teologia para leigos

28 de janeiro de 2011

A PARÁBOLA DO SEMEADOR - MT 13

«ora 100, ora 60, ora 30…»

Mateus 13:1-30

A Parábola do Semeador
que saiu a semear em nós




Todos nós balanceamos entre três estados.
Viver o dia-a-dia é uma trajectória pendular que pode balancear-se entre um quotidiano instintivo sem perguntas, um ‘ser em trânsito’ (e sua intermédia tensão existencial instável) e um ir ou não ao extremo angustiante dum desejo de perfeição buscado a ferros. Mas todos já experimentamos que, quando tomamos um café ou ‘bebemos um copo’ com os amigos ou cantamos mudamos de um destes apeadeiros a outro num instantinho. O quanto ‘um copo’ pode desobjectivar e ‘cidrar’ a verdade do que se é! O que somos… O que desejamos ser… Como deveríamos ser… Ser perfeito, o que é…

Destes três tempos é feita a nossa vida! A Vida encarrega-se de os amassar (sem prévia autorização nossa) e mesmo eles, em si, sofrem de muita indiferenciação – verdadeiramente, a sua autonomia só existe dentro de uma análise académica.

A expressão «sede justos» deve ser enquadrada. A justeza é um conceito religioso e não evangélico ou teologal – eu sou arisco a tudo o que seja culto, ‘religião’, indignidade, submissão castradora do humano que há em cada ser-divino que somos, genuflexões, persignassões, ‘água-benta’, blá-blá de ladainha anti-poética, busca duma santidade perfeita. O fabuloso pequenino texto de Thomas Merton titulado «Um ideal imperfeito», para mim, diz tudo – a começar pela perfeita ironia do título, condensação do que há de mais genial neste trapista de génio, do Kentucky. Tentei, durante demasiados anos, «ser perfeito» - quanto o tentei e quanto sofri… Merton, porém, avisou-me: essa «estranha e árdua fidelidade» não é mais do que uma «respeitável conformidade», é apenas «sinal exterior de respeitabilidade». Devo admitir – seguindo T. Merton - que «se alguém se concentra na “perfeição”, é provável que se infiltre nele um egoísmo subtil». [Thomas Merton, ‘Vida e Santidade’, p.29]

Na realidade, vivemos «entre o cristal e o fumo» [Henry Atlan], essa zona nebulosa em que ‘o sistema’ são palavras. O que quer dizer: ‘sistema de palavras’? «A questão é que não existem nenhumas ‘simples palavras’. Só há palavras com gestos, ou tom de voz, ou coisas do género. (…) A ideia de que a linguagem é constituída por palavras é um disparate. A linguagem é um sistema de gestos.» [Gregory Bateson, ‘Metadiálogos’]

Pascal distinguia entre «esprit de geometrie» e «esprit de finesse» como duas faces da mesma moeda. Como diria Sartre e Merlau-Ponty, «as palavras são gestos que apontam para as coisas (reais ou ideais). Nós só podemos saber pelo dizer das PALAVRAS. Mas o que as palavras dizem não está só no que dizem.» [Vergílio Ferreira, ‘Conta-Corrente’, vol  I]

Então, que papel especial devemos destinar às palavras?
Sabendo nós que, regra geral, fomos educados a Rezar com palavras (mais do que com gestos), como definir, por palavras, «Perfeição» e «Sede perfeitos como o Pai é perfeito»?

Abramos a Bíblia. Que vemos?  PALAVRAS? Não: PARÁBOLAS!

As «Parábolas do Reino», em Mateus 13:1, começam pela do Semeador e em 14:13 «Jesus alimenta 5 mil pessoas».

Paremos, aqui, nestes dois relatos substanciais. Que nos podem ‘dizer’ eles acerca da perfeição?
Em resumo brevíssimo, retenhamos duas máximas.

1.   As nossas decisões (sobretudo, as mais louváveis e regra geral as mais publicamente louvadas) são sempre indecisões. Todos gostamos de pertencer ao grupo dos que «receberam a semente em terra boa» - isso alimenta o nosso ego… - mas raros são os que gostam que lhes lembrem que «só dão fruto a 30…». Mateus 13:18-23
2.   A comida e sua alegria (o salutante, repousante e saciante banquete de «Jesus com o 5 mil»), é relatada logo a seguir à festança do aniversário de Herodes, a qual é também – reparem no pormenor! – a festa da «tristeza de Herodes». Mateus 14:9

Por agora, sublinhemos paradoxos.
Digamos que o Banquete da VidaJesus alimenta 5 mil», Mt 14:13] quer opor-se ou até fazer frente ao Banquete da MorteHerodes e a execução de João Baptista», Mt 14:1-12].

Bom - que evidência, nisto?

As nossas decisões acontecem-nos - mesmo quando somos catalogados de «boa gente» [v.23, «boa terra»] e temos até algumas certezas acerca de Deus [v.23, ‘ouve’ e ‘compreende’], a verdade é que «esse» (que somos nós) «dá fruto e produz ora cem, ora sessenta, ora trinta»… (o texto não nos diz que dará SEMPRE fruto a cem, SEMPRE a sessenta, SEMPRE a trinta… A expressão ‘ora’ abre inúmeras probabilidades a cada um de nós).
Ou seja, tudo é possível e praticamente tudo nos escapa! Tudo o que é (aos nossos míopes olhos) decisivo, escapa-nos! Como se tal não bastasse, terrível e dramático é sabermos que NÃO SOMOS NÓS quem decreta que terra somos.

Tudo invadido  pelo Mistério! Tudo numa Liberdade líquida! Nada  nosso!

A vida tem destas coisas – veja-se a Parábola ‘O trigo e o joio’, em Mt 13:24 - nem sequer nos é concedida a prerrogativa de mondar o que quer que seja… O texto chega ao cúmulo de dizer: «Deixai um e outro crescer juntos…» [v.30]. Bom! Um Deus assim custa a aturar. «Afinal, com o que é que podemos contar?» - apetece perguntar.

As nossas decisões (aquilo que orgulhosamente carimbamos de nossas… opções) constroem-se sobre o mistério de realidades in-decididas, de teceduras que nos trespassam. Quem é que se arroga o direito de nos pré-formatar a ‘dar só a 30’? Este é o primeiro paradoxo ou máxima. Um osso duro de engolir, não acham?

Quanto ao segundo ‘desgosto evangélico’, quanto à segunda máxima ou paradoxo, a água da alegria mistura-se sempre com o pó da tristeza.
Nós resvalamos frequentemente para o platonismo: é tão fatal como o destino de Narciso – adoramos ‘mundos cor-de-rosa’. Mas a vida encarrega-se de nos ir dobrando a espinha: «Apanhai primeiro o joio e atai-o em feixes para ser queimado;» depois diz: «e recolhei o trigo no meu celeiro.» [Mt 13:30] Frequentemente ficamos sós… a armar feixes! Frequentemente damo-nos conta que estamos feitos num oito… E sós!
Ou seja, a perfeição implica sujar as mãos, coisa de que ninguém gosta: ‘primeiro o joio, só depois o trigo’ - diz o ‘dono da casa’ (v.27)! Será isto adiar a recompensa? Não creio – talvez o seja para sado-masoquistas, não para mim. Este ‘dono da casa’ é mestre em pedagogia, é Mestre em Sabedoria. Ele «sabe-a toda»: não anda à nossa frente a retirar pedras e espinhos do nosso terreno (v.5.7); não escolhe tempos e momentos para nos desafiar (v.19); e até se deixa dormir nas barbas da astúcia dos nossos inimigos (v.25). (Amigo da onça? Calma – também nem tanto… Nada de precipitações. Calma.)

A solidariedade que nos é exigida – por este Deus inquietante – parece pressupor uma complexidade que exige ‘explicações’ (v.18). Afinal, quem julgamos que somos? Somos uma plateia que lê o Livro, mas na realidade, o que existe é uma enorme multidão, uma multidão que se mantem na margem do mal, do mar (Mt 13:2). O único que acolhe, aquele que realmente ajuda e se solidariza não somos nós, nem é quem ‘fala para a multidão’, quem avança uma explicação ‘sobre’ a realidade, quem ‘interpreta’ o que está a acontecer – é, sim, Aquele que «sai de casa e se senta à beira mar» (v.1), Aquele que frequenta os mesmos espaços e se senta na mesma margem onde a multidão está (v.2), Aquele que se serve de analogias, comparações-entre-iguais, Aquele que trabalha a massa que tem diante de si. A perfeição implica sujar as mãos em nós e adoptarmo-nos uns aos outros.
Antes do «trigo», primeiro tocar o «joio». A Alegria misturar-se-à sempre com a tristeza, pois «depois de terminar estas parábolas, Jesus partiu dali.» (Mt 13:53) e, com isso, se cavou o vazio assustador. A tristeza nasce da nossa insegurança acerca de nós próprios: «E agora, que será feito de nós? Que faremos com este ensinamento novo? Que fazer da minha vida?» A Alegria misturar-se-à sempre com a tristeza – «Bem-aventurados os que choram…», pois esses, pelo menos, não andam iludidos a seu respeito.



Todos nós balanceamos: entre o joio e o trigo, entre o difícil e o fácil, entre sair e ficar, entre pensar nos outros e pensar em mim, entre as pantufas e a bota apertada.

Seremos capazes de, uma vez na vida, nos assumirmos por inteiro?
Nos momentos de fraqueza, o que nos acode: a dúvida ou a certeza?

Sejamos verdadeiros (pelo menos no íntimo de próprios, onde só Deus ouve): nos momentos de fraqueza acode-nos sempre a dúvida.
Não vejo nisso mal nenhum – só vejo nisso a verdade da carne e sua força. Fraquezas? Ora bolas… Mas quem é feito APENAS de fortalezas titânicas? Somos humanos ou colossos? Por mim, quero-me de barro – assim; mal cozido e tudo! Quero-me ao colo da fragilidade e de todos os que são como eu: verdadeiramente verdadeiros!
Quanto às ‘certezas sobre Deus’ (e para finalizar) não tenhamos dúvidas: este Deus até de Herodes teve pena!!! (Mt 14:9 «o Rei ficou triste» - di-lo, comovido, o relator em Mateus)

Somos feitos de Decisões in-decididas parentes do barro dessa Alegria íntima – coisas que sempre nos escapam ou irrompem como uma «ruína imprevista» [Sl 35:8].

[todos nós balanceamos - pouco me importa a perfeição dos geómetras: na verdade, nada possuímos… sobretudo ciência que baste e ilumine; aceitam-se confissões ou orações]

pb\

27 de janeiro de 2011

2.MILAGRES OU JESUS? [PAGOLA]

«Dai-lhes vós mesmos de comer» [Mateus 14:13]

A IDENTIDADE HUMANA ARRANCA D”UM LADO-A-LADO ADOPTIVO” DE DÍVIDAS E FOMES


2/5


Partilhar o que temos com os necessitados



Eram dois os problemas mais angustiantes na Galileia: a fome e as dívidas.
Era o que mais fazia sofrer Jesus.
Quando os seus discípulos lhe pediram para os ensinar a rezar; saíram do mais fundo do coração de Jesus duas petições: «Pai, dai-nos o pão necessário»; «Pai, perdoa-nos as nossas dívidas, pois também nós perdoamos aos nossos devedores».

Que podiam fazer contra a fome que os destruía e contra as dívidas que os levavam a perder as suas terras? Jesus via com clareza a vontade de Deus: partilhar o pouco que tinham e perdoar-se mutuamente as dívidas. Só assim nasceria um mundo novo.

As fontes cristãs conservaram a memória duma memorável refeição com Jesus. Foi num descampado e participou muita gente. É difícil reconstruir o que aconteceu. A memória que ficou foi esta: entre as pessoas só recolheram «cinco pães e dois peixes», mas partilharam o pouco que tinham e, com a bênção de Jesus, todos puderam comer.

No princípio do relato há um diálogo muito esclarecedor. Ao ver que as pessoas têm fome, os discípulos propõem a solução mais cómoda e menos comprometida: «Que vão às aldeias e comprem alimento»; que cada um resolva os seus problemas como possa. Jesus responde chamando-os à responsabilidade: «Dai-lhes vós mesmos de comer»; não deixeis os famintos abandonados à sua sorte.

Não podemos esquecer. Se vivemos de costas voltadas para os famintos do mundo, perdemos a nossa identidade cristã; não somos fiéis a Jesus; às nossas refeições eucarísticas falta-lhes a sua sensibilidade e o seu horizonte, falta-lhes misericórdia. Como se transforma uma religião, como a nossa, num movimento de seguidores de Jesus?

1.   Primeiro, é não perder a sua perspectiva fundamental: deixar-nos afectar mais e mais pelo sofrimento dos que não sabem o que é viver com pão e com dignidade.
2.   Segundo, comprometermo-nos em pequenas iniciativas, concretas, modestas, parciais, que nos ensinam a partilhar e nos identificam mais com o estilo de Jesus.

J A PAGOLA




3.MILAGRE DA MULTIPLICAÇÃO [PAGOLA]


«Dai-lhes vós mesmos de comer» [Mateus 14:13]

Jesus não multiplicou (não à propaganda-espectáculo)
Jesus deu (democracia) & mandou distribuir (compromisso social/político)


3/5

Criar Fraternidade

Um provérbio oriental diz que «quando o dedo do profeta aponta a lua, o estúpido fica a olhar o dedo». Algo de semelhante se podia dizer de nós, quando nos fixamos exclusivamente no carácter portentoso dos milagres de Jesus, sem chegar até à mensagem que encerram.

Porque Jesus não foi um milagreiro dedicado a realizar prodígios propagandísticos. Os seus milagres são, antes, sinais que abrem uma brecha neste mundo de pecado e apontam para uma nova realidade, meta final do ser humano.
Concretamente, o «milagre da multiplicação» dos pães convida-nos a descobrir que o projecto de Jesus é alimentar os homens e reuni-los numa fraternidade real em que saibam partilhar o seu «pão» e o seu «peixe» como irmãos.
Para o cristão, a fraternidade não é uma exigência ao lado de outras. É a única maneira de construir, entre os homens, o reino do Pai. Esta fraternidade pode ser mal entendida. Com demasiada frequência a confundimos com um «egoísmo vivaz que sabe comportar-se decentemente.» (Karl Rhaner)
Pensamos que amamos o próximo simplesmente porque não lhe fazemos mal, apesar de vivermos num horizonte mesquinho e egoísta, despreocupados de todos, movidos unicamente pelos nossos próprios interesses.

A Igreja, enquanto «sacramento de fraternidade», está chamada a animar, em cada momento da história, novas formas de estreita fraternidade entre os homens. Nós, os crentes, devemos aprender a viver um estilo mais fraterno, escutando as novas necessidades do homem actual.

A luta a favor do desarmamento, a protecção do meio ambiente, a solidariedade com os povos que passam fome, o partilhar com os desempregados as consequências da crise económica, a ajuda aos toxicodependentes, a preocupação pelos idosos sós e abandonados… são outras tantas exigências para quem se sente irmão e quer «multiplicar» para todos o pão de que necessitamos para viver.

O relato evangélico recorda-nos que não podemos comer tranquilo o nosso pão e o nosso peixe enquanto, junto a nós, há homens e mulheres ameaçados por muitas «fomes». Nós que vivemos tranquilos e satisfeitos devemos ouvir as palavras de Jesus: «Dai-lhes vós mesmos de comer».

J A PAGOLA

25 de janeiro de 2011

4.O QUE SOBRA, PERDE-SE [PAGOLA]

«Dai-lhes vós mesmos de comer» [Mateus 14:13]

A PALAVRA DESVINCULA DA SERVIDÃO;
TUDO QUE SE LIBERTE, SOBRA E DERRAMA-SE…


4/5


A MURALHA EUROPEIA


Uma imensa marcha de africanos, latino-americanos e gentes de Leste aproxima-se há anos da Europa, empurrados pela fome e pela miséria. Em 1989 foram catorze milhões. Hoje são muitos mais.

A Europa, no entanto, não está preparada para responder, de forma solidária, a este desafio do nosso tempo. Esta sociedade europeia, que alicerçou a sua prosperidade em séculos de exploração colonial, vive demasiado cómoda e confortável para acolher, sem medo, estes homens e mulheres que procuram sobreviver entre nós. De imediato renasceram os sentimentos racistas e de rejeição dos estrangeiros. A partir dos meios de comunicação social, alimenta-se uma opinião pública que, com frequência, apresenta os emigrantes como delinquentes, perigosos, usurpadores dum trabalho relativamente escasso. Mas, sobretudo, vai-se construindo, pouco a pouco, uma grande muralha que nos defenda do perigo. Tomam-se medidas firmes de controlo sobre o movimento dos estrangeiros. Implementa-se a política de repatriações e expulsões. Favorece-se a negação sistemática de legalizar a situação a emigrantes e refugiados. Esta insolidariedade é apresentada aos cidadãos como defesa dum «umbral de tolerância» que é necessário salvaguardar, para que não se rompa o nosso equilíbrio socioeconómico.

O relato evangélico dos pães é exemplar.
Os discípulos, julgando que não há pão suficiente para todos, pensam que o problema da fome se resolverá fazendo que a multidão «compre» alimentos. A este «comprar», regido pelas leis económicas, Jesus opõe o «dar» generoso e gratuito: «Dai-lhes vós mesmos de comer».

De imediato, recolhe todas as provisões que há no grupo e pronuncia as palavras de acção de graças. Desta maneira, o pão desvincula-se dos seus possuidores para se considerar dom de Deus e para o repartir generosamente por todos os que tinham fome. Este é o ensinamento profundo do relato. «Quando se liberta a criação do egoísmo humano, sobra para cobrir a necessidade de todos».

A Europa tem necessidade de recordar que a terra é de todos os homens e que não se pode negar o pão a nenhum pobre faminto. Há suficiente pão para todos se soubermos partilhá-lo de maneira solidária. Longe de despertar racismos e xenofobias, deve educar-se, na solidariedade, a opinião pública e devem promover-se, sobretudo, programas de ajuda e cooperação que vão libertando os países da fome e da sua prostração económica.

J A PAGOLA

24 de janeiro de 2011

5.ABENÇOAR A MESA [PAGOLA]

«Dai-lhes vós mesmos de comer» [Mateus 14:13]
UM PAÍS COSTURA-SE À MESA 


5/5

Como abençoar a mesa


Quase sem nos darmos conta e empurrados por diversos factores, fomos desumanizando, pouco a pouco, esse gesto tão íntimo e humano que é sentarmo-nos à mesa para comer juntos.

A comida tornou-se, para muitos, em algo puramente funcional que é necessário realizar de maneira rápida e precisa, dentro duma jornada laboral. Cada vez é mais raro esse momento privilegiado de encontro familiar à volta da mesa. Em muitos lares, essa mesa, feita para ser rodeada por pais e filhos, já não serve para que eles se encontrem, partilhem as suas vidas e descansem juntos.

Outros vão-se habituando a «alimentar o seu organismo» nessas refeições impessoais dos restaurantes ou no recanto do self-service de turno. Alguns vêm-se obrigados a participar em banquetes protocolares ou de trabalho, onde o gesto amistoso de comer juntos é substituído pelo interesse, pelo protagonismo ou ostentação.

O gesto de Jesus convidando as pessoas a recostarem-se e a partilhar uma refeição simples, bendizendo a Deus pelo pão que receberam, pode ser um chamamento para nós. Como expõe, com certa graça, Xabier Barsuco no seu estudo Compartir el pan, comer é muito mais que «introduzir uma determinada ração de calorias no organismo».

A necessidade de nos alimentarmos é, antes de mais nada, sinal da nossa indigência radical.

Obscuramente, vamos percebendo que não nos bastamos a nós mesmos. Na realidade, vivemos recebendo, alimentando-nos de uma vida que, através da terra, se nos oferece em cada dia a cada um.

Por isso é um gesto profundamente humano recolher-se antes de comer para agradecer a Deus esses alimentos, partilhando a sua mesa com familiares e amigos.

Comer juntos é confraternizar, dialogar, crescer em amizade, partilhar a dádiva da vida. Por isso, é tão difícil dar graças a Deus quando uma pessoa tem mais alimento do que é necessário, enquanto outros sofrem miséria e fome.

Sentimo-nos acusados por aquelas palavras de Gandhi: «Tudo o que comes sem necessidade estás a roubá-lo ao estômago dos pobres». Talvez nos países do bem-estar, devamos aprender a abençoar a mesa doutra maneira: dando graças a Deus, mas, ao memso tempo, pedindo perdão pela nossa insolidariedade e tomando consciência da nossa responsabilidade perante os famintos da Terra.»

J A Pagola

[a mesa é a tábua de «passar a ferro» de tudo...] [um país que não convida está deprimido...] [sem pão não pode haver gente à 'mesa das palavras', nem LIBERTAÇÃO]

23 de janeiro de 2011

UM PLANO PARA O PAÍS [MANUELA SILVA]

os Cristãos e o Voto Político
«que a tua linguagem seja 'sim-sim' e 'não-não'»

Os cristãos deveriam exigir aos candidatos uma resposta curta ‘sim-ou-não’ às questões mais agudas do nosso país. Do género: «os imigrantes são para integrar, sim ou não?», «o Serviço Nacional de Saúde é para manter universal e gratuito, sim ou não?», «a miséria é inconstitucional, sim ou não?» e muito mais!
A Igreja deveria ser "Luz-no-mundo” ['do Mundo' é ambíguo... pois pode sugerir 'para' o mundo], rosto erguido e não manha espertalhuça; deveria ser Profeta-(feita-)de-Pobres, não sistema nem estrutura, deveria ser proximidade adoptada, Comunidade não VOLUNTARISTA, nem POPULISTA, nem sequer mera Autoridade que apenas ‘espeta farpas’, discursa, arregimenta, elabora relatórios ou ‘até-diz que’

A Igreja católica deveria ser
Igreja Católica!


Recapitulando

«Talvez hoje se venha a saber quem será, nos próximos anos, o chefe de estado. Seja como for, difícil mesmo será saber que estado pretendemos ter nos próximos anos. Num texto, não muito recente, mas de actualidade intacta, publicado no blogue A Areia dos Dias, da Comissão Nacional Justiça e Paz, a economista Manuela Silva pedia que não se passasse ao lado dos “verdadeiros desafios que o País atravessa no indispensável acertar do caminho para um desenvolvimento sustentável, base de consolidação da própria democracia”.

O cerne da crise, segundo a economista, e ao contrário daquilo que amplamente se diz, não reside “numa despesa pública excessiva ou na falta de competitividade da nossa economia no mercado mundial”. Manuela Silva nota que “é deste olhar míope que se parte”, no primeiro caso, “para fomentar a crença de que são inevitáveis cortes nas despesas do Estado (redução de serviços e prestações sociais, deslocalização de serviços públicos para o sector privado e mercantil, mais privatizações; alienação de capitais públicos)”; no segundo caso, para se dizer que tudo se resolveria baixando impostos, reduzindo salários e multiplicando os incentivos do Estado às empresas”.

A economista julga que se impõe um esforço de planeamento concertado, sem o qual não é vislumbrável uma saída para esta crise, que se diz ser de desequilíbrio das contas públicas, mas que, acrescenta Manuela Silva, “em boa verdade, é uma crise estrutural e com raízes muito fundas, só podendo ser enfrentada no quadro de uma visão compreensiva da realidade e assente em opções que reúnam um largo consenso nacional”.

É, pois, urgente promover uma estratégia de desenvolvimento nacional que tenha na devida conta diversos eixos fundamentais, que Manuela Silva apresenta e em que vale a pena reparar. São eles os seguintes:

1.   A reestruturação do papel do estado, nomeadamente no que se refere à definição das respectivas funções, serviços que deve prestar e papel a desempenhar na orientação geral da economia;
2.   Os objectivos e as metas de um desenvolvimento humano sustentável (em vez da discussão em torno do mítico indicador de crescimento do PIB) e respectivo planeamento a prazo, sem esquecer a política de valorização da agricultura e da floresta, a política industrial, o encaminhamento para a economia baseada no conhecimento, a valorização de recursos próprios como os recursos marítimos, o turismo, as potencialidades das energias renováveis ou as capacidades tecnológicas já disponíveis;
3.   O aperfeiçoamento do sistema de saúde e prestação de cuidados generalizados e com qualidade a toda a população;
4.   A orientação do sistema educativo, com o que tal comporta de definição de prioridades em matéria de conteúdos, de recursos a disponibilizar e de condições de uma gestão eficiente;
5.   A qualidade da justiça e a capacitação do sistema de justiça para enfrentar os novos desafios da corrupção e criminalidade económica, da delinquência juvenil, das organizações mafiosas e seus tráficos ilícitos de armas, drogas, ou tráfico humano;
6.   O ordenamento do território, as acessibilidades, a reabilitação urbana e, de modo geral, a correcção das grandes desigualdades de oportunidades a nível regional, que continuam a ensombrar a coesão nacional;
7.   A correcção das desigualdades na apropriação da riqueza, nos níveis de remuneração do trabalho, na fiscalidade, que ofendem os direitos de cidadania;
8.   A erradicação da pobreza, nomeadamente no que se refere à pobreza infantil, quebrando definitivamente o elo de transmissão geracional da pobreza e pondo termo a esta grave violação de direitos humanos;
9.              A criação de condições favoráveis à conciliação da vida profissional com a vida pessoal, familiar e cívica;
10.              A definição de objectivos e metas de uma estratégia de sustentabilidade ambiental.

Para que seja possível obter resultados concretos que viabilizem a definição de um plano estratégico de desenvolvimento para os próximos 4-5 anos, estas são, no entender de Manuela Silva, algumas questões que merecem um amplo e urgente debate.

É esse debate que está por fazer e que importa dinamizar.»

Eduardo Jorge Madureira

In,  [osdiasdasemana@gmail.com]

Braga: Janeiro 2011

22 de janeiro de 2011

«EU VIM DE LONGE» - ZÉ MÁRIO BRANCO [VÍDEO]

«Os Pretendentes não apareceram logo em cena. Durante os primeiros nove ou dez anos da ausência do Ulisses sabíamos onde ele estava – em Tróia – e sabíamos que ainda estava vivo. Não, eles não começaram a cercar o palácio senão quando a esperança tinha enfraquecido e vacilava…»

PORTUGAL – cantilena
com sabor a ladainha eterna…

[a Odisseia de Penélope]

José Afonso - Os Vampiros (ao vivo no Coliseu)

Zeca Afonso - Vejam Bem

Menina dos Olhos Tristes - Adriano Correia de Oliveira

Uns vão bem e outros mal. Fausto. Portugaliza

Eu vim de longe – Zé Mário Branco

José Mário Branco FMI farto do «é p'ra_manhã»
lmdoliveira 9 vídeos Subscrever Subscrito

José Mário Branco - Inquietação

José Mário Branco e Sérgio Godinho - O charlatão

Cantiga do Desemprego. Song of Unemployment. Fausto
oleiros70 356 vídeos Subscrever Subscrito

THE BEATLES - Revolution is possible

[no final desta anémica liturgia política, ainda será possível ter ganas de sonhar...?]
[a UTOPIA ainda existe? Onde... em que mapa?]
[a Revolução é possível?]
[será possível casar a Revolução com a Construção do Mundo Novo e levar flores nos cabelos...?]
[que é feito dos nossos músicos: deprimiram? A Trompete deprimiu? o Saxofone deprimiu? e os seus filhotes, também: o pífaro pifou...?]
[a coisa tá preta...]
todos p'á rua cantar: «Here comes the Sun...» Já!!!
George Harrison Playing Here Comes The Sun

John Lennon - stand by me

The Beatles - Hey Jude (HQ)

The Beatles - Revolution [HQ]

The Beatles - Strawberry Fields Forever

Lucy in the Sky with Diamonds (The Beatles)

The Beatles - All You Need is Love (HQ)

21 de janeiro de 2011

RISO PÚBLICO, VIDAS PRIVADAS

campanha política  depressão  riso

Re/ 5 vídeos ao dia
(um a cada refeição,
se possível antes & depois…)


A ‘depressão’ abateu-se como uma espada – Janeiro destinou-se a preparar a recepção psicológica ao ‘recibo’... Quantas vezes, este mês, já imprimiste, na Caixa Multibanco, o talão para saber do Saldo que aí vem? Curiosamente, no ‘meu’ hospital, a depressão abateu-se mais sobre os mais ricos, os que se deslocam em bons jipes, vivem entre martas e visons, desconhecem a palavra ‘avariado’. O mesmo não consigo verificar no rosto dos operários mais mal pagos e que, ainda por cima, vivem pior e mais longe do hospital. Os primeiros deixaram de tomar café nas caixas automáticas; os segundo continuam a encontrar-se aí, fumam, tomam dois e três cafés, comentam alto - o futebol e o crime de Nova York, dizendo: ‘mas ele até podia ter chamado os  bombeiros com aquilo na mão e não pediu; ah, de facto não dava lá muito jeito…’, e soltam gargalhadas.

Porque será isso?
Avanço uma explicação inspirado pela pluma-pensante de Slavoj Zizek. [in, ‘Da Tragédia à Farsa’, 2010, Relógio d’Água]

«Num artigo publicado na Newsweek, Emily Flynn Vencat e Gianne Bronwell descreveram como, hoje em dia, ‘o fenómeno «reservado aos membros» explode dando lugar a todo um modo de vida, englobando um conjunto que vai das condições bancárias personalizadas às clínicas de manutenção só para convidados… as pessoas com dinheiro optam cada vez mais por uma vida à porta fechada. Em vez de participarem em eventos fortemente mediatizados, organizam a título privado concertos passagens de modelo, exposições de arte que têm lugar em casa. Vão às compras fora dos horários de funcionamento normal das lojas e escolhem os seus vizinhos (e amigos potenciais) segundo critérios de condição social e nível económico. ‘ [Newsweek, 10:12:2007]

Emerge assim uma nova classe global cujos membros possuem, ‘por exemplo, um passaporte indiano, um castelo na Escócia, um pied-à-terre em Manhattan e uma ilha privada nas Caraíbas’.

O paradoxo é que os membros desta classe global «jantam em privado, vão às compras em privado, admiram obras de arte em privado, fazendo tudo em privado, privado, privado’.’Estão deste modo a criar um mundo-de-vida próprio e à parte tentando resolver o problema hermenêutico que os angustia: como diz Todd Millay, ‘as famílias muito ricas simplesmente não podem convidar outras pessoas e esperar que estas compreendam o que é ter-se 300 milhões de dólares’.

Que contactos mantêm, então, com o resto do mundo em geral? Esses contactos assumem duas formas: os negócios e o humanitário (proteger o meio ambiente, combater a doença, apoiar as artes, etc.). Os novos «cidadãos globais» passam a maior parte do tempo no meio duma natureza sem mácula – a fazer trekking na Patagónia ou a nadar nas águas límpidas das suas ilhas privadas. Não podemos deixar de nos dar conta de que um traço fundamental da atitude destes super-ricos entrincheirados nas suas fortalezas é o medo: medo da vida social no exterior enquanto tal. As prioridades mais urgentes do «grupo dos excepcionalmente ricos» são, portanto, minimizar as ameaças à sua segurança: doença, exposição a actos de violência criminosa, etc.» [fim da citação de Slavoj Zizek]


Sendo assim, como lhes é possível saírem juntos para o meio do povo, beber um copo e apanharem uma «barrigada de riso»?

O riso é o único remédio para a depressão e o tédio.
E porquê?
Porque ninguém consegue rir a bandeiras despregadas… sozinho – impõe-nos a partilha! O riso é como as cerejas – contagia. Às vezes, apetece não parar. Aumenta a esperança de vida, alarga a caixa torácica, relativiza as dívidas, faz amigos novos, cura as hemorróidas, irriga as faces, aumenta a dopamina, inventa fraternidades onde elas nunca se viram e nem imposto paga, isto para além de permitir que os filhos digam aos pais coisas a que de outra forma nunca se atreveriam… O riso é gratuito (quando não o é, é frete que se faz ao ‘chefe’ e está muito próximo da vénia envernizada da freira frustrada da sacristia…).

O riso pode ser a única  forma perene de fazer crítica política que a tudo resista: resiste ao discurso ideológico do adversário enquanto o corrói ou o bandarilha, e, ao mesmo tempo, fortalece o arrazoado de quem apoiamos pelo simples factos de lhe destapar as fraquezas com souplesse.

O candidato ‘coelho’ terá sido, de entre os candidatos, o único que cuidou da saúde dos portugueses: do coração dos portugueses! O Alberto Jardim, pálido do seu diagnóstico, logo se ressentiu e ficou de molho…

Depois do ‘boto’ [voto], riamo-nos ENTÃO a valer. E bebamos um (um, não…) bebamos dois ou três copos! Que…

Este país é um circo…Vale uma barrigada de riso como esta que vem a seguir [para curar as varizes da alma portuguesa].


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Contemporâneos - Vitor Constâncio
http://www.youtube.com/watch?v=_q-5KlxR4e4

Vasco Jorge Pulido Jesus Valente

Jorge Jesus Cinco Mandamentos

Gato Fedorento - Minicaixotinho

Contemporâneos - O Último Imigrante Em Portugal

Os Contemporâneos - O puto que não tem Hi5, Facebook, Twitter, MySpace...

post by Luís Bateira