teologia para leigos

22 de dezembro de 2012

NATAL_3 - DEUS E O DINHEIRO

«Bem unidos façamos, nesta luta final, uma terra sem amos…»





Das seis secções do Evangelho de Mateus, a quarta [16:21-20:34] revela como, para Jesus, era importante começar a esculpir com as próprias mãos o diamante. Caminhava para Jerusalém, tudo poderia vir a correr mal (nada estava garantido) e, sendo assim, convinha lançar-se na construção da sua proposta: uma esperança possível, palpável, uma casa diferente, contra-cultural, que fosse ao arrepio da ideologia dominante. Jesus não parava de ser provocado, pelos seus discípulos, a abrir o jogo, a “concretizar” o seu plano, a pôr tudo em pratos limpos.

Sabemos bem que todo projecto de construção começa pela necessidade de enfrentar as dificuldades da obra projectada (na cabeça). Dentro desta quarta secção de Mateus, fixemo-nos apenas em duas narrativas: O jovem rico (19:16-26) e Os trabalhadores da vinha (20:1-16). Que se passa aqui? “Processo de acumulação de capital, entesouramento, força de trabalho, capitalismo-empregador e virtudes morais, produção de mais-valias …” – até parece que, traiçoeiramente, o Evangelho nos empurrara para dentro dalgum volume de Karl Marx: Contribuição para a Crítica da Economia Política? O Capital? Que se passa aqui, nestas narrativas?!






Proémio

A Internacional ficou como um hino famoso, comum a muitos espíritos internacionalistas, comunistas, socialistas, sociais-democratas, anarquistas, etc., sobretudo depois que foi adoptado (entre 1917 e 1941) como Hino Nacional da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).


De pé, ó vitimas da fome
De pé, famélicos da terra
Da ideia a chama já consome
A crosta bruta que a soterra

Cortai o mal bem pelo fundo
De pé, de pé, não mais senhores
Se nada somos em tal mundo
Sejamos tudo, ó produtores

Bem unidos façamos
Nesta luta final
Uma terra sem amos
A Internacional (…)

O crime de rico, a lei o cobre
O Estado esmaga o oprimido
Não há direitos para o pobre
Ao rico tudo é permitido

À opressão não mais sujeitos
Somos iguais todos os seres
Não mais deveres sem direitos
Não mais direitos sem deveres (…)

Abomináveis na grandeza
Os reis da mina e da fornalha
Edificaram a riqueza
Sobre o suor de quem trabalha

Bem unidos façamos
Nesta luta final
Uma terra sem amos
A Internacional



Este hino, a Internacional, fala de situações eternas! E de Esperança, também.

A exploração do homem pelo homem será sem sombra de dúvida «a profissão mais velha do mundo». A crítica dos Profetas de Israel à acumulação avara de riqueza, fruto da opressão e exploração dos pobres (Is 5:8-10; 10:1-3; Ex 22:6-31; 27; Am 2:6-7; 5:10-12; 8:4-8; Mt 6:19-34) e a crítica de Horácio (poeta da Roma Antiga, 65 aC-8 aC) contra os que perseguem avaramente a riqueza (Sát 1.1; 2.3.82-280) são boa demonstração disso mesmo.

Filóstrato[1], filósofo sofista grego, [c. 170-250 dC] (Apolonio 1.15) narra um incidente ocorrido em Aspendo (Panfília, Ásia Menor; Act 2:10) durante o reinado de Tibério (14-37 dC). À sua chegada a essa cidade, Apolónio encontra uma situação terrível: amotinação, fome e revoltas, porque «os ricos enceleiraram todo o trigo e retiveram-no para exportação». Vendendo-o para fora, obtinham lucros incalculáveis. Numa sociedade imperial que vivia da produção agrícola, o entesouramento, se é certo que constitui uma reserva em situações de quebra da produção, ele por si só também acarreta instabilidade económica. O entesouramento, de costas voltado para o investimento (compra de mercadoria), vive da especulação, a qual consiste “em prever a psicologia do mercado”. [Keynes] Ora, previsões são previsões…

No “tempo” de Jesus, são conhecidas revoltas violentas em Jerusalém (66 dC) e em Antioquia (70 dC), durante as quais as multidões de pobres e esfomeados assaltaram os arquivos lançando-lhes fogo a fim de destruir os registos dos seus bens patrimoniais e também os registos das suas dívidas fiscais, como forma de protesto contra os meios abusivos de que se serviam os ricos para “espremer” ainda mais os pobres.

Numa sociedade agrária, a fonte de rendimentos é a terra e mão-de-obra abundante e disponível (‘ociosa’, Mt 20:3); o destino desses mesmos rendimentos é o exército (para controlar a posse e o trabalho), os cargos políticos imperiais, as elites e o luxo (demonstração de posse, status). Nela não se coloca a questão da negociação salarial, nem a questão da Teoria da Abstinência (o latifundiário prescindir de parte dos lucros para realizar a reposição de capital e de maquinaria). O desemprego[2] (que à era de Jesus era massivo) assegurava a exploração e o lucro. O salário não era problema: cumpria apenas a função de manter vivo, e com alguma força, o trabalhador / marginal para que produzisse. A precariedade era a norma (rendas e impostos sobre os rendeiros subindo em flecha de modo arbitrário, e, em tempos de carestia, com a consequente obrigação da devolução / hipoteca das terras; como resultado, apropriação das terras por parte dos amos; ou seja, «dinheiro faz dinheiro»).

 

O sistema estava montado. Assim se enriquecia. Muito. Já naquele tempo era assim: tudo como hoje, desde a Era Industrial.

 

Como explicamos, hoje, este processo?

 

É (…) «realista supor que não são os capitalistas que concedem crédito aos trabalhadores (que lhes pagam antecipadamente), pois são os trabalhadores que concedem crédito aos capitalistas, sendo remunerados pelo trabalho já efectuado. (…)

 

«O equivalente do carácter bipolar das duas categorias ‘capital’ e ‘trabalho assalariado’ é, por um lado o lucro e, por outro, o salário. Naturalmente, a origem do lucro só pode ser a venda vantajosa se se considerarem casos particulares; se, em contrapartida, se considerar o processo na sua totalidade, isto é, se a questão diz respeito à origem da existência dos “grupos sociais que não trabalham”, então deve procurar-se uma explicação para o lucro no ‘processo de produção’.

 

«O lucro é uma forma transfigurada da mais-valia. O significado desta explicação é, na sua forma mais simples e concisa, o seguinte: o facto de que os meios de produção são propriedade de pouquíssimos indivíduos, e de que os trabalhadores se encontram privados deles, obriga estes últimos a venderem a sua capacidade de trabalho, isto é, a sua força de trabalho, por uma soma de dinheiro mais ou menos equivalente ao valor dos produtos suficientes para a reprodução da força de trabalho. O trabalhador, no entanto, trabalha por um período de tempo mais longo do que é necessário à reprodução da força de trabalho. O valor das mercadorias produzido durante este tempo adicional de trabalho representa a mais-valia

 

«Ao mesmo tempo, o Capital é um conceito bipolar: admite a existência de trabalho utilizado livremente e, ao mesmo tempo, implica domínio sobre esse trabalho e, por conseguinte, também sobre as condições de produção. (…) é claro que o dinheiro em si não é Capital. Só se transforma em Capital quando é utilizado para multiplicar valor, quando se transforma num meio para produzir mais-valia, isto é (falando em termos muito genéricos), num excedente que ultrapassa os meios de subsistência dos trabalhadores. É também Capital quando se transforma num direito de participar na distribuição do «excedente». Por outras palavras, o dinheiro não é Capital se for apenas um intermediário na troca das mercadorias. Isto exprime-se pela fórmula M – D – M (mercadoria – dinheiro – mercadoria). Se, no entanto, o objecto da troca é a multiplicação do valor de troca, o dinheiro transforma-se em Capital, e isto exprime-se pela fórmula: D – M – D’, onde D’ é maior que D. Esta fórmula mostra o significado da definição de Capital como valor que serve para multiplicar valor, isto é, valor que se auto-multiplica.»[3]

 

Para terminar este atalho, citemos, por fim, Karl Marx: «Um negro é um negro. Só em determinadas condições se transforma em escravo. Uma máquina de fiar algodão é uma máquina de fiar algodão. Só em determinadas condições se transforma em Capital. Subtraída a essas condições, ela não é Capital, do mesmo modo que o ouro em si e só por si não é dinheiro, e o açúcar não é o preço do açúcar».[4]

 

 

Adentrando

 

Diz X. Pikaza:

 

«El pueblo de Israel ha conocido el dinero desde los tiempos más antiguos, pero su uso ha sido limitado, pues gran parte de la población ha vivido hasta el tiempo de Jesús al nivel de una economía de subsistencia, produciendo lo necesario para vivir o adquiriendo por trueque los productos faltantes, como ha sucedido en muchas sociedades agrarias hasta tiempos muy recientes.

 

«En vez de moneda acuñada (de oro, plata o bronce) se empleaban más bien como dinero animales (ganado mayor y menor: pecunia) y medidas de alimento (de trigo, vino o aceite). Por eso resulta peligroso comparar rápidamente aquella sociedad no monetaria con la nuestra de occidente, casi totalmente monetarizada.

 

«De todas formas, la centralidad del templo de Jerusalén (cuyo culto sostienen todos los judíos con dinero) y del imperio romano (que exige a sus súbditos tributo monetario) han hecho que el tema del dinero ocupe un lugar importante en la sociedad judía del tiempo de Jesús.

 

«Es posible que los primeros cristianos usaran poco dinero, pues vivían (en el ámbito rural) al nivel de economía de trueque. Por eso resulta sorprendente la cantidad de alusiones no sólo económica, sino también monetarias que hallamos en los evangelios.»[5]

 

Na verdade, numa das duas narrativas sugeridas (O jovem rico, 19:16-26) o que está em causa é a condição de latifundiário capitalista daquele jovem: «era muito rico». Ninguém tem dúvidas que se tratava de uma pessoa boa e religiosa, até talvez espiritualmente interessante: queria mais (pois já cumpria a Lei a preceito; v.20). Há gente assim: apesar da vida lhe correr bem, sente ânsia de mais, procura e, pelos conhecidos, é julgada como pessoa ‘preocupada com os outros’, sempre a correr, a oferecer-se para tudo, muito generosa. Porém, esquece-se do mais importante: fazer a ponte entre a carência que sente e as circunstâncias que lhe permitem ser carente – seus “cabedais” (como se dizia na casa da minha avó), seus rendimentos, suas propriedades, seus ‘pé-de-meia’. Há gente assim, muito da Igreja, que anseia por estar rodeada de gente a quem ajudar.[6]

 

A casa é um lugar de honra e de status: sempre foi e é. Atesta a reputação: é o lugar da salutatio matinal (na minha aldeia é-o forte e claramente!). A casa, para os latifundiários, poderá, eventualmente servir para acolher pobres algumas vezes por ano (ceia de Natal para pobres, p. ex.), para dar festas de beneficência, promover tômbolas de caridade, reunir empresários para angariar fundos, etc.. Pedir a um empresário / terrateniente que «venda a casa, as suas quintas e as distribua pelos pobres», para ele é estúpido… Na melhor das hipóteses, poderá pôr à venda uma quinta, uma casa abandonada e entregar o dinheiro à Igreja ou outra instituição de fiar. E, dar aos pobres?!!! Não será deitar pérolas a porcos…?

 

A narrativa coloca-nos diante dum Jovem que era um gestor com PhD por Harvard… um Executive Coaching!, um caso de sucesso. Jesus enfrenta, não a consciência deste jovem generoso e bom − e podia tê-lo feito −, mas o sistema em que ele (e o seu coração) está metido e onde foi formatado / atado. Jesus coloca em confronto «o império do Céu» (v.21) e o «império do Capital»: não enfrenta o ter-se um pedaço de dinheiro; enfrenta o império do Dinheiro, Mamon (v.22; Mt 6:24). A conclusão final desta narrativa – v. 23: «dificilmente um rico entrará no Reino do Céu» − é um Tratado de Filosofia Política, pois não se trata de uma condenação moral, mas de uma constatação social. E de que constatação se trata? De que há estruturas (independentes da vontade) que são poderosíssimas. O jovem rico representa uma riqueza conseguida à custa duma complexa montagem que envolvia a legislação romana com sua rede dos cobradores de impostos, o beneplácito sacerdotal, o benefício do Templo Santo (ou seja, a Identidade do Povo Eleito) e a submissão ao sistema fiscal estrangeiro de Roma.

É preciso ter vivido algumas décadas para que alguém se dê conta do sistema em que está metido… Não é fácil logo à primeira perceber tudo: sistema é sistema, não tem uma identidade pessoal imediata, nem sempre é evidente ou fácil. Sistema, regra geral, é rede, dissimulação.

 

Há gente desta (apanhada nas malhas do sistema), muito interessante, impecável até, sempre atenta (ninguém tem o direito de julgar ninguém!, só Deus), mas com um faro apuradíssimo para o perigo: sabem bem que cartas podem deixar cair e que fios nunca poderão deixar que cortem. Jesus poderia ter jogado com a ‘generosidade’ do rico, poderia daí ter-lhe vindo algum… para a sua campanha! Porém, Jesus queria um «mundo outro», Jesus queria uma «revolução», um mundo novo, e sabia bem que, para se construir um mundo novo, são precisos homens novos (mais do que dinheiro… vivo) e estruturas novas.

 

É igualmente isso que acontece com a proposta de «solidariedade igualitária», (“esquerdista”?), de Jesus − Mt 20:12; «deste-lhes a mesma paga que a nós». O que está em causa não é apenas o Homem Novo para construir uma alternativa ao sistema opressor. O que está em causa é o próprio sistema, que fabrica intencionalmente mão-de-obra barata e coloca nas mãos dos latifundiários “a faca e o queijo” (que sempre possuiram, aliás), mas também a massa humana com que sabem fabricar queijo…

 

O jovem rico percebeu rapidamente em que corda lhe tocavam e saiu de cena. Faro… instinto de sobrevivência! Capitalista sempre foi tudo menos sonso. Mateus 20:1-16 (os trabalhadores da vinha) é a narrativa que sai em defesa do Estado Social a sério.

 

 

A proposta social de Jesus

 

Jesus ao concluir «Não seja assim entre vós» (v.26) está a fazer trabalho de sapa, revolucionário e clandestino. Está a revolucionar o sistema! Num mundo onde a exploração económica assenta na escravatura, dizer «quem no meio de vós quiser ser o primeiro, seja vosso escravo» (v.27) é proclamar a revolução, a inversão de lugar social. Tem o impacto da Internacional! Espalha pânico!

 

Vale a pena reproduzir um poema de Georg Weerth, editado na «Nouvelle Gazette Rhénane»[7], jornal revolucionário alemão do qual Karl Marx foi chefe de redação (só tenho a versão em francês):

 

Ce matin je me rendis à Dusseldorf,

En très honnête compagnie:

Un conseiller gouvernemental déblaterait

Contre la «Nouvelle Gazette Rhénane».

 

«Les rédateurs de cette feuille

Sont tous dés Satans», dit-il;

«Ils ne craignent pas le bon Dieu

Ni meme le procureur-géneral Zweiffel.

 

A tous les misères d’ici-bas,

Ils ne voient qu’un seul remède,

La republique rouge comme les roses

Et le partage de tous les biens.

 

(…)

 

Ils réclament aussi le partage des femmes,

Et désirent abolir le mariage:

A l’avenir, on pourra ad libitum

Aller au lit tous ensemble.

 

Oui, tout le monde sera changé

Par cette direction moderne –

Mais les plus belles femmes seront reservés

Aux rédacteurs de la Gazette Rhénane.»

 

(…)

 

 

De Jesus também disseram de tudo: do bom e do melhor! Comilão e beberrão, amigo de pecadores, possuído por Satanás (Mc 3:22), enlouquecido, blá blá blá… A própria família de Jesus ajudou à festa (Mc 3:21). Revolucionário mete medo mesmo! (só ao Capital... a Mamon)

 

Comparando com a atitude do jovem rico, surpreende a iniciativa deste latifundiário, «proprietário que saiu ao romper da manhã, a fim de contratar trabalhadores para a sua vinha».

 

  Curiosamente, o proprietário rico não aceita que haja desemprego estrutural: por quatro vezes, varre a praça a empregar gente! Não se serve da “produtividade” de cada operário para os diferenciar entre si e, portanto, virar uns contra os outros e semear ‘individualismo’ ou competitividade à boa maneira do espírito neo-liberal anti-social (na verdade, eles haviam cumprido horários de trabalho diferentes).

 

Não procurou dividir para reinar (como frequentemente fazem os governos e os políticos aos sindicatos). Não deu a entender que faz o que faz movido por qualquer espiritualidade: faz porque é justo. Contratos assinados são para se cumprir, custe o custar a quem custar. «Não foi um denário que nós ajustámos? Leva, então, o que te é devido e segue o teu caminho, pois eu quero dar a este último tanto como a ti. Ou não me será permitido dispor dos meus bens como eu entender? Será que tens inveja por eu ser bom?’»

 

O proprietário rico vem propôr um mundo estruturalmente diferente, com regalias sociais: um mundo solidário. Os exegetas não encontram razões para dizer que esse amo/chefe de família represente, analogicamente, a figura de Deus Pai (eis os argumentos: grande acumulação de bens e conduta incoerente; igual para Mt 18:23-35).

 

Este homem rico propõe uma sociedade «menos hierárquica e mais igualitária» (W. Carter). É um chefe de família, rico, − não é um profeta moralista, nem persegue uma espiritualidade caritativa: quer, apenas, demonstrar que é possível organizar a economia em outros moldes. De tal maneira está convencido que o é, que nem teme ficar falido. Na verdade, não faliu. Talvez tenha até aumentado a sua produtividade: quem passa de uma situação de marginalidade de fim de linha (sem esperança) e retoma um contrato de trabalho promissor, redobra o seu empenho, trabalha com mais alegria.

 

Em resumo: a narrativa diz-nos que é possível um mundo outro! Economicamente, mais solidário. A Igreja católica terá entendido?

 

É possível um mundo sem precários, sem pessoas sujeitas a longos intervalos do ano sem trabalho (uma vinha só dá trabalho pelo tempo das vindimas). Um denário, à época, equivale ao montante do RSI actual: rendimento mínimo. Não se pode dizer que o proprietário tenha sido muito generoso. O seu valor está em ter posto em causa, com o seu gesto, um sistema que assenta no desemprego massivo e na falta de solidariedade social (hoje diríamos, na falta de Estado Social assente na contribuição/distribuição solidária, por oposição a uma (in)Segurança Social assente na Capitalização). Em contrapartida, a vida dum precário é a pobreza miserável, a desnutrição de toda a família, as doenças e a mendicidade. Naquele tempo, era bem preferível ser «escravo», pois isso significava ter alguém (um amo) que despensa ocupação, comida e cuidados sociais.

 

A vida de Jesus Cristo é agónica: Ele leva(ou) por diante uma luta contra «uma economia sem coração». Quase que podemos dizer que desde tempos imemoriais houve motivos para se cantar A Internacional!

 

Cantemos, então, pelo Natal, esta Mesa Fraterna à moda de Jesus, em que os últimos serão os primeiros a servir e os camelos passarão sempre folgadamente pelo fundo duma agulha.





Jesus surge, o Capital especulativo (jovem rico, Mamon) recua e o empresário empregador avança, destemido, acreditando no Estado Social segundo um «esquema público de repartição» assente numa «lógica de solidariedade baseada no trabalho». [Clara Murteira[8]]


Mais uma vez, Deus recusa-se a pôr a mesa aos banqueiros. Deus não está do lado do Capital, mas dos Direitos do Trabalho solidário.

 

 

pb\

 

 



[2] No tempo de Jesus estava em marcha uma revolução social e económica da Palestina de que não havia memória, com a passagem duma sociedade exclusivamente agrária a uma civilização fortemente imperial e urbana, tendo nas obras públicas (construção de grandes cidades, como Séforis, Tiberíades, Cafarnaúm, Antioquia. etc.) e no comércio internacional uma força profundamente desestruturadora das relações de vizinhança. Flávio Josefo identifica sempre, como aliados de Roma neste empreendimento civilizacional, os chefes dos sacerdotes e os «fariseus mais notáveis» (GJ 2.197, 320, 411, 414). Roma coopera com as elites locais e utiliza-as para exercer o controlo da Judeia (Goodman, Ruling classes of Judea, 29-36, citado por Warren Carter).
[3] Enciclopédia EINAUDI, «Capital», Volume nº 40, INCM 2001, pp. 23s.
[4] Citado por EINAUDI, ibidem, p. 108, Lohnarbeit und Kapital, in «Neue Rheinische Zeitung», 1849, nn. 264-67, e 269 (trad. it. Editori Riuniti, Einaudi, Roma 1960).
[6] Nunca como este ano, a moda do «ajude a ajudar»…
[7] Karl Marx, Une Biographie, Verlag Zeit im Bild, Dresde 1968, p. 143-144. (Ed. do Instituto de marxismo leninismo do Comité Central do Partido Socialista Unificado da Alemanha, 1967)
[8] Le Monde Diplomatique – edição portuguesa, Dezembro de 2012, pp. 4-5.