A BOMBA RELÓGIO DA DÍVIDA ESTUDANTIL
Nos Estados Unidos, uma enorme quantidade de estudantes nunca vai ser capaz de pagar a dívida dos empréstimos contraídos para pagar a sua formação.
É este o caminho em que se lançam as sociedades quando substituem um direito baseado no acesso universal e gratuito por uma concepção do ensino como mercadoria, que olha o estudante como cliente solvente, mesmo que esmagado pelo endividamento. Uma bomba-relógio que pode estender-se a toda a sociedade, como aconteceu com o subprime.
(…) Aumento de propinas, recuo do investimento público
«As propinas estão a aumentar a uma taxa duas a quatro vezes superior à da inflação. Globalmente, o custo do ensino superior duplicou em trinta anos[1]. A crise económica, antes de refrear a tendência, desempenhou um papel acelerador em relação a ela. O sector privado registou um aumento médio de 8,3% em 2011, mas foi no público que a escalada foi mais espectacular, em especial nos estados da zona ocidental, particularmente dependentes da rede universitária pública. Assim, verificaram-se aumentos de 21% na Califórnia, de 17% no Arizona, de 16% no estado de Washington, etc.[2]. Estes aumentos são tanto mais problemáticos quanto são acompanhados de um desinvestimento progressivo da maioria dos cinquenta estados norte-americanos, principais investidores do ensino superior. Em 1990, o estado de Washington pagava cerca de 14 000 dólares por aluno e os estudantes pagavam apenas 3 000 dólares de propinas. Passados vinte anos, a relação praticamente inverteu-se: o subsídio público não ultrapassa os 5 000 dólares e cada inscrito tem de pagar uma factura anual de 11 000 dólares[3]. Todas as universidades aumentaram as suas tabelas de preços e as propinas passaram de 8 800 dólares em 1999-2000 para 14 400 dólares em 2010-2011.»
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« Por outro lado, os jovens americanos frequentam cada vez mais universidades com fins lucrativos, que cobram muito caro por uma instrução medíocre. Estes estabelecimentos, privados mas financiados a 90% por subsídios[4], dedicam três vezes menos dinheiro ao ensino do que as universidades públicas, a troco de propinas duas vezes superiores. O fosso repercute-se na taxa de sucesso: só 20% dos estudantes saem delas diplomados. Pesadamente endividados, só adquirem uma fraca qualificação e dificilmente podem ter a esperança de encontrar um trabalho suficientemente remunerado para pagarem os empréstimos contraídos.»
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«O problema é que existe um obstáculo de monta defronte dos que gostariam de reformar o sistema de ensino superior: o sector bancário. Principal beneficiário deste crescimento exponencial dos créditos estudantis, este sector não tem qualquer interesse na mudança. Com 100 mil milhões de dólares em empréstimos estudantis concedidos em 2011 e 1 bilião de créditos pendentes, está em jogo um maná de 30 mil milhões de dólares em juros bancários anuais[5].
Sistema falha no combate às desigualdades
A situação é, contudo, tão preocupante que, em Janeiro de 2012, o presidente Barak Obama fez dela um dos temas do seu tradicional discurso sobre o estado da União. Nessa ocasião, ameaçou diminuir as subvenções públicas das universidades que aumentassem as propinas demasiado depressa. Ao longo do mandato, Obama também tentou reduzir o papel desempenhado pelos bancos comerciais no programa federal de apoio aos estudantes ─ sem êxito. Mas estas iniciativas não atacam verdadeiramente o problema dos custos dos estudos superiores, que resulta da incapacidade do capitalismo americano de cumprir a sua missão fundamental: permitir que o maior número de pessoas aceda ao modo de vida da classe média.
Este fracasso tem raízes nas políticas de austeridade implantadas desde há trinta anos e que conduziram (…)»
Christopher Newfield
Professor na Universidade da Califórnia em Santa Bárbara. Autor de Unmaking the Public University: The Forty-Year Assault on the Middle Class; Harvard University Press, Cambridge , 2008.
[1] Laura Choi, «Student Debt and Default in the 12th District», Federal Reserve Bank of San Francisco , Dezembro de 2011.
[2] Larry Gordon, «California Leads Nation in Escalation of College Costs», Los Angeles Times, 26 de Outubro de 2011.
[3] Dan Jacoby, «A Better Business Plan for Washington State ’s Public Higher Education», The Seattle Times, 25 de Janeiro de 2011.
[4] Goldie Blumenstyk, «For-profit Colleges Show Increasing Dependence on Federal Student Aid», The Chronicle of Higher Education, Washington , 15 de Fevereiro de 2011.
[5] Dennis Cauchon, «Students Loans Outstanding Will Exceed $ 1 Trillion this Year», USA Today, McLean (Virgínia), 25 de Outubro de 2011.