teologia para leigos

24 de julho de 2023

Mil anos após - ponto da situação

 



MIL ANOS APÓS

Ponto da situação


O pontificado de Gregório VII (1020-1085) abre uma nova fase da história ‒ o período da cristandade. Depois de Carlos Magno, o feudalismo teve como consequência que os senhores feudais conquistaram o domínio da Igreja e interferiram nas nomeações episcopais, inclusive na eleição do Papas, e, localmente, na eleição dos sacerdotes. Um sinal, um alerta: eles inventaram a instituição dos abades leigos («ou “abades comendatários”, leigos, designados em latim como defensores, abbacomites, abbates laici, abates milites, abbates saeculares ou irreligiosi, abbatiarii, ou, por vezes, apenas abbates.»; Wikipédia). Já que as abadias eram ricas, eles queriam colocar, como abades, os membros da sua família, não por vocação religiosa, mas para se apropriarem dos bens do mosteiro. Foi assim que conseguiram confiscar todas as riquezas da Igreja.

Quase não temos documentos sobre como foi a vida religiosa do povo durante essa época. Temos somente queixas de monges e clérigos sobre a crueza e a pobreza espiritual do povo. Com certeza, a pregação e os esforços dos missionários não ficaram sem frutos. Até que ponto eles souberam transmitir o Evangelho num meio onde o sincretismo religioso predominava, sobretudo, nos povos dos campos? O facto de os mosteiros se multiplicarem indica que havia muitas famílias nas quais reinava um modo de viver cristão, embora a sua religião fosse antes de tudo o ‘culto aos santos’. Esse sincretismo incorporou, sem dúvida, pedaços do Evangelho, mas isso aconteceu sem que houvesse uma organização eclesiástica com autonomia. Os sacerdotes dependiam dos senhores locais. A instituição da paróquia começou com a cristandade e foi um dos seus elementos básicos. A paróquia adquiriu autonomia em relação aos senhores-donos da terra.

Com a Reforma Gregoriana começou uma nova evangelização do povo. Definiu-se a separação entre o império e a Igreja, ou seja, entre os dois poderes. A concordata de Worms (1122) ratificou essa separação. Os dois poderes deviam viver em estreita colaboração, mas o poder espiritual era superior ao temporal, e este devia prestar-lhe todos os serviços requeridos para defender e promover a religião. Os Papas defenderam essa superioridade, o que gerou numerosos conflitos com os imperadores da Alemanha, com os reis da França e outros reis, sempre que os Papas queriam defender exigências que entravam em choque com a política. Veremos isso mais adiante.

Com essa independência da Igreja e essa promoção do Papa, começou um processo de institucionalização da Igreja, conduzido pelos Papas. Na raiz desse processo, foram fundadas Paróquias independentes dos senhores locais e dotadas de um património próprio: o benefício. O Papa fazia tudo o que estava ao seu alcance para tornar as dioceses independentes do imperador, o que ocorreu na Itália e em outras regiões, mas não na Alemanha. Nasceram as universidades criadas pelo Papa. Apareceram as ordens mendicantes, aprovadas e protegidas pelo Papa, que as tornou independentes dos bispos. Organizou-se o início de uma Cúria Romana ao mesmo tempo que aumentava a interferência do Papa nas dioceses e na marcha política da cristandade. Os Cardeais tiveram muita importância no crescimento do governo do Papa, tanto na Igreja romana quanto na Igreja universal.

Vamos evocar, de seguida, a institucionalização da Igreja ao nível da doutrina, do culto e do governo. Muitas das estruturas atuais procedem da cristandade, porque a Reforma Tridentina não quis mudar as estruturas, mas realizar uma reforma interior, para que as instituições medievais produzissem frutos. Será que a realidade no terreno das paróquias, das dioceses e dos patriarcados, hoje em dia, eliminou este modo de a Igreja Católica Romana se relacionar com o poder temporal? Será correcto dizer que o modelo de Cristandade desapareceu definitivamente?

(...)

Texto integral aqui


--------------------------------------------------------------------------------


"Alguém perguntou se era dia ou era noite..." (Saramago)

(Gostava muito que este 'post' fosse a minha modesta e envergonhada homenagem a António Carlos Figueiredo Reis (1933-2023), alguém que «sabia e, por isso, fez a hora;  não esperou acontecer».)

Porém, já nem era dia nem era noite... Era a Aurora da Glória!

(Paulo Bateira)