teologia para leigos

1 de fevereiro de 2014

CO-ADOPÇÃO, MAGISTÉRIO E FÉ

Evangelho,
sistema ou “loucura de Deus”?
[1Cor 1:17]






[…] Massimo Faggioli, membro da Fondazioni Giovanni XXIII de Bolonia (entre 1996 e 2008) e Professor de História do Cristianismo na University of St. Thomas de Minneapolis/St. Paul (EUA), diz: «As reformas pos-conciliares da Cúria só muito parcialmente repescaram as novidades eclesiológicas introduzidas pelo Concílio e incidiram apenas sobre uma estrutura que continua a ser aquela que foi desenhada pelo Papa Sixto V em 1588. A reforma montiniana (Paulo VI), em particular, assemelha-se mais a um legado de Pio XII e menos a um património conciliar. Dalguma forma, a questão da Cúria romana volta a colocar-se, hoje, a partir do ponto em que ela estava aquando do Vaticano II.» (Concilium, Novembro 2013)

Esta perspectiva é suficientemente “tranquilizadora” para aqueles que, diante de temas escaldantes, querem reformas pseudo-modernas. Eles conhecem a realidade e o seu peso específico. Por isso, preferem meter mãos… a uma obra cosmética. É o caso de G. Müller (CDF), para quem é mais fácil «falar», com simpatia e afabilidade, de Gustavo Gutiérrez e da «reflexão académica» em torno da Teologia da Libertação (aliás, em tempos de Crise até cai bem…) do que implementá-la na Igreja universal como «um novo programa eclesiológico[1]»! É mais fácil cantar loas à Teologia da Libertação do que admitir que existem vários modelos de Família, do que defender mais do que um modelo de Moral Sexual e Matrimonial (consoante as culturas e continentes) ou do que decretar que o papel da Mulher na Igreja é mais do que dar catequese a crianças, cantar no coro, passar a ferro, enfeitar altares e varrer igrejas.

[…]


Diante das questões que agora estão nas páginas dos jornais e na abertura de telejornais (co-adopçao, etc.), começa a fazer sentido a linha de pensamento do teólogo José Maria Vigil: «o coração duma religião é a consciência e a compreensão da própria missão». Se o cristianismo já assumiu vários modelos (“doutrinal-teórico”, “moralista”, “espiritualista”, “eclesiocêntrico”), talvez, para Francisco, tenha chegado a hora de oficialmente se proclamar a Era do «cristianismo que se entende a si mesmo a partir de uma interpretação ou leitura histórica da realidade. Esta é concebida como história da salvação e, simultaneamente, como salvação da história». «Deus tem um projecto de fraternidade para a história, um sonho utópico (o Reino!), e propõe-no aos seres humanos como Utopia, encomendando-a a eles como tarefa histórica. Essa é a grande missão cristã e, dentro dela, a acção missionária consiste em sair ao encontro dos outros povos para colaborar na construção do grande projecto de Deus, que eles também perseguem – com outros nomes e mediações, sem dúvida (…)» [«Teologia do pluralismo religioso», Ed. Paulus 2006, p. 397]

Diante do problema mundial que se chama «desorientação», a Igreja corre o risco de se fechar mais uma vez na falsa opção entre ‘poder’ e ‘moral’. H. Küng alerta: «O paradigma da transmodernidade já não é europeu, mas sim um paradigma policêntrico de diversas nações e diversas religiões». Daqui decorrem «diversas dimensões da realidade: a dimensão cósmica (homem e natureza); a dimensão antropológica (homem e mulher); a dimensão sociopolítica (ricos e pobres); a dimensão religiosa (homem e Deus). Face a isto, colocam-se questões para a época vindoura e não unicamente para a cristandade, mas também para as outras religiões proféticas, questões e perguntas basilares que não se satisfazem com mera cópia de receitas baratas, mas exigem coordenadas orientadoras.» [«El cristianismo – esencia e historia», Trotta 1997, p. 778]

Teremos nós por diante, igualmente, a urgência duma renovação profunda da missão da própria Congregação da Doutrina da Fé? Julgo que isso é inevitável, caso o Papa Francisco queira levar para a frente o programa da Evangelii Gaudium.

«”Por isso, quero uma Igreja pobre (…)”, escreve o Papa Francisco no parágrafo 198 da sua primeira “Exortação Apostólica” intitulada Evangelii Gaudium (ou, traduzida, A Alegria do Evangelho). Este documento não é um entre outros: constitui o programa da igreja para os próximos anos, como o Papa também diz, logo no primeiro parágrafo. Aliás, mais adiante, no nº 25, Francisco afirma que este texto deve ser entendido “num sentido programático e [com] consequências importantes”» [Teresa Toldy, JL, 11-24 Dezembro de 2103, p. 28]

Louvado seja Deus, porque ‘extra pauperes nulla salus’… [Jon Sobrino, «Fora dos pobres não há salvação»]. Nem os pobres nem a própria Igreja de Cristo se salvam fora da loucura de um Deus débil (S. Paulo; Paul Evdokimov).


pb\










[1] Como parece ser o objectivo do Papa Francisco; cf. artigo da teóloga Teresa Toldy, «Jornal das Letras», 11-24 Dez. 2013, p. 28-29, que sublinha o «sentido programático» da Exortação Papal «Evangelii Gaudium», bem como a intenção em apontar para a «resolução das causas estruturais» dos problemas sociais. À margem disto, é estranha (para não dizer fonte de perplexidade) a resposta, na página 11 do mesmo Jornal, por parte do padre e teólogo Tolentino Mendonça, à questão do papel das mulheres na Igreja (cf. p. 11; ex.: Mary Douglas). «A ARTE DO SILÊNCIO» CLICAR AQUI