teologia para leigos

17 de novembro de 2010

16 POEMAS EM CRISE

«nunca os limites foram tão estreitos»
− 16 poemas sob penumbra


−1.−

Os que ouvem
as notícias
batem palmas


o aplauso
ensurdecedor
ressoando na eterna pergunta
de cascalho


−2.−

Os filhos
foram esmagados
na encruzilhada da hora

Os escravos
extirpam da terra
a placenta do muco

A roupa
fala, no acre do bidé
um estrépito de prostituta
alçapão tábuas e rolamento

E
o povo nu
na vergonha do rei que o vendeu

−3.−

Vendemos
o inesgotável

A abundância
do saque
assusta-nos

e os filhotes não podem fazer nada

A reserva
é uma água que
nos escapa
um covil, vil

−4.−

Os cavaleiros
vertiginosos
tomam de assalto
o carro

Os rios
se precipitam
por ruas e vielas

O gemido
é aí abundante
mais agudo
que o tilintar da sílica

No vórtex
não há quem não golpeie
as águas da dor

−5.−

As pombas
pararam a forma do ar
e o voo do vento

No peito
habita
uma vergonha pública

O consolo
é uma presa
um exército vergado

Ninguém
sai para cuidar da cria

O cerco
vigia,
cansado

−6.−

Até
a vingança
apodreceu no parapeito
esquecida na noite
quente

A aflição
aniquilou
a aflição

e o jugo rasga
a dispersão dos aflitos
daqueles
que se consomem
em enxergas
de palha seca

Vigiar
os acessos,
para quê?

−7.−

É hora
de prestar contas
das agressões persistentes

É hora
de libertar vítimas
e castigar carrascos

Os rios da justiça são
um grito de poeira
que se ergue e deposita,
convulso

−8.−

O emaranhado
das imagens
empurra à treva

Em festins de morgue
se consome a angústia
assaltada por uma réstia
de cerco

E as forças redobram
seu percurso de açafrão…

O vale
enche-se de vítimas e serpentes

Tropeçamos
nas próprias pernas
enlouquecidos
sem volta atrás

Nunca os limites foram tão estreitos…

−9.−

O suplemento
é uma plenitude

um despojo por chegar

Predomina
a impressão de contemplar
o irremediável

−10.−

O lixo
te expõe

e enobrece

Ó meu povo
na rua de camões…

−11.−

O coro
dos submetidos
é irrepetível

A história
tantas vezes
o aplauso da derrota

Ó palavra
encerra-te no teu continente
e funde a estrela
até que o senhor sol
nos devolva

e crave

−12.−

Buscarás
a argila esmagada
entre teus próprios
dedos

A cozedura
devora o gafanhoto
enquanto os isensatos
cochilam

Tua ferida
é incurável
Di-lo a multidão
dos fugidios

−13.−

As montanhas hão-de tremer diante do Senhor

−14.−

E aqui
estou eu
contra ti

Sempre contra ti

Sempre

−15.−

Penetrando
a penumbra da manhã

irrompe o formidável

Não há remédio
- a invasão dum incêndio
múltiplo e devorador.

Sentinela, que vês?

−16.−

Lamentação do profeta Miqueias, 7


Ai de mim! Porque sou como quem rebusca
terminada a vindima:
nem um cacho para comer,
nem figos temporãos de que tanto gosto.
Desapareceram da terra os justos,
não há ninguém íntegro.
Todos espreitam a hora de se lançar sobre o outro,
cada um arma laços ao seu irmão.
Peritas são, no mal, suas mãos;
o príncipe exige,
o juiz julga sobre a mesa do suborno,
aquele que é grande manifesta abertamente sua cobiça
e urde intrigas.
O melhor dentre eles é como um tojo.
Mas eu estou alerta
aguardando Quem me escuta.

«Agora começa o julgamento deste mundo…»