A Realidade Eucarística
Mt 18:20
“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome
eu estou no meio deles”
Apesar de pertencer à tradição mais antiga, a Eucaristia é uma realidade
muito profunda e complexa, talvez, a realidade cristã mais difícil de
compreender e explicar. Não pretendo explicá-la nem esgotar todos os seus
aspectos: isso seria impossível. Seguiremos o provérbio oriental: «Não precisas alcançar a verdade, basta-te abandonar os
teus erros».
A Eucaristia não é magia. Claro que nenhum cristão acha que, quando celebramos a eucaristia, estamos
a fazer magia. No entanto, se em qualquer dicionário formos ler a definição de
magia descobriremos que essa definição assenta como uma luva naquilo que a
maioria dos cristãos pensa da eucaristia:
“Uma pessoa
coberta de uma roupagem especial e investida de poderes divinos, realizando
gestos e pronunciando palavras «mágicas», que obrigam Deus a realizar uma
mudança - «mudança substancial» - sobre uma realidade material, como é o caso
do pão e do vinho”.
(…)
Não se trata do sacramento da carne e do sangue
físicos de Cristo. Nas palavras da consagração, «corpo» não quer dizer
corpo, e «sangue» não quer dizer sangue. Explico-me: (…)
Aquilo que os judeus tinham como a coisa mais horrorosa – apropriar-se da vida
(do sangue) do outro – é o que Jesus
pretende que aconteça. Tendes de fazer vossa a minha própria vida. Tendes de
viver a mesma vida que eu vivi.
Está a dizer-nos que a nossa vida só será cristã se for derramada, se for
consumida para benefício dos outros. Na eucaristia confessamos que ser cristão é ser para os outros.
Todas as estruturas que assentam no lucro, pessoal ou
de grupo, não são cristãs.
(…)
Frei Marcos, op
Santo «Sacrifício» da Eucaristia
&
«Comunhão» eucarística
«Sobre a Eucaristia
como sacrifício investigou-se e discutiu-se com
muito fervor e escreveu-se sem limites. A própria importância do tema parece
exigi-lo, bem como a dificuldade de explicar em que sentido a eucaristia é
sacrifício, em que tipo de inter-relação se cruzam as múltiplas celebrações –
todas e cada uma – com o sacrifício único e irrepetível de Cristo na Cruz.
«A minha tarefa é
modesta: oferecer algumas reflexões bíblicas sobre o tema, a fim de enriquecer
a minha participação.
1. A comunidade de
Israel elaborou um complexo e diferenciado sistema de culto, que originou uma
terminologia diferenciada. Antes de mais, há que distinguir entre sacrifício e
oferenda (zebah
e minha):
no primeiro, oferece-se uma vítima animal, no segundo oferece-se pão ou
farinha, preparados de modos diversos, e acompanhados, consoante os casos, de
azeite, sal, vinho, etc. A partir da ideia do ‘ofertório’, os nossos dons assemelham-se mais a «oferenda» que a sacrifício. A palavra “minha”
significa tributo, ou seja, a entrega
do vassalo ao soberano: reconhecimento e entrega, ao mesmo tempo. (…)
«Toda esta
“instituição” é, de algum modo relativizada por uma série de textos que
aprofundam este sentido ou o trasladam a outros actos. (…) Se a morte de Cristo é um sacrifício, não
segue o ritual do culto, antes o contradiz. Um “criminoso”
dependurado dum patíbulo é abominável aos olhos de Deus (Dt 21:23). O estilo
parece negar ponto por ponto o ritual; não há templo, apenas uma colina de
supliciados; não há altar, apenas cruz ignominiosa; não há animal “sem defeito”
(perfeito), apenas um homem condenado; muito menos há combustão (fogo) ou banquete. E, paradoxalmente,
diante de tamanha negação do rito, parece salvar-se o sentido autêntico do
sacrifício, que é reconhecimento e entrega.» [...]
Luis Alonso Schökel, sj