A teologia da libertação
na Doutrina da Fé?
Arcebispo Gerhard Ludwig Müller, Prefeito da Cong. Dout. da Fé |
Uma vez, num seminário na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, um juiz perguntou-me o que é que eu pensava sobre a teologia da libertação. Disse-lhe: "Permita que lhe responda com uma pergunta: o que pensa o senhor sobre a teologia da opressão?"
Percebe-se. Se a teologia não for teologia da libertação, não será urgente bani-la, excomungá-la? Mas ele referia-se, evidentemente, a um tipo de teologia que dá por esse nome e que quer trabalhar e pensar a partir e ao serviço dos mais pobres, passando, portanto, de um cristianismo "sacral" a um cristianismo "social", e à qual o cardeal Joseph Ratzinger teceu fortes reservas.
Em 1972, foi o livro do teólogo G. Gutiérrez, Teologia da Libertação, que acabou por consagrar o seu nome. Em 1983, Ratzinger enviou à Conferência Episcopal do Peru observações críticas sobre a teologia de Gutiérrez, acusando-o concretamente de utilizar um método de interpretação marxista, fazer uma leitura parcial dos textos bíblicos e pôr o acento na economia e na política, não acautelando suficientemente a realidade religiosa e transcendente do Reino de Deus. Os bispos do Peru foram chamados a Roma em 1985 e pressionados para que o condenassem. A condenação não aconteceu, pois, como conta o teólogo X. Pikaza, foram vários a dizer que não tinha sentido "obrigá-los" a condenar um irmão crente comprometido com os pobres.
O singular nesta história é o alemão Gerhard L. Müller, que foi catedrático de Teologia na Universidade de Munique, bispo de Ratisbona desde 2002 e que, em substituição do norte-americano William Levada, que abandona o cargo por motivos de idade, acaba de ser nomeado prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o organismo responsável pela vigilância da ortodoxia. Müller não esconde a sua amizade com Gutiérrez e, por isso, há quem chegue a pensar que esta nomeação é uma espécie de reparação de J. Ratzinger.
Müller escreveu: "A teologia da libertação está para mim unida ao rosto de Gustavo Gutiérrez." Em 1988, participou num seminário dirigido por ele, e confessa: "Operou-se em mim uma viragem na reflexão académica sobre uma nova concepção teológica dirigida para a experiência com as pessoas para as quais tinha sido desenvolvida essa teologia."
E pergunta: "Como se pode falar de Deus perante o sofrimento humano dos pobres, que não têm sustento para os filhos nem direito a assistência médica nem acesso à educação, excluídos da vida social e cultural, marginalizados e considerados um fardo e uma ameaça para o estilo de vida de uns poucos ricos?" A teologia de Gutiérrez "é ortodoxa, porque é ortoprática".
Durante 15 anos passou 2 ou 3 meses por ano na América Latina, vivendo em condições muito simples, o que, como confessa, "para um cidadão da Europa central implica um grande esforço". Mas isso marcou-o profundamente e, assim, é inclemente na condenação do capitalismo neoliberal, cuja expressão sem escrúpulos são os vulture funds.
"Depois da queda do comunismo, alguns pensaram que se poderia conseguir o paraíso na terra com um capitalismo desenfreado. As forças auto-reguladoras do mercado à escala mundial trariam por si mesmas o bem-estar para todos ou, pelo menos, para a maioria. A realidade é muito diferente. Foi a cobiça de homens concretos que provocou a actual crise financeira mundial, cujas consequências, mais uma vez, os pobres e os mais pobres dos pobres têm de pagar com a sua vida, a sua saúde, a morte prematura e todas as perspectivas perdidas, previstas por Deus para eles."
Deu recentemente uma entrevista ao Osservatore Romano, onde reafirma que é necessário "distinguir entre uma teologia da libertação equivocada e outra correcta", mas "qualquer teologia boa tem que ver com a liberdade e a glória dos filhos de Deus".
A sua chegada ao Vaticano não significa uma revolução - também foi prevenindo contra a "ordenação" das mulheres -, mas pode ser um bom sinal. Quer, com Paulo VI, que o aspecto positivo esteja em primeiro plano na Congregação para a Doutrina da Fé: "Ela deve, sobretudo, promover e tornar compreensível a fé, e este é o factor decisivo."
Anselmo Borges
Diário de Notícias
01 Setembro de 2012.
Se houvesse dúvidas, …
[É areia a mais para o Arcebispo Gerhard L. Müller – para que acreditemos nas suas boas intenções, as quais o padre Anselmo Borges quer fazer sobressair, teria que ‘levantar’ demasiadas ex-comunhões (Jon Sobrino, A. Torres Queiruga, H. Kung, L. Boff, etc. etc.), teria de restabelecer demasiadas relações feridas, emendar demasiados erros doutrinários, renegar o próprio Vaticano como Estado corrupto, em suma, voltar atrás em demasiadas e sensíveis matérias que colocariam em causa o poder usurpado da Cúria vaticana, essa instituição, em si, ilegítima, não conciliar. Só as questões internas ao seu país - a Alemanha - já lhe chegavam para o resto da sua vida… Se não, reparem bem nas expressões empregues pelo arcebispo, e que vêm na notícia abaixo, e que afastam toda e qualquer expectativa: «acreditar na doutrina da Igreja», «comunhão plena», «obediência», mas sobretudo o preconceito que está por trás do juízo de intenções em o «não levar os votos a sério». E, na notícia de cima, que releva a palavra judicial «distinções» e em que, em vez de libertação, fala de ‘liberdade’ e em vez de ‘glória dos pobres’ fala de glória dos Filhos de Deus… sem mais distinções. Pode ter-se operado uma «viragem na reflexão», mas na eclesiologia, no projecto de vida pessoal e na acção… «Católico significa acreditar naquilo que a Igreja ensina»? ("Catholic means believing what the church teaches") - Bom. Se é assim, 'vou ali e venho já...' É demasiada areia, caro padre Anselmo Borges! O acebispo Gerhard é farinha do mesmo saco: palavras sublimes, but only words. Quando pegar na caneta tudo ficará às claras. Esta é a terceira vez que o padre Anselmo Borges se entusiasma com o Vaticano; a 1ª foi aquando da nomeação do cardeal J. Ratzinger para Papa; a 2ª, aquando dumas certas palavras do Papa Bento XVI sobre o preservativo (cf. 'Luz do Mundo'); esta é a terceira... O Vaticano está bem blindado: chafurda na sua própria lama (Clicar)]
New Vatican doctrinal chief
talks about SSPX, LCWR discussions
Asked about how he would handle the most controversial cases he inherited, the new head of the Vatican ’s doctrinal office said:
“For the future of the church, it’s important to overcome ideological conflicts from whatever side they come.”
German Archbishop Gerhard L. Muller, named prefect of the Congregation for the Doctrine of the Faith in early July, told the Vatican newspaper that the congregation’s discussions with the traditionalist Society of St. Pius X and with the U.S. Leadership Conference of Women Religious would focus on the fact that being Catholic means believing what the church teaches.
Although he has been a member of the congregation for five years, Archbishop Muller told L’Osservatore Romano, the Vatican newspaper, that it would take him some time to get up to speed on all of the details of the congregation’s work.
But, in the interview published July 25, the archbishop was asked what he thought about the ongoing discussions aimed at bringing the traditionalist SSPX back into full communion with the church and about the congregation-ordered reform of the LCWR, the organization that brings together the superiors of most religious orders of women in the United States .
Apparently referring to the talks with the SSPX, which rejects certain reforms introduced by the Second Vatican Council, Archbishop Muller said, “One cannot make reference to the tradition of the church and then accept only parts of it.”
In an apparent reference to the LCWR, he said, “One cannot profess the three religious vows (poverty, chastity and obedience) and not take them seriously.”
SOURCE CNS
26 Julho 2012
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