teologia para leigos

31 de maio de 2013

O DEUS DE JESUS [PAGOLA]

O Deus de Jesus,
Boa Notícia para todos

 
«Es bueno creer en Jesús», J A PAGOLA

Marcos resume, nestes termos, a mensagem e a actuação de Jesus: Jesus «proclama a Boa Notícia de Deus» (Mc 1:14). Quando o evangelista faz esta afirmação está, sem dúvida alguma, a recolher uma experiência que as pessoas da Galileia realmente viveram junto de Jesus. Nós, que vivemos numa sociedade atravessada pelo laicismo radical, onde medra o agnosticismo, a descrença e diversas formas de ateísmo, há perguntas que não podemos evitar: como é que Jesus foi capaz de fazer a experiência de Deus e comunicá-la como Boa Notícia? Como é que aquelas pessoas conseguiram perceber, na sua mensagem e na sua actuação, Deus como algo novo e bom?

Colocar estas questões não é um jogo supérfluo, já que elas desafiam-nos a procurar respostas a interrogações que, de uma maneira difusa e secreta, nos roem por dentro, a nós os seguidores de Jesus: pode o Mistério de Deus chegar a ser Boa Notícia na nossa sociedade? O que é que tem que acontecer de modo a que Deus possa ser intuído como Boa Notícia pelos homens e mulheres do nosso tempo? À custa de quê é que o Deus que Jesus viveu, anunciou e praticou pôde ter sido entendido como Boa Notícia pelo ser humano?


1.   O projecto humanizador de Deus

(…)

Identificado com os últimos, Jesus começa a transmitir uma mensagem nova e diferente acerca de Deus utilizando uma linguagem surpreendente e provocadora. A compaixão de Deus exige que se faça justiça aos mais indigentes e humilhados. O reino do Pai está destinado, antes de mais ninguém, a eles. O reino de Deus não pertence a todos indiferentemente por igual: quer aos latifundiários que se banqueteiam em Tiberíades quer aos mendigos que morrem de fome pelos caminhos da Galileia. Jesus cruza-se com famílias que de repente ficam sem terras forçadas pela acumulação de dívidas, e grita-lhes: «Bem-aventurados vós que não tendes nada, porque o reino de Deus é vosso». Vê bem de perto, com os seus próprios olhos, aqueles meninos desnutridos a quem tanto ama, e diz-lhes: «Bem-aventurados vós que agora passais fome, porque Deus vos quer à mesa, a comer». Vê a chorar de raiva e de impotência os camponeses quando os cobradores de impostos lhes retiram o melhor das suas colheitas, e assegura-lhes: «Bem-aventurados os que agora chorais, porque Deus vos quer a sorrir de satisfação».[1]

As bem-aventuranças de Jesus encerram uma mensagem que nunca pode faltar quando comunica a Boa Notícia de Deus. O conteúdo delas quer dizer o seguinte: «Aqueles que não interessam a ninguém, interessam a Deus; aqueles que estão a mais nos impérios construídos pelos homens, têm um lugar privilegiado no seu coração; aqueles que não têm ninguém que os defenda, têm a Deus como Pai».

Jesus é realista. A sua actuação entre os camponeses da Galileia não significa que a fome e a miséria vão terminar de imediato, mas incute uma dignidade indestrutível em todas aquelas vítimas de abusos e atropelos. Toda a gente há-de saber que eles são os filhos e as filhas predilectas de Deus. Isto confere, à sua dignidade, uma seriedade absoluta. E que nunca, em parte alguma, se poderá dizer que se constrói a vida segundo a vontade de Deus se não for libertando esses homens e essas mulheres da sua miséria e da sua humilhação. Que nunca em parte alguma se louvará a Deus se não se for capaz de se fazer a justiça a eles. O Deus que Jesus proclama obriga as culturas, as políticas e as religiões a olhar para os últimos. A Boa Notícia de Deus anuncia-se construindo um mundo que tenha como meta a dignidade dos últimos.

(…)


J A Pagola

[pp. 9]







[1] Os autores, em geral, atribuem a Jesus estas três bem-aventuranças recolhidas por Lucas em 6:20-21.