teologia para leigos

31 de outubro de 2013

O PREÇO DA DESIGUALDADE 4/4 [J. STIGLITZ]


99% - 1%



IV PARTE

O CAMINHO PARA A FRENTE:
- OUTRO MUNDO É POSSÍVEL


Para a maioria das pessoas, os salários são a mais importante fonte de rendimento. As políticas monetárias e macroeconómicas que provocam mais desemprego – e salários mais baixos para os cidadãos – são uma grande fonte de desigualdade na nossa sociedade actual. Nos últimos 25 anos, as políticas e as instituições monetárias e macroeconómicas «correctas» falharam quanto a produzir estabilidade; falharam quanto a produzir um crescimento sustentável; e, mais importante ainda, falharam quanto a produzir um crescimento que beneficiasse a maioria dos cidadãos na nossa sociedade.

À luz destas falhas dramáticas, poderíamos ter antecipado uma estratégia de enquadramento macroeconómico e monetário alternativo. Mas, tal como os bancos – que defendem que nenhum sistema é à prova de acidentes, que têm sido vítimas de uma inundação raríssima, e que a nossa actual recessão não é motivo para mudar um sistema que funciona – têm sido notavelmente bem sucedidos em resistir à regulação, muitos dos que mantinham as erróneas crenças macroeconómicas, que conduziram às defeituosas políticas monetárias, continuam a mostrar-se impenitentes. Mantêm-se relutantes em mudar essas crenças. Afirmam que a teoria estava certa: o que se passou foram algumas falhas na sua implementação. [Cf. Ben S. Bernanke, «Implications of the Financial Crisis for Economics», discurso na Conferência co-patrocinada pelo Centro para Estudos de Política Económica e o Bendheim Center for Finance, Princeton University, 24 de Setembro de 2010]

(…)


Outro mundo é possível

Não vale a pena fingir. Apesar da crença persistente de que os norte-americanos gozam de maior mobilidade social que os seus parceiros europeus, os Estados Unidos já não são a terra das oportunidades.

Nada ilustra tão vivamente o que aconteceu como a aflição dos jovens de hoje. Em vez de começarem uma nova vida, cheios de entusiasmo e esperança, muitos deles confrontam-se com um mundo de ansiedade e medo. Sobrecarregados com empréstimos estudantis que sabem que terão dificuldades em pagar, e que não serão reduzidos mesmo que entrem em falência, procuram bons empregos num mercado deprimente. Se têm sorte de arranjar trabalho, os salários serão decepcionantes, muitas vezes tão baixos que terão de continuar a viver com os pais.[1]

Os pais cinquentenários têm de se preocupar com os filhos e ao mesmo tempo com o seu próprio futuro. Perderão as suas casas? – interrogam-se. Serão forçados a reformar-se mais cedo? – atemorizam-se. As suas poupanças, bastante diminuídas pela Grande Recessão, chegarão para o resto da vida? – angustiam-se. Sabem que se enfrentarem dificuldades, não poderão contar com a ajuda dos filhos. De Washington chegam notícias ainda piores: cortes no Programa Medicare, os quais tornarão incomportável o acesso à saúde a alguns grupos. A Segurança Social também parece estar na mesa de corte. Para os norte-americanos que enfrentam a velhice, uma reforma confortável parece uma miragem. Os sonhos de uma vida próspera e melhor para os seus filhos podem ser tão antiquadas quanto um filme da década de 1950.

O que tem acontecido nos Estados Unidos também tem acontecido em muitos países do mundo. Mas não é inevitável. Não é inexorável ESTE funcionamento da economia de mercado.

(…)


Durante cerca de 30 anos os trabalhadores norte-americanos viram o seu nível de vida corroer-se. Para os que, nas profundezas da Grande Depressão, afirmaram que as forças do mercado acabariam por triunfar e fariam a economia regressar ao pleno emprego, Keynes respondeu que sim, a longo prazo, os mercados podem funcionar – mas a longo prazo estamos todos mortos.

(…)


Quando pensamos sobre como fortalecer a nossa economia, é imperativo que não sucumbamos ao fetichismo do PIB. Vimos (nos Capítulos 1 e 4) que o PIB não é uma boa medida de desempenho económico. O PIB não reflecte com rigor as mudanças nos padrões de vida, de um modo geral, da maioria dos cidadãos, e não nos diz se o crescimento que experienciamos é sustentável.

(…)


Seria importante garantir um maior acesso a informação objectiva, sem carácter tendencioso, seguindo o exemplo de vários países escandinavos. Em vez de terem a comunicação social completamente controlada por magnatas – a maioria deles pertencem aos 1% do topo, e cujos media reflectem em grande parte as visões dessa elite –, tentaram, com algum êxito, criar uma comunicação social mais democrática. Podíamos, como muitos países europeus, dar apoio público a vários grupos de reflexão independentes, para garantir um debate mais equilibrado sobre a sensatez de políticas alternativas. (…)


Joseph E. Stiglitz, Prémio Nobel da Economia de 2001.











[1] Ver Capítulo 1 para uma abordagem mais detalhada.