teologia para leigos

27 de julho de 2011

FRANCESCO ALBERONI - SOBRE A LIBERDADE E A GANÂNCIA



Já não é possível distinguir
liberdade e poder discricionário




A especulação que sufoca com as suas tenazes estados inteiros forçando-os a aumentar os impostos pagos pelos cidadãos e a despedir funcionários públicos, que provoca o aumento do preço dos cereais levando a fome a muitos países, resulta da ganância.

Ganância por dinheiro, por quantias cada vez maiores, mesmo à custa de prejudicar todos os outros. Em economia já se ensinou que o empresário enriquece através da criação de emprego, melhorando com isso a vida de todos, mas hoje, no mundo globalizado da técnica, isto já não se aplica porque o progresso técnico permitiu que surgissem enormes potências económicas, de total insensibilidade, que tomam aos outros sem nada dar em troca.

E os estados ainda não aprenderam a fazer-lhes frente. Comportam-se como os médicos de outros tempos, que tratavam qualquer maleita com sangrias, enfraquecendo ainda mais o doente.

A palavra "ganância" pode ter sido expulsa da linguagem económica, mas continua a existir na velha linguagem da moral, que condena os excessos e a desmesura, os avarentos como os pródigos, os cobardes como os temerários.

Mas o que caracterizará melhor a modernidade que a desmesura? Desmesura da população, da produção, do lixo. No cinema, nos videojogos, na música, desmesura dos efeitos especiais; desmesura nos concertos rock, na noite, no consumo de drogas, nas máfias que em todo o mundo dominam sectores inteiros da economia. Desmesura nas despesas do Estado, para fins militares ou para todos os que solicitam subsídios injustificados, reformas aos 30 anos e privilégios para políticos de todos os tipos, mesmo que isso obrigue os países a acumular dívidas imensas.

Estou convencido que as dificuldades dos estados em controlar a especulação mundial resultam do próprio facto de termos deixado de dispor das categorias morais que permitiam impor limites entre a liberdade e a arbitrariedade. Ficamos horrorizados quando estudamos a história antiga e vemos que os conquistadores invadiam, saqueavam e destruíam países inteiros, mas assistimos indiferentes à pilhagem económica de um estado e de um povo por outro. Crescemos numa sociedade livre e liberal e isso tira-nos a coragem de dizer que devia ser imposto um limite à livre compra e venda de bens. O princípio parece-nos sagrado, inviolável. No entanto, tivemos a coragem de proibir a compra e a venda de seres humanos, de abolir o comércio de escravos.

Quanto tempo será preciso para arranjarmos coragem de proibir comportamentos que até há bem pouco tempo podem ter sido factores de progresso, mas neste momento se tornaram catastróficos?

Talvez devamos começar por nos convencer de que a ganância e a desmesura são vícios que não podem deixar de nos conduzir à ruína.

Francesco Alberoni, sociólogo
Jornal i-online,
26:VII:2011