teologia para leigos

20 de setembro de 2011

A IGREJA NÃO SUSCITA «SEGUIDORES» MAS «ADEPTOS»

O vigor espiritual que é preciso


Tralhariz - linha do Tua

 Os cristãos das primeiras comunidades sentiam-se, mais do que tudo, seguidores de Jesus. Para eles, acreditar em Jesus Cristo é entrar no seu «caminho» seguindo os seus passos. Um antigo escrito cristão, conhecido como a Carta aos Hebreus, diz que é um caminho «novo e vivo». Não é o caminho percorrido no passado pelo povo de Israel, mas um caminho que «Ele abriu para nós» (Hebreus 10:20).

Este caminho cristão é um itinerário que se vai fazendo, passo a passo, ao longo de toda a vida. Às vezes, parece simples e plano, outras, duro e difícil. No caminho há momentos de firmeza e de alegria, e também horas de cansaço e de desalento. [Salmo 40(39)] Seguir as pegadas de Jesus é dar passos, tomar decisões, superar obstáculos, abandonar sendas equivocadas, descobrir horizontes novos… Tudo faz parte do caminho. Os primeiros cristãos esforçam-se por percorrê-lo «tendo os olhos postos em Jesus», pois sabem que só Ele é «autor e consumador da Fé» (Hebreus 12:2).

Desgraçadamente, tal como hoje é vivido por muitos, o cristianismo não suscita «seguidores» de Jesus, mas apenas «adeptos de uma religião». Não gera discípulos que, identificados com o seu projecto, se dedicam a abrir caminhos para o Reino de Deus, mas membros duma instituição que cumprem melhor ou pior as suas obrigações religiosas. Muitos deles correm o risco de nunca conhecer a experiência cristã mais originária e apaixonante: entrar pelo caminho aberto por Jesus.

A renovação da Igreja está a exigir-nos hoje o passar de comunidades formadas maioritariamente por «adeptos» para comunidades de «discípulos» e de «seguidores» de Jesus. Temos necessidade disso para aprender a viver mais identificados com o seu projecto, menos escravos dum passado, nem sempre fiel ao Evangelho, e mais libertos de medos e de prisões que nos podem impedir de escutar o seu chamamento à conversão.

A Igreja não tem, neste momento, o vigor espiritual que precisa para enfrentar os desafios do momento actual. São, sem dúvida, muitos os factores, tanto dentro, como fora dela, que podem explicar esta mediocridade espiritual, mas, provavelmente, a causa principal está na ausência de uma adesão vital a Jesus Cristo. Muitos cristãos não conhecem a energia dinamizadora que está presente em Jesus, quando é vivido e seguido pelos seus discípulos a partir dum contacto íntimo e vital. Muitas comunidades cristãs não imaginam a transformação que, hoje mesmo, nelas se daria se a pessoa concreta de Jesus e o seu Evangelho ocupassem o centro da sua vida.

Chegou o momento de reagir.

Temos que nos esforçar por colocar o relato de Jesus no coração dos crentes e no centro das comunidades cristãs. Temos necessidade de fixar o nosso olhar no seu rosto, sintonizar com a sua vida concreta, acolher o Espírito que o anima, seguir a sua trajectória de entrega ao Reino de Deus até à morte e deixar-nos transformar pela sua ressurreição. Para tudo isso, nada nos pode ajudar mais que entrarmos no relato que nos dão os evangelistas.

Para os seguidores de Jesus, os quatro evangelhos constituem uma obra de importância única e irrepetível. Não são livros didácticos que expõem doutrina académica sobre Jesus. Também não são biografias redigidas para informar com pormenor a sua trajectória histórica. Estes relatos aproximam-nos de Jesus, tal como era recordado com fé e com amor pelas primeiras gerações cristãs. Por um lado, encontramos neles o impacto provocado por Jesus nos primeiros que se sentiram atraídos por ele e o seguiram. Por outro, foram escritos para gerar o seguimento de novos discípulos.

Os Evangelhos convidam-nos, por isso, a entrar num processo de mudança, de seguimento de Jesus e de identificação com o seu projecto. São relatos de conversão, e é nessa atitude que devem ser lidos, pregados, meditados e guardados no coração de cada crente e no seio da comunidade cristã. A experiência de escutar em conjunto os evangelhos converte-se, então, na força mais poderosa que uma comunidade tem para a sua transformação. Nesse contacto vivo com o relato de Jesus, nós, os crentes, recebemos luz e força para reproduzir hoje o seu estilo de vida e para abrir novos caminhos ao projecto do Reino de Deus.

J A PAGOLA
San Sebastian, 31 Julho 2010