teologia para leigos

14 de julho de 2011

AUDITORIA À DÍVIDA

BANCARROTA OU DEMOCRACIA?



Não será surpresa para os participantes numa conferência a que assisti recentemente, que o pacote de resgate para a Grécia, aprovado há um ano, não tenha solucionado os problemas da dívida do país.
Organizado pela sociedade civil grega, aquele evento lançou um apelo a que a Grécia, e agora a Irlanda, abram uma discussão pública sobre a dívida e sobre a verdadeira equidade e legitimidade desta.

Activistas do Brasil, Peru, Filipinas, Marrocos e Argentina disseram aos activistas gregos para se manterem firmes e não embarcarem numa devastadora recessão de 30 anos, por imposição de instituições internacionais como o Fundo Monetário Internacional.
O crescente movimento europeu de oposição aos pagamentos da dívida e à austeridade está a estabelecer ligações concretas com grupos do Sul, a nível mundial, e denota uma confiança e uma racionalidade que estão a quilómetros de distância das demonstradas pelos governos da Grécia e da Irlanda, que, para poderem pagar aos banqueiros irresponsáveis, adoptaram políticas que estão a castigar a população em geral. (…)

O comissário europeu para os Assuntos Económicos, Olli Rehn, tem dito aos governos que estes assuntos devem ser tratados com discrição – o debate público é desencorajado.

Aqueles que na prática estão a pagar o preço da austeridade discordam, e os activistas da Grécia e da Irlanda afirmam que o primeiro passo para uma solução justa deve ser uma auditoria à dívida, tendo por modelo as que foram efectuadas em países em desenvolvimento como o Equador.

A auditoria daria aos europeus a informação necessária para fundamentar decisões verdadeiramente democráticas. Como disse a deputada grega Sofia Sakorafa, que se recusou a assinar o acordo sobre o resgate e abandonou o partido governamental PASOK, «a resposta à tirania, à opressão, à violência e à crueldade é o conhecimento».





Andy Storey, do grupo irlandês Afri, disse que uma auditoria visa «desmascarar o sistema financeiro, que controla a economia». Os activistas acreditam que uma auditoria à dívida possa ser o início de uma nova forma de pensar a economia. Como diz Sofia Sakorafa, uma auditoria é o início da recuperação de valores e de uma visão que mostre que, «para além dos jogos de mercado especulativos, há conceitos mais valiosos – há pessoas, história, cultura e há decência».

Esse rejuvenescimento da visão política é crucial para que a crise não venha a causar empobrecimento e a acicatar a hostilidade entre europeus. Recentemente, o economista irlandês Morgan Kelly afirmou que o seu país estava a caminho da bancarrota. Na Grécia, está-se a perder mil empregos por dia e a taxa de suicídios duplicou. [ver programa RTP-1-on-line «Linha da Frente», de 13:VII:2011, sobre a crise e as consequências no estado da doença mental]





O pacote de «resgate» para Portugal, de 78 mil milhões de euros, terá um impacto semelhante. Em todos estes países há uma imensa corrente de emigrantes, que partem em busca de melhores oportunidades. Nenhuma indemnização poderá reparar os estragos que estas políticas vão causar na sociedade. Terá que haver um movimento para compensar a falta de visão dos nossos dirigentes. Sentimos que esse movimento poderá ter nascido em Atenas.


Nick Dearden
Director de Jubilee Debt Campaign

[COUNTER PUNCH, excertos Petrolia, Califórnia, 12:V:2011]
para Courrier International, ed. portuguesa, Julho 2011, p.98