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3.Formação Moral – Propaganda
Foi Robert Owen, o pioneiro da melhoria nas condições de trabalho de New Lanark, quem observou que «o carácter do homem é feito para ele e não por ele» e que, por conseguinte, os padrões morais comunais são uma faceta da persuasão em massa.
Registam-se seis principais técnicas de formação moral.
Uma das mais antigas, e se calhar ainda a mais importante de todas, é a imitação de heróis e heroínas. Cada sociedade tende a produzir o seu próprio bloco de modelos, reais ou fictícios, os quais se tornam no foco da mimese comportamental. A Idade Média teve os seus neuf pieux, de entre os quais, Aníbal, Alexandre Magno, Carlos Magno e, claro, o rei Artur. Depois, Cristo, Buda e Maomé, a Virgem Maria, São Francisco, Florence Nightingale, George Washinton, Lenine, Mao e por aí diante, num sem fim de personagens que a história sempre cria. Um santo tinha que ser um espectáculo ou um criador de imagens, tal como o herói tinha que ser maior do que a vida.
A segunda maior técnica de formação moral é o recurso ao ritual, o qual engloba o princípio pavloviano da habituação, o cubo de açúcar paliativo no final de cada truquezinho altruísta, que cresce até se transformar num arsenal permanente de reacções morais predeterminadas a dadas situações.(…) - comer com faca e garfo, ceder o lugar a uma idosa no autocarro, tirar o chapéu, o peregrinar (reforço das normas grupais), o rezar o terço (aliando a repetição verbal a um acto físico), etc. etc.
A terceira é a criação de metas e prémios, medalhas e certificados, símbolos perenes de desempenho que proporcionam níveis bastante mesquinhos, mas eficazes, de satisfação.
A quarta, a utilização da embalagem perfeita sob a forma de mnemónica: os dez mandamentos, os oito caminhos budistas para o céu e as dez depravações, os sete pecados capitais da Idade Média, os cinco valores dos Sikhs todos começados com ‘K’, os cinco ‘M’ do Tantra indiano. A redução dos ensinamentos éticos a fórmulas curtas e de fácil memorização é uma componente fulcral da propaganda e da formação moral comunal: Santo Agostinho e São Bernardo usavam rimas para sublinhar passos importantes nos seus sermões.
Talvez a maior ferramenta da moral didáctica tenda a ser a parábola (…) À medida que a sociedade se desenvolve, a parábola é transmutada em mito (…) – a fidelidade de guerreiros leais, o altruísmo das mães, a vaidade dos ricos, a crueldade dos senhores, a bondade dos camponeses, os perigos de ofender a natureza e assim por diante. Cada sociedade cria um grande herói tomba-gigantes ou mata-monstros como Perseu ou São Jorge. A maior parte delas teve salvadores que se sacrificaram.
Joseph Campbell descreveu a função social da mitologia como aquela que estabelece «sistemas de sentimentos», modelos comportamentais para todas as ocasiões. Muito do esforço criativo que é produzido pelos novos mitos de cada geração, mais do que didáctico, é um desejo subconsciente de racionalizar atitudes morais já assumidas e de as integrar na mobília psicológica dos próprios criadores seus pares, e - chegado o tempo - dos seus descendentes.
É em parte devido a este processo que, atitudes morais consideradas por muitas sociedades completamente desumanas e cruéis, são racionalizadas como novas tradições. Deste modo, a antipatia invejosa para com os pequenos comerciantes judeus transformou-se em castigo justificado pela crucifixão de Cristo, a preocupação com o carreirismo eclesiástico transformou-se na perseguição competitiva aos hereges.
Numa direcção oposta, o medo da fome perverteu-se na necessidade de sacrifício humano, o medo de uma morte solitária perverteu-se enterrando vivas as viúvas na Índia, o medo de uma futura adversidade converteu-se na necessidade de denunciar bebés fracos à nascença.(...)
(fim)
Oliver Thomson, História do Pecado, ed. Guerra e Paz, Out 2010 ISBN 978-989-8174-86-4 (excertos)