teologia para leigos

17 de junho de 2015

A ECONOMIA DA IDADE DAS TREVAS [P. KRUGMAN]

«… As ideias dos economistas e dos filósofos políticos, sejam elas certas ou erradas, têm um alcance mais poderoso do que habitualmente se pensa. De facto, o mundo é governado por ideias, e pouco mais. Os homens práticos que se julgam livres de qualquer influência intelectual são habitualmente escravos de algum economista morto. Os desvairados que ocupam posições de autoridade, que ouvem vozes a pairar no ar, destilam os seus frenesins dos escritos deixados por algum escriba académico uns anos antes. Estou seguro de que se exagera extremamente a força dos interesses adquiridos quando comparada com o gradual entranhamento das ideias. É natural que estas não actuem imediatamente, mas só depois de certo intervalo; com efeito, no domínio da filosofia económica e política, raros são os homens de mais de vinte e cinco ou trinta anos que são influenciados por teorias novas, de modo que as ideias que os funcionários públicos, os políticos e mesmo os agitadores aplicam aos acontecimentos actuais têm pouca probabilidade de ser as mais recentes. Porém, cedo ou tarde, são as ideias – e não os interesses adquiridos – que representam um perigo, seja para o bem, seja para o mal.»

J. M. Keynes, «Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda», Relógio d’Água 2010, p. 364.




A ECONOMIA DA IDADE DAS TREVAS



A macroeconomia nasceu, como um campo distinto, na década de 1940, como parte de uma resposta intelectual à Grande Depressão. O termo referia-se, então, ao corpo de conhecimentos e competências que esperávamos pudesse evitar a repetição desse desastre económico. A tese que defendo nesta palestra é que a macroeconomia, no seu sentido original, foi bem-sucedida: o seu problema central de depressão-prevenção foi resolvido, para todos os efeitos práticos, e aliás foi resolvido há muitas décadas.


Robert Lucas, discurso presidencial perante a Associação Americana de Economia, 2003


Sabendo nós o que sabemos hoje, a confiante afirmação de Robert Lucas de que as depressões económicas são uma coisa do passado soa demasiado a algo do tipo ‘as últimas palavras famosas’. E, na verdade, para alguns de nós soou realmente a algo como se tratasse das últimas palavras famosas, mesmo nessa altura: a crise financeira asiática de 1997-1998 e os problemas persistentes do Japão apresentavam uma semelhança clara com aquilo que tinha acontecido na década de 1930, levantando questões reais, como saber se a situação estava realmente sujeita a algum tipo de controlo. Escrevi um livro, editado em 1999, sobre essas dúvidas, com o título O Regresso da Economia da Depressão e a Crise Atual [edição portuguesa pela Presença]; publiquei uma edição revista desse livro em 2008, quando todos esses meus pesadelos se tornaram realidade.

Mas Robert Lucas, um nobelizado que foi um vulto gigantesco e quase dominante na macroeconomia durante grande parte das décadas de 1970 e 1980, não estava errado ao dizer que os economistas tinham aprendido imenso desde a década de 1930. Por volta de 1970, os economistas profissionais já sabiam realmente o suficiente para evitar a reincidência de algo que se assemelhasse à Grande Depressão.

E, depois, grande parte desses profissionais começou a esquecer aquilo que tinham aprendido.

Enquanto tentamos lidar com a depressão económica em que nos encontramos, é preocupante ver até que ponto os economistas tê sido parte do problema e não parte da solução. Muitos economistas destacados argumentaram a favor da desregulação financeira mesmo quando essas medidas tornavam a economia ainda mais vulnerável a crises. Depois, quando a crise rebentou, demasiados economistas famosos argumentaram, com ferocidade e ignorância, contra qualquer tipo de resposta efectiva. E, é triste dizê-lo, um dos indivíduos que avançavam com argumentos ignorantes e destrutivos não era outro senão o próprio Robert Lucas.

Há uns três anos, quando me apercebi como a profissão de economista estava a falhar no seu momento de verdade, cunhei uma expressão para aquilo a que assistia: uma «idade das trevas da macroeconomia». O meu ponto de vista era que esta crise era diferente daquilo que acontecera na década de 1930, dado que ninguém sabia ainda como refletir sobre uma depressão económica, e foi necessário um pensamento económico inovador para encontrar uma solução. Essa época foi, por assim dizer, a Idade da Pedra da economia, quando as artes da civilização estavam por descobrir. Mas por volta de 2009 as artes da civilização já tinham sido descobertas – para voltarem a ser perdidas. Uma nova barbárie tinha-se abatido sobre o campo de batalha. Como foi possível que isso acontecesse? Creio que essa situação envolveu um misto de política e de sociologia académica desenfreada.


Keynesofobia

Em 2008 demos de repente por nós a viver num mundo keynesiano, ou seja, num mundo que apresentava muitas das caraterísticas que John Maynard Keynes tinha salientado na sua obra magna de 1936, «Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda». Com isto quero dizer que demos por nós num mundo onde a falta de procura suficiente se tinha convertido no problema económico fundamental, e onde as limitadas soluções tecnocráticas, como os cortes na taxa de juro de referência da Reserva Federal, não eram adequados para essa situação. Para enfrentarmos a crise de um modo eficaz, precisamos de políticas governamentais mais ativistas, tanto na forma de despesas temporárias para sustentar o emprego, como de esforços para reduzir o sobre-endividamento hipotecário.

Poder-se-ia pensar que estas soluções continuariam a ser consideradas do foro tecnocrático e separadas da questão mais ampla da distribuição dos rendimentos. O próprio Keynes descreveu a sua teoria como sendo «moderadamente conservadora nas suas implicações», consistente com uma economia assente nos princípios da iniciativa privada. Mas desde o início que os políticos conservadores — sobretudo aqueles que estavam mais preocupados em defender a posição dos ricos — se opuseram ferozmente às ideias keynesianas.

E «ferozmente» é mesmo a palavra certa. O manual «Economia» de Paul Samuelson, cuja primeira edição data de 1948, é amplamente considerado como a obra que levou a economia keynesiana para as universidades americanas. Mas Samuelson, na verdade, foi o segundo a fazê-lo. Um livro prévio, da autoria dum economista canadiano Lorie Tarshis, efetivamente foi ostracizado pela oposição da ala direita, nomeadamente por via de uma campanha organizada que conseguiu convencer muitas universidades a banir este livro. Mais tarde, na sua obra «God and Man at Yale» [Deus e o Homem em Yale], William F. Buckley iria dirigir grande parte da sua ira contra a universidade de Yale por ter permitido o ensino da economia keynesiana.

Esta tradição continuou ao longo dos anos. Em 2005, a revista semanal Human Events, conotada com a ala direita, incluiu a Teoria Geral de Keynes na lista dos dez livros mais perniciosos dos séculos XIX e XX, logo ao lado de obras como o Mein Kampfe de Adolpho Hitler ou o Das Kapital de Karl Marx.

Porquê uma tal animosidade contra um livro com uma mensagem «moderadamente conservadora»? Parte da resposta pode ser que, apesar de a intervenção estatal defendida pela economia keynesiana ser modesta e muito específica, os conservadores sempre encararam isso como a ponta do iceberg: basta aceitar que o governo pode ter um papel útil no combate às recessões e não tarda nada estamos todos a viver sob um Estado socialista. A retórica amalgamada de keynesianismo com planeamento centralizado e redistribuição radical dos rendimentos — embora explicitamente negado pelo próprio Keynes, que declarou: «Há atividades humanas valiosas que requerem o estímulo do lucro e o ambiente de posse privada de riqueza para a sua plena fruição» — é quase universal na ala da direita, mesmo entre economistas que já deveriam estar mais esclarecidos.

Existe ainda o motivo sugerido por um contemporâneo de Keynes, Michael Kalecki (o qual, para que se saiba, foi na verdade um socialista), num ensaio clássico de 1943:


"Iremos abordar em primeiro lugar a relutância dos «capitães da indústria» em aceitar a intervenção estatal na questão do emprego. Qualquer alargamento da atividade do Estado é encarado com suspeita pelo setor privado, mas a criação de emprego por via do investimento público apresenta um aspeto especial que torna essa oposição particularmente intensa. Num sistema onde impera a cultura do laissez-faire, o nível de desemprego depende em grande medida do chamado estado de confiança. Se este estado se deteriorar, o investimento privado diminui, o que por sua vez resulta numa queda da produção e do emprego (tanto diretamente como por via do efeito secundário que a queda dos rendimentos tem sobre o consumo e o investimento). Isto confere aos capitalistas um poderoso controlo indireto sobre as políticas governamentais: tudo aquilo que possa abalar o estado de confiança deve ser cuidadosamente evitado, porque iria causar uma crise económica. Mas, assim que o governo aprende o truque de fazer aumentar o emprego por via do investimento público, este poderoso dispositivo de controlo perde a sua eficácia. Daí que os défices orçamentais necessários para implementar essa intervenção estatal sejam considerados perigosos. A função social da doutrina de «finanças equilibradas» é tornar o nível de emprego depender do estado de confiança."


Isto pareceu-me ser um pouco extremado quando o li pela primeira vez, mas agora parece-me ser demasiado plausível. Ultimamente, temos assistido a um uso quase rotineiro deste argumento da «confiança». Por exemplo, eis como Mort Zuckerman, o magnata do imobiliário e dos meios de comunicação, abriu um artigo de opinião no Financial Times destinado a dissuadir o presidente Obama de seguir qualquer tipo de linha de orientação populista:


"A crescente tensão entre a administração Obama e o setor privado causa alguma apreensão ao nível nacional. O presidente perdeu a confiança dos empregadores, cujas preocupações com os impostos e os custos aumentados da nova regulação estão a refrear a confiança. O governo deve ter em conta que a confiança é um imperativo para que o setor privado possa investir, assumir riscos e fazer voltar ao mercado de trabalho os milhões de desempregados."


Mas o facto é que não havia nessa altura, nem agora, nenhum sinal de que as «preocupações com os impostos e os custos aumentados da nova regulação» tivessem qualquer papel significativo na contração da economia. Mas na visão de Kalecki argumentos deste tipo cairiam completamente por terra se houvesse uma aceitação pública generalizada da ideia de que as políticas keynesianas poderiam criar postos de trabalho. Existe, portanto, uma animosidade especial contra as políticas governamentais diretas de criação de emprego, muito além do medo generalizado de que as ideias keynesianas poderiam legitimar a intervenção estatal em geral.

Basta unir estes motivos todos e já se compreenderá por que razão escritores e instituições com fortes vínculos ao percentil superior da distribuição dos rendimentos têm sido constantemente hostis às ideias keynesianas. E esta situação não mudou ao longo dos setenta e cinco anos desde que Keynes escreveu a sua Teoria Geral. Aquilo que mudou foi a riqueza e, consequentemente, a influência desse percentil superior. Ultimamente, os conservadores viraram demasiado à direita, mais à direita até do que o próprio Milton Friedman [o defensor do sistema de mercado livre], já que este pelo menos aceitava que a política monetária poderia ser uma ferramenta eficaz para estabilizar a economia. Noções que há quarenta anos faziam parte das franjas políticas fazem agora parte da doutrina aceite por um dos dois dos nossos maiores partidos políticos.

Uma matéria mais melindrosa é saber até que ponto os interesses pessoais do 1% do topo — ou, melhor ainda, do 0,1% da população do topo — têm colorido a discussão entre os economistas académicos. Mas seguramente que essa influência estava lá bem presente: no mínimo, as preferências de mecenas universitários, a disponibilidade de bolsas de estudo e lucrativos contratos de consultoria, etc., devem ter encorajado esses profissionais académicos não só a distanciarem-se das ideias keynesianas, mas a esquecerem grande parte daquilo que se aprendeu com as décadas de 1930 e 1940.

No entanto, esta influência dos ricos não teria ido tão longe se não tivesse tido o auxílio de uma espécie de sociologia académica desenfreada, por via da qual noções basicamente absurdas se converteram num dogma na análise das finanças e da macroeconomia.


Exceções notavelmente raras

Na década de 1930, os mercados financeiros, por razões óbvias, não conquistaram grande respeito. Keynes comparou-os


"àqueles concursos dos jornais em que os concorrentes têm de escolher os seis rostos mais sexy de uma série de cem fotografias, sendo o prémio atribuído ao concorrente cuja escolha corresponder melhor às preferências médias da globalidade dos concorrentes; portanto, cada concorrente tem de escolher não os rostos que acha mais bonitos, mas aqueles que acha que têm mais probabilidade de agradar mais aos outros concorrentes."


E Keynes achava que era má ideia deixar esses mercados — nos quais os especuladores passavam o tempo a perseguir as caudas uns dos outros — ditarem importantes decisões comerciais: «Quando o desenvolvimento do capital se transforma num subproduto das atividades de um casino, é provável que esse trabalho seja mal feito.»

Mas por volta de 1970 o estudo dos mercados financeiros parecia estar sob o feitiço do Dr. Pangloss, de Voltaire, que insistia que vivemos no melhor dos mundos possíveis. A discussão sobre a irracionalidade dos investidores, sobre bolhas e sobre especulação destrutiva tinha praticamente desaparecido do discurso académico. Esse campo era dominado pela «hipótese dos mercados eficientes», promulgada pelo economista financeiro Eugene Fama, da Universidade de Chicago, que afirma que os mercados financeiros atribuem um preço que corresponde precisamente ao seu valor intrínseco, tendo em conta toda a informação disponível ao nível público. (O preço das acções de uma empresa, por exemplo, reflecte sempre de forma exacta o valor da empresa, tendo em conta a informação disponível sobre os lucros da empresa, as suas perspectivas de negócio, etc.). E, por volta da década de 1980, os economistas financeiros, nomeadamente, Michael Jensen, da Faculdade de Gestão de Harvard, estavam a discutir que, pelo facto de os mercados financeiros atribuírem sempre os preços certos, a melhor coisa que os mandachuvas empresariais podiam fazer, não só por si próprios mas também em nome da economia, era maximizar os preços das suas ações. Por outras palavras, os economistas financeiros acreditavam que devíamos entregar o desenvolvimento do capital da nação àquilo a que Keynes chamou um «casino».

É difícil argumentar que esta transformação no campo dos economistas profissionais foi influenciada pelos acontecimentos. É verdade que a memória de 1929 estava a dissipar-se gradualmente, mas continuou a haver mercados em alta [bull markets], com histórias bem conhecidas de excessos especulativos, seguidos de mercados em baixa [bear markets]. No período de 1973-1974, por exemplo, as acções perderam 48% do seu valor. E na queda da bolsa de 1987, na qual o Índice de Dow se afundou a pique em quase 23% num único dia por nenhuma razão aparente, deveria ter levantado pelo menos algumas dúvidas sobre a irracionalidade do mercado.

Mas estes acontecimentos, que Keynes teria considerado serem prova da instabilidade dos mercados, pouco fizeram para atenuar a força de uma bela ideia. O modelo teórico que os economistas financeiros desenvolveram ao pressuporem que cada investigador pondera de forma racional os riscos contra os ganhos — o chamado Modelo de Avaliação de Ativos Financeiros, ou MAAF [Capital Asset Pricing Model, ou CAPM] — é maravilhosamente elegante. E se aceitarmos as suas premissas, também é extremamente útil. Este modelo não só nos diz como escolher a nossa carteira de acções, como – mais importante ainda do ponto de vista da indústria financeira – também nos diz como atribuir um preço a derivados financeiros[1] ou como atribuir um preço a direitos de crédito sobre outros direitos de crédito. A elegância e a aparente utilidade da nova teoria levaram os seus criadores a arrecadar uma série de Prémios Nobel, e muitos dos adeptos desta teoria também receberam uma série de recompensas mundanas: armados com os seus novos modelos e formidáveis capacidades matemáticas — os usos mais arcanos do Modelo de Avaliação de Activos Financeiros exigem computações ao nível da Física — gentis professores universitários de gestão de empresas tornaram-se, assim, em génios de Wall Street.

Para ser justo, os teóricos das finanças não aceitaram a hipótese dos mercados eficientes pelo facto de ser simplesmente uma teoria elegante, conveniente e lucrativa. Também produziram uma grande quantidade de provas estatísticas, que inicialmente pareciam ser muito sólidas. Mas estas provas eram de índole estranhamente limitada. Era raro os economistas financeiros fazerem a pergunta aparentemente óbvia (cuja resposta não era fácil, porém) de saber se os preços dos ativos faziam sentido tendo em conta aspectos básicos do mundo real como o caso dos ganhos. Em vez disso, limitavam-se a perguntar se os preços dos ativos faziam sentido tendo em conta os preços de outros activos. Larry Summers, que foi o principal conselheiro económico do presidente Obama durante grande parte dos primeiros três anos do seu mandato, chegou a ridicularizar os professores de finanças recorrendo a uma parábola acerca dos «economistas ketchup» que «demonstraram que uma garrafa de um litro de ketchup é invariavelmente vendida pelo dobro do preço de uma garrafa de meio litro de ketchup», e concluíram a partir daí que o mercado do ketchup é perfeitamente eficiente.

Mas nem esta troça nem críticas mais educadas por parte de outros economistas tiveram grande efeito. Os teóricos das finanças continuaram a acreditar que os seus modelos estavam essencialmente corretos, bem como continuaram a acreditar muitas outras pessoas que tomavam decisões no mundo real. Entre essas pessoas encontra-se o próprio Alain Greenspan, cuja rejeição aos apelos por contenção dos empréstimos subprime [de cobrança duvidosa; sub-prime: crédito de risco concedido a um tomador que não oferece garantias suficientes para beneficiar da taxa de juro mais vantajosa, a chamada prime rate] ou da bolha imobiliária sempre crescente assentava em grande parte na crença de que a economia financeira moderna tinha tudo sob controlo.

Ora bem, seria de esperar que a escala do desastre financeiro, que atingiu o mundo em 2008, e a forma como todas aquelas ferramentas financeiras supostamente sofisticadas se transformaram em instrumentos do desastre tivessem abalado essa crença ferrenha na teoria dos mercados eficientes. Mas estaríamos errados se esperássemos isso.

É verdade que, logo após a queda do banco Lehman Brothers, o próprio Greenspan declarou encontrar-se num estado de «descrença chocada», porque «todo o edifício intelectual se havia desmoronado». No entanto, em Março de 2011 tinha regressado já à sua posição anterior, apelando à rejeição das (muito modestas) tentativas de reforçar a regulação financeira na sequência da crise. Os mercados financeiros estavam de boa saúde, escreveu ele no Financial Times:

 «Tirando algumas exceções notavelmente raras (2008, por exemplo), a "mão invisível" global criou taxas de câmbio, taxas de juro, preços e índices salariais relativamente estáveis

Ei, para quê dar tanta importância a uma ocasional crise devastadora da economia mundial? Henry Farrell, um politólogo, reagiu rapidamente a estas palavras de Greenspan num artigo num blogue em que convidava os leitores a encontrar outros usos para a construção frásica «exceções notavelmente raras»: por exemplo, «Tirando algumas exceções notavelmente raras, os reactores nucleares japoneses estão protegidos contra sismos».

E o mais triste é que a resposta de Greenspan tem sido partilhada de forma generalizada. É preocupante que tenha havido tão pouca reflexão por parte dos teóricos das finanças. Eugene Fama, o pai da hipótese dos mercados eficientes, não cedeu nem um milímetro: segundo ele, a crise foi causada pela intervenção governamental, sobretudo através do papel dos bancos Fannie Mae e Freedie Mac (as agências patrocinadas pelo governo e encarregadas de encorajar o financiamento à habitação a membros de grupos minoritários). Mas, como vimos no capítulo quatro, isto não passava de uma Grande Mentira. […]


Paul Krugman, Prémio Nobel da Economia.


[13 pp.]








[1] Derivados financeiros: instrumentos financeiros cujo valor deriva do valor de outras coisas. Geralmente tomam a forma de contratos, que estabelecem trocas de dinheiro entre duas partes, numa data futura. O montante destas trocas, ou pagamentos, pode variar com base no valor dum activo subjacente: mercadoria e matérias-primas, acções, obrigações, taxas de juro, taxas de câmbio ou índices (índices de preços no consumidor, índices sobre condições atmosféricas ou até índices sobre outros derivados). É o desempenho destes activos e índices que determina tanto o montante como o ritmo dos pagamentos que resultam do derivado. (NT)