao fim de uma das mais
históricas conquistas de Abril, o serviço público de energia está destruído. PS,
PSD e CDS estão de parabéns!
Victor Franco
Membro
da Comissão de Trabalhadores da EDP-Distribuição