O vidente
Primeiro o menino viu uma estrela pousada nas
pétalas da noite.
E foi contar para a turma.
A turma falou que o menino zoroava.
Logo o menino contou que viu o dia parado em cima
de uma lata
igual que um pássaro pousado sobre uma pedra.
Ele disse: Dava a impressão que a lata amparava o dia.
A turma caçoou.
Mas o menino começou a apertar parafuso no vento.
A turma falou: Mas como você pode apertar parafuso
no vento
se o vento não tem organismo.
Mas o menino afirmou que o vento tinha organismo
e continuou a apertar parafuso no vento.
Manoel de Barros, ‘Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo’, Ed. Record [Brasil], 2001
[pintura de Júlio Resende, pormenor]