teologia para leigos

10 de maio de 2011

QUE TIPO DE IGREJA QUEREMOS? 7/7

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3.c) Uma Igreja à altura dos desafios históricos

As categorias ‘Povo de Deus’ e ‘Igreja-comunhão’ permitem redistribuir melhor a potestas sacra dentro da Igreja, obriga a redefinir o papel do bispo e do padre, permite que surjam novos ministérios e um novo estilo de vida religiosa incarnada nos meios populares. A Hierarquia é mero serviço interno e não constituição de estratos ontológicos que abre caminho para divisões internas no corpo eclesial com vistas à criação de diferentes ‘classes de cristãos’ (sentido analítico).(…)

No que diz respeito à articulação Reino-mundo-Igreja devemos dizer que aqui se verifica uma forma própria de realizar a dialéctica destas relações.

O Reino é, sim, a utopia cristã que diz respeito ao destino final do mundo. Mas, insiste-se, que ele se encontra em processo dentro da história sempre e lá onde se constroem a justiça e a fraternidade e onde os pobres são respeitados e constituídos em agentes da sua própria história. Portadores do Reino são todos os homens, instituições e práticas que se orientam pelos ideais éticos impregnados pelo espírito do Jesus histórico. A Igreja é um portador qualificado e oficial, mas não exclusivo.

A categoria mundo recebe uma determinação histórica: é o mundo dos pobres, o sub-mundo que deve ser transformado em mundo de convívio humano fraterno; no mundo há Reino e anti-Reino (sub-mundo da miséria) e o Reino constrói-se contra o anti-Reino, cujos agentes podem e devem ser, profeticamente, denunciados. A Igreja propõe-se assumir o sub-mundo e o não-homem para ajudar no processo de libertação integral, contribuindo especialmente com a sua especificidade – com a referência religiosa e sua leitura usando a categoria ‘Reino-de-Deus’, que já está em processo AGORA até que culmine na consumação do mundo.

Parece-nos que, mediante o pacto da Igreja com as grandes maiorias pobres do Continente sul-americano (cujo símbolo maior foi a entrega do anel pontifical do Papa João Paulo II aos favelados do Vidigal no Rio de Janeiro, em Julho de 1980), se descortina, nesse pacto, um caminho novo para a Igreja. Agora, os pobres não são apenas vistos numa perspectiva caritativa e assistencialista, mas principalmente política: são as classes populares, novo sujeito histórico emergente que, provavelmente, decidirá os destinos da sociedade futura. Os pobres estão a aumentar o nível da sua consciência, estão a organizar a suas práticas e a exigir uma sociedade mais participativa e menos elitista. Provavelmente, é nesta direcção que caminhará o processo social. A Igreja, tanto na sua reflexão como na sua prática, (pelo menos na América Latina), está a responder a estas exigências ‘em cima da hora’. Não chega nem atrasada, nem com modelos inadequados. Consegue estar à altura dos desafios. A sociedade latino-americana futura terá uma presença estrutural de elementos cristãos e evangélicos, graças à Igreja que está a ajudar a gerar o futuro. Esta verdade é tão forte que já há analistas que ponderam: uma sociedade latino-americana que não incluir no seu processo, em grau elevado, elementos cristãos será anti-popular. A matriz do povo é cristã; esta matriz está a expressar-se dentro de uma codificação que responde às exigências históricas. É a oportunidade de mostrar todo o seu vigor e toda a sua verdade. É nesta direcção que caminha a esperança e se define o futuro mais promissor da Igreja latino-americana.

Leonardo Boff
Igreja – Carisma e Poder
Ed. Vozes, 1981