JESUS E O REINO DE DEUS
(…)
O que de positivo deve a Igreja fazer é colocar-se naquele lugar a partir do
qual se ilumine a tarefa concreta que tem de realizar numa determinada época: o seguimento
de Jesus.
E, a
partir daí, aprender a valorizar a sua missão, sem apelar apressadamente à
apocalíptica (isto é, à plenitude ainda não conhecida) a fim de ignorar ou
desvalorizar o presente histórico, mas seguindo, isso sim, o caminho profético de Jesus.
A apocalíptica deve ser, hoje, igualmente o horizonte último para a igreja, mas
não – como foi e é tentação frequente − à custa de ignorar o último da história.
A
missão da Igreja tem que ser pensada e levada a cabo não só a partir do reino de Deus, mas a
partir da aproximação desse reino.
Por isso, hoje como no tempo de Jesus, a apocalíptica adquire formas concretas
e verificáveis.
E
porque a existência escatológica que se oferece à Igreja é o seguimento de
Jesus, e não
uma mera imitação mecânica de Jesus, a Igreja terá que aprender como
é que, historicamente,
se põe ao serviço da aproximação do reino.
De Jesus aprenderá o
rumo fundamental:
.
que Deus é maior do que qualquer configuração histórica da própria Igreja;
.
que Deus é também e paradoxalmente menor, posto que o seu rosto surge nos mais
pequenos e oprimidos;
.
que o pecado tem nomes concretos na história e que ele encarna não só no
indivíduo, mas na sociedade;
.
que a praxis do amor é o último que pode realizar;
.
que esse amor tem que ser eficaz e realmente transformador e, por isso, deve
chegar não apenas à pessoa como indivíduo, cônjuge, familiar ou amigo, mas à
sociedade como tal, às maiorias oprimidas, isto é, deve ser justiça;
.
que o seguimento de Jesus é parcial para com os pobres e oprimidos;
.
que há que estar disposto, tal como Jesus, a mudar, a converter-se, a passar
por roturas, a deixar Deus ser Deus;
.
que há que estar dispostos à entrega, ao sacrifício, à perseguição, a dar a
própria vida e não a preservá-la para si.
Dentro deste rumo do seguimento, a Igreja irá aprendendo, a
partir de dentro, correndo riscos e equívocos:
.
quais são as
mediações concretas que hoje mais se aproximam do reino de Deus;
.
quais serão os
sistemas sociais, económicos e políticos que melhor iluminam a
aproximação do reino;
. onde adeja o
Espírito de Jesus, se nos centros do poder ou se nos rostos dos
oprimidos;
. como deve ser
concebida
e organizada a
Igreja: a partir das alturas institucionais ou a partir da base
do povo;
. que pecados
concretos devem, iniludivelmente, ser denunciados, etc., etc.[1]
Colocar
a questão da escatologia do reino de Deus, torna-se, então, mais simples.
Trata-se de aprender, de Jesus, como viver, como ser Igreja na fé do reino que
se aproxima. É neste processo de aproximação
que o homem e a mulher se devem transformar. Esta aproximação do reino ─ sem nenhum tipo de falsa piedade ─ é entendida a partir da aproximação
de Jesus, a qual acontece no seu seguimento. É isto que cremos ser decisivo
para a Igreja, pois é a partir daí que melhor se entende o último de Jesus. (…)
Jon
Sobrino, sj
[pp. 19]
[1]
Como, após a ressurreição de Jesus, elaborar esse discernimento, na história,
já o dissemos em «O seguimento de Jesus como
discernimento cristão», em Concilium, Novembro 1978, pp.
521-529.