teologia para leigos

11 de maio de 2011

QUE TIPO DE IGREJA QUEREMOS? 5/7

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3. A emergência de um novo modelo: a Igreja a partir dos pobres

A partir dos anos 60, em quase todos aos países latino-americanos, começou uma crescente consciencialização acerca dos reais mecanismos produtores do subdesenvolvimento. Este não consiste apenas num problema técnico, nem somente político. É consequência do tipo de desenvolvimento capitalista no interior dos países cêntricos (Atlântico Norte), os quais, para manterem os níveis de aceleração e acumulação a que chegaram, necessitam estabelecer relações profundamente dissimétricas com os países tecnologicamente mais atrasados, mas ricos em matérias-primas. Estes são mantidos no subdesenvolvimento, o qual aparece, então, como a outra face do desenvolvimento. O subdesenvolvimento surge como um desenvolvimento dependente e associado ao desenvolvimento dos países ricos. Esta dependência significa opressão ao nível económico, político e cultural.


A estratégia a longo alcance é conseguir uma libertação que garanta um desenvolvimento autosustentado que atenda às necessidades reais do povo e não ao consumo dos países ricos e dos estratos nacionais associados aos países ricos.


3.a) Uma libertação política e religiosa

O sujeito histórico desta libertação seria o povo oprimido que deve elaborar a consciência da sua situação de oprimidos, organizar-se e articular práticas que intencionem e apontem para uma sociedade alternativa menos dependente e injustiçada. As demais classes podem e devem incorporar-se ao projecto dos oprimidos sem, entretanto, quererem assumir a sua hegemonia. Assim, ocorreu que, a partir dos anos 60, inúmeros jovens, intelectuais e toda uma gama de movimentos surgiram para viabilizar tal libertação. Fizeram uma opção pelo povo: começaram a entrar no continente dos pobres, a assumir a sua cultura, a dar expressão às suas reclamações e a organizar práticas consideradas pelo status quo como subversivas. Não poucos passaram para a violência de guerrilhas urbanas e de camponeses, sendo violentamente reprimidos pelos Estados de segurança nacional.

Neste processo participaram inúmeros cristãos e organizações inteiras como a Juventude Universitária Católica, a Acção Operária Católica e outras. Eram geralmente pessoas e grupos com forte contradição de classe (extracção burguesa) cheios de idealismo, mas sem muito senso político em termos da viabilidade histórica de semelhante libertação popular.

Posteriormente, após anos da mais dura repressão (1968-1974), começaram as bases da Igreja a assumir importância excepcional em termos eclesiológicos e também políticos. Era o povo mesmo que assumia seu próprio destino. Tudo, geralmente, começava com círculos bíblicos. Depois, tudo passava à criação da pequena comunidade eclesial de base. A sua tarefa, inicialmente, era aprofundar a fé internamente, preparar a liturgia, os sacramentos e a vida da piedade. Num estádio um pouco mais avançado, passava-se à tarefa da mútua ajuda nos problemas da vida dos membros. Na medida em que estes se organizam e aprofundam a reflexão, dão-se conta de que os seus problemas possuem um carácter estrutural. A sua marginalização é consequência do tipo de organização elitista, de acumulação privada, enfim, da própria estrutura económico-social do sistema capitalista.

Então emerge a questão política, e o tema da libertação ganha conteúdos concretos e históricos. Não se trata apenas da libertação do pecado (do qual sempre nos devemos libertar), mas de uma libertação que também possui dimensões históricas (económicas, políticas e culturais). A fé cristã visa directamente a libertação derradeira e a liberdade dos filhos de Deus no Reino, mas inclui também as libertações históricas como forma de antecipação e concretização da libertação última, só possível no termo da história em Deus.

Leonardo Boff
Igreja – Carisma e Poder
Ed. Vozes, 1981