Culto «em espírito e
em verdade»
O
cristianismo histórico não é alheio aos ritos; os ritos constituem uma das suas mais
notórias manifestações. Mas, terá sido sempre assim? Desde os começos que os
cristãos e as cristãs celebravam ritos, ainda que não como continuidade dos
ritos judaicos ou como prolongamento da ritualidade pagã da época, mas com
traços muito peculiares. É o caso do baptismo e da eucaristia. (…)
Uma
questão inevitável, quando tratamos da eficácia dos sacramentos, é o ex opere operato. Com esta expressão
pretende-se indicar que os sacramentos conferem a Graça em razão da obra
realizada ou operada. Assim o reconhece o concílio de Trento e assim continua a
ser definido como doutrina católica ainda hoje. Foi esta ideia que deu azo a
que se relacionasse, frequentemente, a eficácia sacramental com a eficácia dos
rituais mágicos e levou a associar os sacramentos à magia[1].
O
sacerdote associa-se a um mago. Uma das funções a ele cometida é a correcta
execução das acções sacramentais. É, precisamente, da pessoa do sacerdote e da correcta
execução dos ritos que se faz
depender a consecução dos resultados esperados[2].
Melhor
do que mil explicações, um exemplo. Para que a acção ritual-eucarística seja
eficaz deve ser realizada por um varão ordenado sacerdote. Se uma mulher ou um varão não ordenado sacerdote
realiza impecavelmente todas as cerimónias da eucaristia e pronuncia com plena
convicção e devoção as palavras da consagração eucarística «isto é o meu
corpo», «este é o meu sangue», a acção ritual carece de efeito.
A
centralidade do celebrante nos sacramentos foi defendida no século III por S. Cipriano,
que era partidário da repetição do baptismo, caso ele fosse administrado por
ministros que tivessem abraçado a heresia.
Porém,
esta concepção foi minoritária e não conseguiu impor-se posteriormente. A
posição que conseguiu converter-se em posição oficial foi a de Santo Agostinho,
que relativizava a importância do sacerdote e centrava a sua atenção na obra de Cristo e na aceitação
de tal obra por parte da pessoa crente.
Hoje,
coloca-se o acento no protagonismo da comunidade cristã. O ministro
«só tem sentido na medida em que actue ao serviço da comunidade eclesial», diz
J.-M. Tillard. É
a comunidade «quem, através da mediação do ministro, celebra o
sacramento». Mais: «a intenção do ministro está como que comandada e
trespassada pela intenção da assembleia»[3].
Juan José Tamayo-Acosta
Teólogo
e Filósofo, diplomado em Ciências Sociais, secretário geral da “Asociación de
Teólogos «Juan XXIII»”, membro da Associação
Europeia de Teólogos, professor do Instituto
Universitário de Teologia e da Escola Bíblica, professor convidado do Mount Saint Mary College (Los Angeles).
[pp. 6]
Excommunication of Dr Martha Heizer
religião-pessoas consagradas-lugares sagrados-objectos consagrados-sacrifícios religiosos-sacerdotes-poder-bodes expiatórios-puro-impuro-permitido-proibido- etc etc etc
Ordenação de "bispas" na Igreja Anglicana
cria obstáculos ao ecumenismo
- dizem bispos católicos
Mulheres passarão a poder ser bispas na Igreja Anglicana
Posible cisma en la Iglesia Anglicana
Lei canónica acolhe anglicanos em Roma
Anglicanos regressam à Igreja católica – I Parte
Anglicanos regressam à Igreja católica – II Parte
«CONVÉM
QUE HAJA HERESIAS»
[S.
Paulo]
«Convém que haja heresias»
- Isto o afirmava Paulo aos coríntios (1 Cor 11:19), convencido de que as
divisões podem enriquecer e acrisolar os espíritos robustos. (...)
A expressão, na
Carta de Paulo, começa por querer dizer "diversidade de opiniões", e
Paulo louva essa diversidade, reconhecendo que as opiniões são diversas porque são
«parciais». Porém, parciais não no sentido de injustas, mas de
fragmentares ou não-totais; «parciais»
não por oposição a «imparciais», mas opostas a «totais»: «parcialidade» seria
uma boa tradução da palavra grega airesis, da qual derivou a nossa palavra
«heresia».
Esta parcialidade, e
a consequente diversidade de opiniões, pode ser boa, porque, se nos
confrontarmos com ela, ela nos enriquece, e porque nos ajuda a compreender que
todos somos parciais e que ninguém abarca a totalidade, por mais que julguemos
o contrário. Neste sentido, a pluralidade é dura, por vezes muito dura, porém é
uma grande fonte de enriquecimento: pelo quanto nos traz de novo e pelo que nos
obriga a ser. Nesse sentido, (…) convém que haja
pluralidade no cristianismo. [J. I. González Faus, «Herejías del
catolicismo actual», Introdução]
Talvez por isso
comecemos, agora, a compreender por que é que H. Mühlen definiu o Espírito
Santo como «experiência social de Deus». Tal como na vida trinitária
de Deus, é do Espírito (que une ao Pai e ao Logos) que faz com que o Deus-uno
(e único) seja experienciado a si mesmo como pluripessoal (digamo-lo assim,
apesar de todas as imperfeições inerentes ao nosso linguajar), assim também nos
seres humanos – imagens de Deus – o Espírito possibilita a experiência de plena
unidade de ânimos (un-animidade). Para a Igreja dos começos, a
plena unanimidade (por exemplo, nas eleições episcopais) era um sinal
indiscutível da presença do Espírito: semelhante ao espírito de Yahvé como quando
se agitava sobre as águas do caos e activava a palavra criadora de Deus (Gn
1:2).
Porém, acontece que
essa experiência social brota daquilo
que é a realidade mais intimamente definidora, brota do mais personalizador e
da fonte mais radical da liberdade do indivíduo. Mais: qualquer tipo de confusão entre unidade e
uniformidade é contrário ao espírito de Jesus. Se atrás aludimos ao
perigo de um «espírito sem Deus» – em pessoas que abandonaram a fé e continuam
à procura – agora poderemos dar a volta à expressão e falar de um «Deus sem
Espírito» em muitos católicos de agora. Esses não entenderam que
baptizarem-se (e assinalarem-se) «em nome do Pai, do Filho e do Espírito» quer dizer
que nos persignamos «em nome do Deus da Vida, da Solidariedade e da Liberdade
máximas».
Assim, devemos concluir
que a existência cristã é enormemente dialéctica precisamente
porque Deus é Uno e Trino. [J. I. González Faus, «Herejías del
catolicismo actual», p.122-123]
Ω
[1] José Lisboa Moreira de Oliveira, diz:
«Gilberto Dupas, citando Debord, em seu livro «Ética e poder na sociedade da informação» (São
Paulo: Unesp, 2011) responde de maneira magistral: - o espectáculo é "o herdeiro da grande
fraqueza do projecto filosófico ocidental". De fato, "como
a filosofia jamais conseguiu superar a teologia, o espectáculo é a reconstrução material da
fantasia religiosa, a realização técnica do exílio, a cisão
consumada do interior do homem. O espectáculo funciona ‘quase como uma forma de
reconstrução material da ilusão religiosa. Ela já não remete para o céu, mas
abriga dentro de si sua recusa absoluta, seu paraíso ilusório'" (p. 52). Aplicando
à Igreja e à liturgia o que disse Dupas, podemos afirmar que o espectáculo faz da Igreja um circo.
Quando certos padres, e "presbiretes", viram palhaços,
"cuspidores de fogo na Igreja", transformam celebrações litúrgicas em shows. Buscam, na
verdade, minutos de glória fugaz
para si, tratam a assembleia dos fiéis como uma massa de dementes e desvirtuam
o espírito do Vaticano II. Com isso causam a alienação do fiel, o qual vira um
mero espectador,
levando-o a não mais participar plena e activamente das celebrações e nem
compreender e assumir a própria existência: a ser apenas um repetidor mecânico
dos gestos de um padre animador de programa de auditório. Com isso o padre pop star não "remete as
pessoas para o céu", mas as empurra para um "paraíso ilusório"
revestido de pura fantasia.»
[2] Confira
Albert Vanhoy, acerca das funções sacerdotais em Jesus Cristo [NdE]:
[3] J.-M. Tillard, «A propósito de la intención del ministro y del sujeto de
los sacramentos»: Concilium
31 (1968) 127-128.