A Opção pelos Pobres é «Opção
pela Justiça»,
(e não é Preferencial)
Para um reenquadramento teológico-sistemático
da «Opção pelos Pobres»
Os pais da «Teologia da Libertação» |
Situação da questão
Sempre dissemos que a Opção pelos Pobres se fundamenta em Deus mesmo, no ser de Deus, e tem, portanto, natureza
“teocêntrica”.[1]
De alguma maneira, podemos dizer que o próprio Deus é quem faz a opção pelos
pobres - Deus “é” opção
pelos pobres. Era um consenso universalmente sentido que esta Opção pelos
Pobres se baseava, precisamente, no Amor-Justiça do Deus bíblico e cristão.[2]
Entretanto, com o advento da “crise da Teologia da Libertação”, alguns
autores suavizaram o seu discurso sobre a “Opção pelos Pobres”, preferindo
abandonar a perspectiva do Amor-Justiça,[3]
substituindo-a
quase completamente pela da “gratuitidade” de Deus como fundamento da
Opção pelos Pobres. Neste novo posicionamento, Deus, simplesmente “prefere” os
pobres, tem uma “fraqueza” misericordiosa, uma “ternura” incontida para com
eles, e não é preciso procurar muitas razões para esse facto, precisamente
porque é “gratuito”.
A Opção pelos Pobres
resultaria numa espécie de “capricho” de Deus para com os “pequenos”, os
“fracos”, os “insignificantes”. É destes que
hoje se deveria falar, e já não mais dos “pobres” no sentido forte[4]
do discurso clássico, o qual hoje estaria já ultrapassado. A própria teologia
da Opção pelos Pobres deveria desvincular-se do tema forte da justiça e ser adjudicada ao tema suave
da gratuitidade.
A minha tese é
(…)
José María Vigil
[14 pp.]
[1] “Digamo-lo com clareza: a razão última dessa opção está no Deus em quem
cremos. (...) Trata-se, para o crente, de uma opção teocêntrica, baseada em
Deus”. G. GUTIÉRREZ, “El Dios de la Vida”, Christus
47(1982)53-54, G. GUTIÉRREZ, La fuerza
histórica de los pobres, Lima, 1980, pp 261-262.
[2] Apesar de ser uma obviedade, ver a tese doutoral de J. LOIS, Teología de la Liberación: opción por los pobres.
Madrid: IEPALA 1986. Aí se estuda a Opção pelos Pobres em vários dos principais
teólogos da libertção do período clássico.
[3] Um caso claro pode ser o de Gustavo GUTIÉRREZ.
Numa palestra pronunciada diante de Ratzinger, afirma: “A temática da pobreza e
da marginalização convida-nos a falar de justiça e a ter presentes os deveres
do cristão a respeito. Na verdade é assim, e esse enfoque é sem dúvida fecundo.
Mas não se deve perder de vista o que faz que a opção preferencial pelos pobres
seja uma perspectiva tão central. Na raiz dessa opção está a
gratuidade do amor de Deus. Este é o fundamento último da
preferência”. A
partir desse momento, já não volta a aparecer a palavra “justiça” na sua
dissertação e toda a Opção pelos Pobres gira em torno à
“gratuidade”. Cf. G. GUTIÉRREZ, Una teología da liberación en el contexto
del tercer milenio, in VÁRIOS, El futuro de la reflexión teológica en
América Latina. Bogotá: CELAM, 1996, p. 111. Não se trata de um texto
isolado, mas sim, na minha modesta opinião, de uma perspectiva suavizada comum
na teologia da Opção pelos Pobres de G. Gutiérrez já há mais de uma década; cfr.
G. GUTIÉRREZ, Pobres y opción fundamental, in Mysterium
Liberationis, San Salvador, UCA Editores, 1991, pp. 303ss, 310.
[4] Pobres que eram uma realidade “coletiva, conflitiva e socialmente
alternativa”: C. BOFF, ¿Quiénes son hoy
los pobres, y por qué?, in J. PIXLEY / C.BOFF,
Opción por los pobres, Madrid: Paulinas, 1986, pp. 17ss.