teologia para leigos

18 de setembro de 2011

SILÊNCIO, ISOLAMENTO E ACOLHIMENTO

−Que é feito de ti…?


em Greccio; cavernas de Francisco de Assis (na Umbria) - pintura 'Silentium' sobre estuque


«Mas a palavra silêncio é suficientemente rica para extravasar o quadro destas definições: encontramo-la no vocabulário do amor (amar emsilêncio), da dor (sofrer em…) e de diversas emoções: um silêncio pode ser, na verdade, eloquente, obstinado, marcante, sombrio, desgostoso, aprovador, contrariado, consternado, alegre, pesado, mortal - vamos ficar por aqui… A lista pode tornar-se demasiado exaustiva: existem tantos silêncios como adjectivos ou estados psicológicos.

«Também se encontram algumas expressões populares com ele relacionadas: ‘enfiar a língua no bolso’, ‘rodá-la a sete chaves na boca’, ‘calar o bico’, ‘silêncio e fecha a matraca’, ‘manter os dentes cerrados’, ‘fechar a boca’. Podemos açaimar a boca, amordaçá-la, reduzir e condenar alguém ao silêncio. Existem juke-boxes que têm discos de silêncio: basta meter um franco para o ouvir. Além disso é um gesto bonito, o do indicador sobre os lábios, usado desde a mais tenra idade, assim como um sentimento poético: «Uma noite, lembrava-se, vagueávamos em silêncio…» (Lamartine).

«Existem espaços de silêncio, um mistério de silêncio a conquistar.

«Existe, e é pungente, o silêncio de uma floresta devastada, o silêncio dos objectos que nos rodeiam, o silêncio das nossas casas e apartamentos, e o silêncio sempre rico de sentidos dos que nos são próximos. O silêncio da mãe que tricota para o bebé, o da avó que costura, o da criança que amua, o dos amantes que, de mãos dadas, se entre-olham e se inebriam um do outro.

«Existe o silêncio da doença que, sozinhos no nosso leito, enfrentamos; o silêncio da depressão, até mesmo o do suicídio: o silêncio melancólico que se faz sentir quando se regressa, só e triste, a casa. Na linha S.O.S.-Amizade, a maior parte das chamadas provêm de pessoas (duas mulheres em cada três chamadas) que finalmente desabafam ao fim do dia, depois de terem saído do trabalho, depois das vinte e duas horas, quando a noite verdadeiramente começa: em 1985 foram 573.000 aqueles que, em França, marcaram este número de sobrevivência a fim de romperem o nó do silêncio-solidão… os silêncios da miséria.

«Existe o silêncio do confessionário, para aqueles que o frequentam, o silêncio da postura da meditação para aqueles que a praticam, e o da sepultura para todos nós.

«Gravado numa pedra à entrada de uma velha igreja, está: “DEUS TERÁ EM CONTA AS VOSSAS PALAVRAS INÚTEIS”.» [‘Elogio do silêncio’, Marc de Smedt, Ed. SINAIS DE FOGO, Col. Outro Olhar, p.12-14, http://www.sinaisdefogo.pt/, ISBN 972.8541.25.2 – no total, 205 págs.]




 «Loic tem mais de quarenta anos, mas parece uma criança de quatro. Não pode andar, nem falar. As suas capacidades humanas estão muito limitadas. Vive na Comunidade L’Arche há vinte anos, no lar de La Forestière.

«Loic tem-me feito muito bem. Introduziu-me num mundo de ternura, longe do mundo da eficácia e da competitividade. Com Loic, a única coisa a fazer é brincar, amá-lo, dar-lhe banho, acolhê-lo tal como ele é, compreender as suas necessidades, essas necessidades que ele exprime sobretudo por meio da linguagem do corpo. Com ele descobri a comunhão, que é como um vaivém do amor, que é respeito e confiança mútuos. Por vezes, sobretudo nos momentos da oração da tarde, ele descansa sobre os meus joelhos. E eu, pelo meu lado, também descanso com ele.
 



«Nada de palavras, apenas um olhar tranquilo, cheio de ternura, que se cruza com o meu olhar; um sorriso, que desperta o meu sorriso. Esta comunhão é como o espaço e o lugar em que Deus habita.

«O silêncio já não é ausência de palavra e de vida; é como um cume, um lugar de paz e de descanso, um espaço onde Deus se dá a conhecer.» [por Jean Vanier, Fundador da Comunidade L’Arche]