teologia para leigos

22 de agosto de 2023

Monoteísmo hebraico - diversidade e singularidade






DA DIVERSIDADE À SINGULARIDADE

Aspectos da história da investigação acerca do monoteísmo hebraico





As religiões são caminhos diferentes
convergindo para o mesmo ponto.
Que importância faz
se seguimos por caminhos diferentes,
desde que alcancemos o mesmo objetivo?

Mahatma Gandhi


"A maioria, sobretudo entre os exegetas católicos,
não comungava do fervor apologético de Werner Keller,
mas mantinha a «fé» nos relatos bíblicos
à hora de contar as peripécias do Israel Antigo.
Nas últimas décadas, o panorama alterou-se substancialmente.
Os relatos bíblicos continuam a desempenhar
um papel fundamental na reconstrução histórica,
mas a arqueologia adquiriu
uma muito almejada autonomia científica
e tornou-se, pouco a pouco, uma espécie de fiel da balança
quando se trata de avaliar a historicidade dos relatos
e de propor uma resposta
à pergunta sobre o que é possível saber com rigor historiográfico
sobre o passado do povo que escreveu a Bíblia."

Francisco Martins, «A Bíblia tinha mesmo razão?»,
Temas & Debates, 2023, p. 28





Para quem se põe a ler a Bíblia começando pelo início, isto é, pelo livro de Génesis, parece ser evidente que a fé num Deus único está na origem das tradições bíblicas mais remotas.

Leitura sincrónica e monoteísmo original

Em Génesis, no primeiro livro da Bíblia, afirma-se que Deus (em hebraico elohim], entendido como o Deus de Israel, ao criar os céus e a terra (Gn. 1,1), deu forma a tudo o que existe, criando os animais e também os seres humanos (Gn 1,26-28). No jardim do Éden, o Deus YHWH, entendido como o criador de todas as coisas, conversa com o primeiro casal, Adão e Eva, e desenvencilha-se de uma ameaça de concorrência preparada pela serpente (Gn 3). No capítulo 4 do livro de Génesis, afirma-se que, nas remotas origens da humanidade, um homem chamado Enos foi o primeiro a invocar Deus pelo seu nome sagrado, representado no Tetragrama (YHWH). Depois, Noé, o patriarca da nova criação, recebe instruções da mesma divindade e constrói a arca, cooperando com o único Deus na recriação do universo (Génesis 6-9). Após a saída da arca, os primeiros “sacrifícios” são dirigidos a esse mesmo Deus (Génesis 8,20). O facto de os patriarcas receberem revelações de divindades que recebem nomes distintos, segundo o nome do intermediário (Deus de Abraão, Deus de Isaque, etc.), não atrapalha a visão de que na origem havia somente um Deus. Afinal, era a mesma divindade que se estaria a revelar ou a ser percebida e comunicada com nomes distintos.

Assim, as páginas iniciais da Bíblia, lidas em perspectiva sincrónica[1], procuram projetar a ideia de que na origem havia a fé num Deus superior, criador dos céus, da terra e de tudo o que nela existe, sendo, neste sentido, um Deus único. Numa perspectiva de uma “Leitura Sincrónica da Bíblia”, isto é, lendo-se os conteúdos do modo como se apresentam na estruturação canónica dos textos, deduz-se, pois, a ideia de um monoteísmo original. Na mesma perspectiva, este monoteísmo das origens parece ter sido deturpado por meio de várias formas de adoração a outras divindades no decorrer dos séculos da história do povo hebreu. No mesmo viés, a luta dos profetas contra a “idolatria” e o “afastamento” de Deus, fruto da adoração de outras divindades, como foi o caso de Neustan[2] (2 Reis 18,1-4), de Achera (2 Reis 22-23), de Baal (1 Reis 19,1) ou da Rainha dos Céus[3] (Jeremias 44, 15-30), etc., seriam exemplos de um processo de degenerescência do monoteísmo puro das origens. E as reformas religiosas empreendidas por alguns reis são normalmente interpretadas como reacção a denúncias proféticas de “idolatria” e “prostituição”, com as quais esses reis procurariam resguardar essa fé monoteísta original perante os desvios religiosos feitos pelo povo ou pelos seus dirigentes[4].

Esta visão sincrónica, bíblica ou “biblicista” foi valorizada pela História da pesquisa mais antiga, por pensadores importantes que buscavam coadunar os dados bíblicos com reflexões gerais sobre história da religião na Antiguidade. Podemos destacar algumas opiniões[5]:

‒ No século XVI, o filósofo deísta inglês Herbert von Cherbury (1582-1646) afirmava poder encontrar, por trás da fachada das religiões politeístas, a revelação de um único Deus. Dentro das próprias religiões seriam os sacerdotes os responsáveis pela degenerescência da revelação original.

‒ No século XVIII, o francês Joseph-François Lafiteau (1681-1740), cientista da religião, afirmava encontrar em todas as religiões da Antiguidade a revelação do “ser supremo”, o que, segundo ele, apontava para a existência de um “monoteísmo original”.

‒ Também no século XVIII, o filósofo Voltaire, no seu «Dictionnaire Philosophique», afirmava que primeiramente se teria conhecido somente um único Deus e que a fraqueza humana teria posteriormente assumido a existência de mais deuses e diferentes deuses[6].

No século XX, o historiador católico-verbita alemão Wilhlem Schmidt (1868-1954) afirmava, na sua obra “Ursprung der Gottesidee” [«Origem da ideia de Deus»], uma «teoria da decadência religiosa». Segundo ele, o monoteísmo original ligado à ideia do Deus supremo estaria na origem de todas as religiões[7].

Tais opiniões dos investigadores fizeram escola influenciando muitos investigadores e, de certa forma, moldaram o modo de conceber este processo de formação do ideário monoteísta, especialmente no que diz respeito à origem do monoteísmo e ao seu desenvolvimento. Vários investigadores do Antigo Testamento filiaram-se nessa tese do monoteísmo original[8]. Na segunda metade do século XX, porém, uma intensa discussão no campo das ciências da religião, da teologia, da história das religiões e da filosofia trouxe profundas transformações nos conceitos e nas concepções acerca do postulado de um monoteísmo originário (desde as origens).

Novos questionamentos

No campo da investigação bíblica, essa discussão está relacionada com todo um processo de revisão de opiniões “clássicas” acerca do perfil diacrónico[9] dos textos da Bíblia hebraica e das concepções relacionadas com a sociedade do Antigo Israel nos seus vários momentos históricos. Em foco estavam especialmente hipóteses sobre os inícios de Israel na fase da chamada “conquista da terra” e do “tribalismo” do período anterior à constituição de um Estado na história dos hebreus, mas também as teses tradicionais sobre o processo de surgimento dos próprios textos passaram por uma ampla revisão. Assim, por exemplo, a chamada “hipótese documental” ou “teoria das fontes”[10], que por mais de cem anos serviu como explicação “científica” para o surgimento do Pentateuco entrou em descrédito, sendo substituída por novas teorias explicativas. Com esses questionamentos da tradicional explicação académica acerca do surgimento dos textos, especialmente do Pentateuco, também a usual datação de determinados textos passou por consideráveis transformações[11]. Assim, por exemplo, textos que eram atribuídos à fonte “J” [Yhavista], tradicionalmente datada no século IX, na época do chamado “iluminismo salomónico”, passaram a ser alocados ao período do pós-exílio (séculos VI-V a.C.). O próprio período pós-exílico, que antes era visto como o momento de decadência da época de ouro das revelações originárias de Israel, passou a ser visto como o momento histórico decisivo para a formatação dos materiais literários da Bíblia Hebraica.

A revisão dos aspectos da história de Israel atinge também a história da religião do antigo Israel e, por tabela, a concepção do desenvolvimento do monoteísmo nas religiões da humanidade. Esta revisão iniciou-se com a recolocação da pergunta fundamental para as tradições próprias do povo hebreu: qual é a idade do monoteísmo no antigo Israel? Esta pergunta fundamental pode ser desdobrada em algumas questões correlacionadas:

Historicamente, quando teve início o processo maciço de adoração de YHWH como Deus único?

Em que momento da história do povo hebreu se consolidou o monoteísmo como sistema religioso dominante?

Como coadunar politeísmo, monolatria e monoteísmo na história do povo hebreu e na religião deste povo?

Muitos pesquisadores da Bíblia há que muito tempo que estavam inclinados a aceitar tacitamente a teoria do monoteísmo original e a sua posterior degenerescência em religiosidade politeísta. De certa forma, isso estaria relacionado com os próprios documentos bíblicos, que remontariam aos inícios da história da humanidade. No fundo, o que estava em jogo era a manutenção da própria credibilidade dos textos bíblicos quanto à sua apresentação “histórica” dos fatos.

Que aconteceria se as coisas tivessem tido um desenrolar contrário? Isto é, se a trajetória da fé monoteísta tivesse tido um desenvolvimento a partir de formas plurais politeístas rumo à afirmação de uma jornada singular, no caso, o monoteísmo, passando por formas intermediárias como a monolatria?

Esta foi a tónica da reviravolta na pesquisa sobre o tema em questão. A tendência da pesquisa, nas últimas décadas do século XX, tinha, pois, o propósito de tomar como hipótese de pesquisa o inverso da concepção tradicional e demonstrar o desenvolvimento (ou evolução) do Credo e da religião de Israel a partir da diversidade politeísta rumo à singularidade monoteísta. Em coerência com o deslocamento do ênfase na própria história de Israel e com a tendência da datação tardia dos textos, esta “singularidade monoteísta” passou a ser concebida como uma “forma tardia” no processo histórico de Israel[12].

Esta reviravolta na pesquisa tem antecedentes em alguns pensadores. Vale a pena revisitar ideias de alguns pensadores e posições na pesquisa mais antiga, cujas opiniões não receberam muita aceitação entre os pesquisadores bíblicos[13].

‒ Já no século XVIII, o inglês David Hume, na sua obra «Natural History of Religions» (1757), apontava para um desenvolvimento a partir da diversidade em direcção à singularidade.

‒ No século XIX, o historiador e pesquisador bíblico (judeu?) Abraham Kuenen (1828-1891) afirmava que o berço do monoteísmo estaria na época clássica dos profetas de Israel. Os profetas teriam sido os criadores daquilo que o autor denominou “monoteísmo ético”. Ele afirmava: “O que é que os profetas realizaram? Qual o resultado de sua atuação? E como devemos valorizá-los? A sua criação (a dos profetas) é o monoteísmo ético. Eles ascenderam à fé no único, santo e justo Deus, o qual realiza a sua vontade no mundo, isto é, o bem ético"[14].

‒ No início do século XX, o sociólogo alemão Max Weber apontava na mesma direcção, afirmando que os profetas de Israel são os “parteiros” da ética ocidental. Com isso, ele identificava igualmente o surgimento do monoteísmo na pregação dos profetas, especialmente naqueles séculos VIII e VII a.C.[15].

‒ O investigador francês V. Nikiprowetzky, na década de 1970, retomou a ideia do monoteísmo ético, afirmando que o seu surgimento estaria relacionado com o desenvolvimento de um nacionalismo nos inícios do antigo Israel. "Visto de forma religiosa, a pregação profética significa o chamamento para a luta contra os filisteus e para a fundamentação do Estado de Israel. Monolatria tornou-se o símbolo da obrigação em relação a Yahveh e à nação hebraica.[16]" Segundo o autor, um «nacionalismo profético» seria o berço do monoteísmo.

Não se pode deixar de observar nestes autores uma tendência em acolher, segundo uma reconstrução histórica, ideias provindas da teoria sociológica de Emile Durkheim e também da filosofia de Ludwig Feuerbach no sentido em que a divindade é expressão simbólica da sociedade. Esta “genealogia” deste ideário talvez seja um dos motivos pelos quais as suas opiniões não tiveram aceitação nas academias teológicas, recebendo antes reações e críticas. Ao invés de uma recepção positiva, que aconteceu somente em círculos mais restritos[17], nos trabalhos académicos dominantes foram reforçadas certas teses que se tornariam “clássicas”.

Reacções e teses clássicas

A proposta da datação do surgimento do monoteísmo ético no tempo dos profetas clássicos de Israel, ou seja, no período médio da monarquia israelita (séculos VIII a.C.), recebeu, na metade do século XX, um “revés”, na medida em que vários investigadores rechaçaram expressa ou tacitamente as datações propostas.

O grande exegeta alemão Gerhard von Rad, na sua «Teologia do Antigo Testamento[18]», especialmente na parte inicial desta obra, propôs situar o início do monoteísmo nos tempos primaveris do período pré-estatal do antigo Israel. Neste autor, as teses da «transumância» (formulada por Albrecht AIt) e da “Liga Anfictiónica Sacral” no Israel pré-estatal (como foi postulada sobretudo por Martin Noth) funcionaram como pressupostos de pesquisa. A partir do seu extenso levantamento de material, o autor afirma que, desde o período da formação de Israel, passando pelo período pré-estatal, a adoração a YHWH coexistiu ao lado de outras divindades e expressões religiosas. O autor, porém, trabalha com o postulado de um constante conflito e combate entre a fé em YHWH e a adoração a outras divindades no seio de Israel. “O combate começara com a chegada dos primeiros grupos javistas ao solo palestiniano, pois desde o início, a exigência da fé exclusiva em Javé recusava-se a tolerar a coexistência pacífica de diversos cultos. Não se pode pensar num culto a Javé sem o primeiro mandamento”[19].

Neste juízo quase apodítico, o famoso professor deixa transparecer o seu postulado teológico extraído das suas pesquisas do Antigo Testamento, mas também partilhado pela teologia dialética de Karl Barth. Nesta sua vasta obra, von Rad toma o Deuteronómio e a sua exigência da adoração exclusiva a YHWH como o centro teológico do Antigo Testamento. Para ele, a Teologia Deuteronómica ou deuteronomista é o coração teológico do Antigo Testamento. Lendo-se a história religiosa de Israel na perspectiva Deuteronómico-deuteronomista, conforme é expresso no Deuteronómio e na Obra Historiográfica Deuteronomista, dificilmente se pode chegar a outra avaliação, uma vez que, muito provavelmente, a visão e a versão deuteronomistas constituem o clímax de síntese de todo um processo de amalgamamento de tradições sociais e religiosas no antigo Israel[20]. É possível que a posição corajosa e obstinada da Igreja Confessante na Alemanha, que resistira ao fascínio nazi tenha influenciado este tipo de pressuposto beligerante em relação a todo tipo de culto “natural” ou “pagão” como era propagado pelo sistema nacional-socialista da época. Elementos norteadores no passado recente da história europeia e alemã parecem ter sido tomados como balizas para a reconstrução da história da religião hebraica.

Outro pesquisador alemão, o católico Victor Maag (1910-2002), fez a proposta de recuar ainda mais no tempo e situar o início do monoteísmo nos tempos e na vivência de Israel no deserto. O autor aproveita estudos sobre a religiosidade (monoteísta) de grupos seminómades no atual Irão e propõe encontrar em ambiente desértico, no qual tenham peregrinado os patriarcas de Israel, o início da fé monoteísta, sendo esta, portanto, uma “fé pura”. O Deus adorado de forma monolátrica teria conduzido os patriarcas durante as suas andanças rumo à terra prometida[21].

Ainda outro pesquisador, Ulf Oldenburg, propôs retroceder ainda mais o surgimento do monoteísmo, situando-o nos inícios junto a grupos cananeus, que no III milénio a.C. já teriam adorado o Deus “El” como o ‘Deus único’. Com a migração de grupos árabes e amorreus da região mesopotâmica, “El” teria sido suprimido a favor de um panteão amorrita, no qual Baal teria sido a divindade mais dinâmica. A fé em “EI” como deus único teria sido absorvida e preservada em Israel por meio da transferência dos atributos de “El” para o deus nacional “YHWH”. Este autor trabalha nitidamente com o pressuposto de um ‘monoteísmo das origens’ com data muita antiga (o que hoje em dia é considerado pelos investigadores como ultrapassado), mas que inclui a noção de ‘aproximações sincréticas’ na constituição do imaginário religioso.






Uma perspectiva distinta, que fez escola na década de 1980, e teve fortes influências na pesquisa bíblica latino-americana, é a do norte-americano Norman K. Gottwald na sua obra «As tribos de Iahweh», publicada em inglês em 1979 e em português em 1986[22]. O autor propõe situar o início do monoteísmo no período pré-estatal do antigo Israel, isto é, no período do tribalismo (1250-1050 a.C.). Gottwald fala mais de “monojavismo”, expressando com isso, em termos de conteúdo, algo similar a monoteísmo. O “monojavismo” seria uma inovação social neste período da existência pré-estatal de Israel, no sentido de ser expressão de uma sociedade sem classes em contraposição à sociedade cananeia organizada hierarquicamente em classes dentro do sistema das cidades-estado. Em termos teóricos, o autor propõe uma relação interdependente entre o monojavismo e o igualitarismo sociopolítico postulado para este período. Algumas citações da sua obra podem ajudar a expressar com rigor sua posição:

«(…) o monojavismo relaciona-se de maneira segura com o igualitarismo sociopolítico, mas também [...], da mesma maneira, o igualitarismo sociopolítico relaciona-se de maneira segura com o monojavismo. [...] A elevação e a manutenção de um sistema social igualitário israelita viável, junto com as suas feições estruturais do direito de propriedade por parte das famílias extensivas, dos meios de produção, com as medidas de socorro mútuo para manter as famílias extensivas numa paridade aproximada na produção e no consumo, como também a dispersão do poder social, militar, político e religioso por entre as subunidades estruturais, relaciona-se de maneira segura com a projeção conceitual-institucional inovadora de Yahweh como o único Deus de Israel, que motiva e sanciona o desejado sistema de relações sociais por meio de um culto com controle mínimo do poder político e com consumo mínimo da riqueza comunal»[23].

A conclusão principal do autor vai na direcção de afirmar que, assim como YHWH proíbe outros deuses, Israel como sistema social igualitário proíbe outros sistemas sociais dentro da estrutura tribal. O monojavismo pré-estatal seria uma espécie de experimento socio-religioso, portanto, um “produto” deste período do Israel tribal. Na sua perspectiva, o monoteísmo, enquanto sistema de crenças religiosas, teria visto irromper o seu nascimento nos tempos do “tribalismo igualitário” da época pré-estatal de Israel[24].

Em direcção similar argumenta o alemão Rainer Albertz na sua extensa obra «Rellgionsgeschichte Israels in alttestamentlicher Zeit» (“História da Religião de Israel no período do Antigo Testamento” em 2 Volumes na Editorial Trotta], de 1992[25]. Albertz não trabalha com o pressuposto de um monojavismo exclusivo, como foi afirmado por Gottwald, mas com um processo de sincretismo entre o Deus “El” e o Deus YHWH. “El” seria uma divindade já reverenciada entre grupos cananeus no período anterior à ‘fixação territorial’ dos hebreus foragidos do Egito (fase de conquista, ocupação e apropriação particular de uma “terra exclusiva”). Segundo o autor, esta divindade figura inclusive como elemento teofórico na constituição do nome “Isra_el" que literalmente significaria “El_semeia”. A adoração a “El”, por parte de grupos cananeus já estabelecidos nas montanhas, em busca de formas sociais alternativas à exploração nas cidades-estado cananeias, teria servido como elemento catalisador de estructuras anti-hierárquicas[26].

Estudos sobre os inícios da fé em YHWH indicam que as representações desta divindade não seriam originárias de Canaã, mas proviriam da região desértica a caminho da actual Península do Sinai (Juízes 5; Habacuc 3; Deuteronómio 33). Muito provavelmente, este tipo de crença foi o elemento religioso trazido por grupos migrantes desertícolas e/ou foragidos do Egito, comumente chamados de “grupo mosaico”[27]. Com esta vinculação a grupos emigrados do Egipto, poderia pensar-se também em influência ou vinculação ao monoteísmo de “Ácton” no Egito, no século XIV a.C. Como uma divindade guerreira e desvinculada de um panteão, YHWH teria sido um elemento bem-vindo na estrutura social acéfala e segmentária já estabelecida nas regiões montanhosas de Canaã[28]. Albertz postula, assim, um processo de sincretismo religioso já na fase pré-estatal de Israel, portanto, nos séculos XII a X a.C., situando também nestes “tempos primaveris” a constituição do ideário monoteísta.

A proposta de Gottwald, acima esboçada, recebeu muita adesão na investigação académica das décadas de 1980 e 1990, especialmente na América Latina. A tese do monojavismo ou do monoteísmo nos tempos iniciais da história de Israel figura como postulado em muitos trabalhos de pesquisadores bíblicos latino-americanos como Jorge Pixley, Milton Schwantes, Carlos Mesters, Carlos Dreher e outros. Desde há anos que a teoria de Gottwald está sob revisão crítica, especialmente pela nova aproximação aos textos bíblicos segundo uma outra óptica histórica. Um certo positivismo histórico em relação ao uso dos textos bíblicos como fonte histórica directa para a datação dos tempos pré-estatais ‒como é o caso da obra de Gottwald ‒ está, hoje em dia, sob descrédito[29]. Especialmente os trabalhos do arqueólogo judeu Israel Finkelstein mostram que as montanhas de Canaã já eram habitadas ao longo do segundo milénio[30]. Isso influencia a perspectiva sobre o Israel e suas origens, colocando em descrédito a tese de Gottwald[31].

Elementos fundamentais da teoria continuam a ter sua plausibilidade histórica assegurada, como bem mostram as pesquisas expressas na obra de Rainer Albertz, mas a ideia de um monojavismo plenamente estruturado no período pré-estatal não goza mais de ampla aceitação[32], passando antes por críticas rumo a novas perspectivas.

Críticas e novas perspectivas

A proposta mais crítica sobre a origem e o desenvolvimento do monoteísmo no antigo Israel, e que, na pesquisa recente, tem recebido significativo endosso e confirmação, ainda que por vezes de modo tácito, é a do americano Morton Smith na sua obra «Palestinian Parties that Shaped the Old Testament» [Partidos palestinianos que moldaram o Antigo Testamento], publicada em 1971[33]. A perspectiva do autor é a de que, na história da religião de Israel, especialmente no período monárquico, não se trata de um restabelecimento de uma monolatria ou de um monoteísmo original do Israel das origens. Trata-se muito mais de uma forte, porém, intermitente influência de um grupo social ou “partido religioso” adepto e difusor da adoração exclusiva a YHWH, que, por circunstâncias sociais diversas, consegue dar voz às suas convicções. Este partido teria tido grande influência na redação e composição dos textos sagrados do povo de Israel ainda durante o período monárquico, mas especialmente no período do exílio e do pós-exílio. Este grupo ou partido religioso pode ser identificado, em traços largos, com o grupo que se convencionou chamar de “deuteronomistas”. Por meio de obras como a “Obra Histórica Deuteronomista” (‘OHD’: Deuteronómio + o período de Josué a Reis) ter-se-ia a visão deste grupo, que se tornou dominante especialmente na época da Reforma social e religiosa operada pelo Rei Josias, na segunda metade do século VII a.C..

Smith acredita num imaginário politeísta originário, difundido e compartilhado na região do antigo Oriente Próximo, passando por momentos de maior exigência monolátrica até chegar à consolidação do credo monoteísta judaico. Ele não acredita poder reconstruir as origens da monolatria, mas postula que os seus inícios possam estar relacionados com alguns elementos como, por exemplo, a concorrência entre sacerdotes e profetas de uma expressão religiosa e os “funcionários” de outra expressão, representando outra divindade. O autor postula também a possibilidade de eventuais oposições conservadoras de grupos nómadas e seminómadas, portadores e fomentadores da adoração exclusiva a IHWH, à cultura das cidades-estado em Israel, bem como eventuais concepções de diferenciação cultural dos grupos activos na conquista da terra em relação a grupos autóctones cananeus[34].

Para Smith, a monolatria javista começou a ganhar contornos mais concretos no século IX a.C. Estaria, então, vinculada com a atuação de profetas como Elias e Eliseu, no Reino do Norte. Emblemáticas seriam, neste caso, as narrativas proféticas, que, de forma pedagógica e catequética, procuram ressaltar os poderes de YHWH frente a outros deuses, em especial ao Deus Baal.

Em Judá, a exigência monolátrica estaria vinculada com as reformas dos reis Asa (911-870 a.C.) e Josafá (870-848 a.C.), mas também com as de Ezequias (em torno do ano 700 a.C.) e Josias (em torno do ano 625 a.C.). Vinculado com elas teria havido a supressão de práticas cultuais (indesejadas) no templo de Jerusalém (2 Reis 18). No Reino do Norte teriam acontecido conflitos diretos entre uma religião javista oficial “baalizada”, sustentada pela estrutura do estado monárquico, e grupos minoritários adeptos da ideia de uma adoração exclusiva a YHWH. Não se trataria tanto de uma “guerra religiosa”, mas muito mais de conflitos de poder político e religioso entre grupos diferentes dentro do próprio Israel. Enquanto governantes como Acab e Jezabel, no Reino do Norte, no século IX, perseguiam adeptos do movimento de adoração exclusiva a YHWH (1 Rs 18), o posterior rei Jeú deu total apoio a eles, inclusive promovendo sangrentas lutas contra os grupos adeptos de Baal (2 Reis 10). Outros momentos fortes dentro deste processo de desenvolvimento da monolatria rumo a um monoteísmo excludente seriam constituídos pela pregação de exigência monolátrica de Oseias, pela reforma de Ezequias (2 Reis 18) e especialmente pela reforma de Josias (2 Reis 22-23). Nesta última, haveria confluência de vários interesses: sacerdotes sadocitas interessados no monopólio cultual, comerciantes interessados nos lucros com as peregrinações a Jerusalém e grupos monojavistas interessados em suprimir divindades e ritos de fertilidade[35].

Esta “nova imagem” das origens e da idade da monolatria e do monoteísmo no antigo Israel a partir do século IX a.C. tem tido grande repercussão e aceitação entre os cientistas, marcando os parâmetros da investigação académica das últimas três décadas sobre o tema. Há alguns destaques a fazer.

O estudo sobre “O movimento somente-Yahveh” do pesquisador católico alemão Bernhard Lang procurou aprofundar o trilho aberto por Morton Smith. Outro estudioso da questão é o próprio alemão Rainer Albertz, já mencionado acima, que na sua monumental «História da religião de Israel no período do Antigo Testamento», de 1992, igualmente sublinha o século IX como o contexto histórico em que se cristalizou a ideia da adoração exclusiva a YHWH. O pano de fundo seria constituído pelos conflitos em torno do sincretismo oficial promovido pelo estado israelita neste período[36].

Seguindo nesta mesma linha, o pesquisador alemão Frank Crüsemann, na sua obra «Elia - die Entdeckung der Einheit Gottes» [Elias ‒ a descoberta da unidade de Deus][37], promoveu uma releitura do ciclo de Elias (1 Reis 17 - 2 Reis 2) no intuito de destacar como estas narrativas bíblicas envolvendo o personagem profético Elias comportam e transmitem a ideia da descoberta da unidade de Deus. Essa pesquisa teve uma amostragem em língua portuguesa por meio do artigo «Elias e o Surgimento do Monoteísmo no Antigo Israel», publicado em 2001, no qual o autor afirma expressamente que:

“o que a Bíblia chama e apresenta como Deus não pode ser concebido sem Elias. Este profeta está ligado de uma forma única com o próprio Deus. As histórias que em Israel se contavam sobre ele constituem por assim dizer um curso básico sobre a pergunta; ‒ quem é Yahveh, o Deus de Israel? Quem é o nosso Deus?[38]

A investigação sobre o tema do monoteísmo desencadeou também uma série de seminários de estudo e publicações a partir de 1980. Aqui se inscrevem especialmente os esforços do pesquisador católico suíço Othmar Keel, que, em 1980, coordenou uma importante publicação com o título «Monotheismus im Alten Israel und seiner Umwelt» [Monoteísmo no antigo Israel e nos povos vizinhos]. A partir desta obra, a procura pelas raízes do monoteísmo deixou de ser marcada somente por uma perspectiva intrasistémica, isto é, relacionada somente com Israel, passando a ser vista no conjunto dos povos do antigo Oriente Próximo, dentro de uma perspectiva interdisciplinar, reunindo contribuições de teólogos, arqueólogos, cientistas da religião e historiadores da religião. Esse tipo de abordagem e seus adeptos passaram a ser rotulados pelo nome de “escola de Friburgo”[39].

Essa discussão foi sensivelmente aprofundada no XIII Colóquio da Academia Suíça de Ciências Sociais e Humanas, realizado em 1993, sob o tema “Yahveh entre as Deusas e os Deuses do antigo Oriente”. Este simpósio resultou na imponente obra de coletânea de conferências organizada e publicada um ano depois por Walter Dietrich e Martin Klopfenstein: «Ern Gott allein? JHWH-Verehrung und biblischer Monotheismus im Kontext der israelitischen und altorientalischen Religiongeschichte [«Um Deus único? A adoração a YHWH e o monoteísmo bíblico no contexto da história da religião de Israel e do antigo Oriente»][40]. Nesta obra, diversos estudiosos europeus, norte-americanos e israelitas expressaram os seus pontos de vista sobre a questão ou sobre aspectos da questão. A tónica das pesquisas e dos trabalhos é a indicação clara para a existência de um politeísmo original compartilhado com os povos vizinhos do antigo Israel e um gradual desenvolvimento rumo ao monoteísmo no decorrer da história do povo hebreu. Sobre os textos e discursos acerca de YHWH, a citação de um deles sintetiza suficientemente bem o longo processo de pesquisa e discussão:

“A princípio, YHWH era provavelmente um deus da montanha, na região desértica do sul da Palestina, evoluindo para a função de deus pessoal de famílias israelitas; evoluiu depois para o posto de deus nacional de Israel; e depois para a função de deus da fertilidade da terra cultivável; depois para o deus dos céus provedor de direito e salvação; depois para o rei dos deuses; depois para criador do cosmos e dirigente da história; depois para o senhorio sobre a morte e, por fim, para a função de juiz universal.[41]

Em todo este processo, deve-se estar sempre atento para o facto de que a história de Israel e também a história da sua religião se desenvolver sempre dentro do seu contexto histórico, político e social mais abrangente.

Até aqui procuramos destacar alguns “pontos altos” da investigação acerca o monoteísmo hebraico no último século. Foram ressaltadas somente algumas tendências sem entrar em maiores detalhes[42]. De seguida, procurando sintetizar resultados da pesquisa mais recente, quero referir de forma esquemática fases ou momentos históricos importantes do processo de desenvolvimento do monoteísmo.


Fases do desenvolvimento do Monoteísmo

A apresentação a seguir é bastante sintética, pressupondo vários resultados que mereceriam maior desdobramento. Vamos indicar cada fase da constituição do ideário monolátrico e monoteísta enquanto representação realizada por sujeitos históricos actuantes naquele contexto e substanciada em textos e em restos arquitectónicos e artefactos trazidos à luz do dia pela arqueologia ainda acessíveis. Apontaremos também para momentos de sincretismo com representações de outras divindades, bem como para a superação de elementos indesejados.


Primeira fase: sincretismo pacífico entre “El” e YHWH

Nos tempos iniciais da história do Israel das origens, surgido no seio de uma diversidade de grupos étnicos de Canaã, com aportes de grupos seminómades provenientes de ondas migratórias, deve-se trabalhar a hipótese de sincretismo inclusivo e com a harmonização entre “EI” e YHWH. No panteão cananeu, “El” é celebrado como o deus criador da terra, como criador e pai de outros deuses. Em Génesis 14,19 ainda se pode perceber essa memória: «"El”, o Altíssimo que criou os céus e a Terra! Bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos nas tuas mãos!». Em Génesis 2,7 [«então o SENHOR Deus (= Elohim/YHWH) formou o homem do pó da terra»] também transparece essa função criadora de “El”. A menção de YHWH neste contexto pode estar a remeter para uma leitura feita a partir da tradição javista posterior. O nome genérico ‘Elohim’ é utilizado várias vezes como referência a YHWH.

Essa forma sincretizada entre “EI” e YHWH provavelmente foi assumida por grupos que constituem o Israel das origens, sendo, posteriormente transposta, assumida e difundida nos inícios do período monárquico nos tempos de David e Salomão. Outros elementos da representação religiosa cananeia ou jebuseia (tradições locais relacionadas com a conquista de Jerusalém por David) são colados à representação de YHWH, como, por exemplo, a ideia do deus-rei, exposta muitas vezes nos Salmos. A adoração de outras divindades parece não haver constituído problema “teológico” nos tempos iniciais da monarquia israelita.


Segunda fase: conflitos com Baal

No século IX a.C., desenvolve-se em Israel uma série de conflitos em relação à divindade “Baal”. No mundo religioso cananeu-israelita deste período, o Deus Baal, filho de “El”, assumiu a primazia no panteão divino, como é expresso no poema "Baal, o Senhor da Terra vive", encontrado em Ugarit. Baal é o Deus do raio, responsável pela chuva e, assim, pela fertilidade do solo e também dos ventres.

Para o século IX, postula-se, em geral, uma política oficial de “baalização” do culto Javista sob o governo de Acab e Jezabel (874-853 a.C.). Tratar-se-ia de um "sincretismo oficial"[43]. Em termos de razões de Estado, há uma política de expansão e comércio internacional, que parece ser fomentada por meio de maior incremento do deus da fertilidade, Baal. A historiografia deuteronomista situa nesta fase as críticas de Elias e Eliseu contra tal política e especialmente a disputa no monte Carmelo (1 Reis 18), com a qual se quer mostrar, a partir da perspectiva deuteronomista, a superioridade do Deus YHWH[44]. O próprio nome de Elias parece ser um programa religioso: “o meu Deus [“EI”] é YHWH (1 Reis 19,10.14).

A historiografia deuteronomista também situa neste período a acção de Jorão (2 Reis 9,15; 852-841 a.c.), que retira a estátua de Baal do templo de YHWH em Samaria, bem como a posterior acção militar de Jeú (841-813 a.c.), que, sob a “animação profética” e ideológica do “programa” de Elias e Eliseu, manda destruir o templo de Baal e promove uma matança dos sacerdotes de Baal (2 Reis 9-10). Segundo Crüsemann, era aqui que deveria ser localizada a hora do nascimento do monoteísmo bíblico. Teríamos aí o monoteísmo em fase de nascença, isto é, em seu momento inicial enquanto exigência monolátrica.


Terceira fase: ênfase maior na adoração exclusiva a YHWH

Há uma tendência na pesquisa para se afirmar que, com o profeta Oseias, há maior ênfase na constituição de ideias monolátricas e monoteístas no antigo Israel. A atuação deste profeta é situada no século VIII a.c., entre os anos de 736 e 722, no Reino do Norte. Nos textos atribuídos a Oseias, está expressa a denúncia da “idolatria” e da “prostituição”, de Israel (Oseias 2,4-15), o que seria o equivalente à adoração de outras divindades que não YHWH[45]. Em geral, nos textos, a polémica está dirigida contra os “baalins”, isto é, formas e representações concretas do deus Baal, entendido como responsável pelo raio e, com isso, também pela fertilidade da terra e do ventre.

A julgar pelas palavras polémicas do profeta, o problema principal no período em questão está em que os dízimos e as ofertas na “eira”, isto é, nos momentos altos da colheita agrícola, são destinados pelos israelitas não para YHWH, mas para Baal, considerado em todo o mundo cananeu como o responsável pela fertilidade. Vistos no seu conjunto, os textos do livro de Oseias estabelecem a exigência da adoração somente a YHWH. Assim, para quem se expressa nestes textos, seria inconcebível não ver em YHWH o garante e o doador da produção agrícola e bem-estar na terra (Oseias 2,7)[46].

Nesta terceira fase, também pode ser alocada a chamada “reforma de Ezequias”, mencionada em 2 Reis 18,4. Sem entrar no mérito da discussão se ela é histórica ou não, entre as acções realizadas por Ezequias menciona-se que ele removeu os "altos" (hebraico: “bamot”), quebrou as colunas (hebraico: “massebah”) e fez em pedaços a serpente de bronze, chamada Neustan (“nehushtan”), a qual até àquele momento estava no templo de Jerusalém para adoração pública. Pode-se afirmar, pois, que o "culto a Nehushtan está incorporado ao culto de Yahveh no templo” em Jerusalém[47].

O culto à serpente de bronze, a qual tem até um mito fundador ou uma etiologia registrada em Números 21,4-9, até este momento histórico, isto é, final do século VIII, não deve ter sido considerado como empecilho para o culto javista no templo em Jerusalém. Pelo contrário, pode-se afirmar, com O. L. RIBEIRO, que «2 Reis 18,4 regista o momento em que, sendo considerado empecilho à exclusividade do culto monárquico javista e à necessidade de centralização desse culto por razões estratégicas de Estado, o culto à serpente de bronze é posto em antagonismo ao javismo»[48].

Na investigação mais recente, há uma tendência para relacionar o “Código de Aliança” (Ex 20,22-23,29) com a Reforma de Ezequias no final do século VIII a.C., no sentido de atribuir ao Código o carácter de “fundamentação legal”[49] da reforma. Este código de leis reúne material legal com perfil diacrónico diferenciado, remontando partes de texto até ao tempo do tribalismo e derivando outras partes de decisões de jurisprudência de um tribunal de Jerusalém[50]. As análises do conteúdo de várias das leis deste código apontam claramente no sentido de que aspectos da crítica social dos profetas do século VIII, especialmente de Amós, Isaías e Miqueias, tiveram eco e acolhimento em leis específicas[51]. Se a vinculação do código com a actuação de Ezequias tiver base histórica, deve-se lembrar que aquele momento histórico corresponde à iminência da conquista de Judá pelos Assírios e ao eventual desmantelamento do Reino de Judá, a exemplo do que aconteceu no Reino do Norte, em 722 a.C.. Pode-se também pensar que seja a proposta de reorganização do país após o término da opressão dos assírios, sendo entendido como um conjunto de leis para o Judá sobrevivente do cerco estrangeiro.

A análise da organização estrutural do texto do código indica também que, além de serem respostas às graves denúncias proféticas, o código também incorpora a exigência monolátrica como o centro da estrutura concêntrica do texto em questão. É sintomático que este código de leis apresente o seu centro teológico no culto exclusivo a YHWH, em detrimento de qualquer outra divindade. Em Êxodo 22,19, admitido como ‘o centro’, afirma-se: «Quem sacrifica aos deuses será votado ao anátema, excepto se sacrifica ao SENHOR e só a Ele.» Transformando-se essa proibição em linguagem positiva, resta a afirmação da exigência monolátrica do culto a YHWH.

Numa linha teológica similar, aponta o “primeiro mandamento” do ‘Decálogo Ético’ em Êxodo 20,2-1.7 e em Deuteronómio 5,1-21. A respeito do Decálogo, o exegeta alemão Crüsemann afirma: "O Decálogo pertence à “época pré-exílica tardia”. Ele é um produto da época entre Oseias e o Deuteronómio; historicamente falando: fica entre a destruição do Reino do Norte e Josias"[52].

Com isso, há uma série de evidências de que a ênfase no “primeiro mandamento”, isto é, na adoração exclusiva a YHWH é uma ênfase religiosa a partir do século VIII a.C. Pode-se, pois, dizer que o século VIII é o momento histórico do acirramento da exigência monolátrica do culto exclusivo a YHWH. Já não se trata apenas de polémicas entre grupos proféticos e sacerdotais distintos: a monolatria adquire contornos de “razão de Estado”.


Quarta fase: reforma de Josias e o monoteísmo nacionalista

Após a reforma de Ezequias, houve em Judá o governo do rei Manassés (687 a 642 a.C.), um período sob forte dominação assíria. Neste período, ao que tudo indica, houve reintrodução de práticas religiosas interditadas pela reforma de Ezequias, de forma que o processo de monoteização deve ter sofrido um retrocesso.

O avanço decisivo parece estar relacionado com a reforma de Josias. A julgar pelas informações contidas no relato de 2 Reis 22 e 23, houve nesta reforma um conjunto de medidas que visavam fortalecer a adoração exclusiva a YHWH, e esta, por sua vez, exclusivamente em Jerusalém, com a centralização do culto no templo principal. Do santuário central de Jerusalém, teriam sido retirados utensílios e artefactos cúlticos utilizados para o culto a Baal, a Asherah e ao Exército do céu; sacerdotes dos "altos" foram depostos, a estaca sagrada (hebraico: asherah) foi destruída, cabanas nas quais mulheres teciam véus para Asherah, foram demolidas, etc.[53] Também os santuários do interior foram desautorizados e desmantelados. Houve, assim, claramente uma concentração do culto a YHWH em Jerusalém. A exigência da adoração exclusiva a YHWH passa ainda mais fortemente a ser implementada com a força do aparato estatal, considerando-se que o santuário central, assim como os santuários em geral, estavam inseridos na estrutura do estado monárquico.

A participação importante do Estado na consolidação da monolatria javista também tem a ver com o fato de que é o próprio Rei que a consolida. Há muito tempo que é reconhecido pela pesquisa que o “Código Deuteronómico” deve ter servido de base legal para a reforma de Josias, funcionando talvez até como uma espécie de "pequena constituição" de seu governo[54]. Neste código, há claramente uma concentração no "primeiro mandamento", isto é, na adoração exclusiva a YHWH. Provavelmente, o famoso «shema’ Israel» («Escuta, Israel») de Deuteronómio 6,4 expressa, a partir deste momento histórico, a consciência ou a projeção de que Yahveh é o Deus nacional de Israel, sendo, pois, indicativo de uma espécie de “consciência monoteísta nacional”. Com Josias, dá-se a efetivação de um monoteísmo nacionalista excludente.

Paralelamente à concentração na exigência da adoração exclusiva de YHWH, verifica-se no antigo Israel também um impulso anicónico cada vez mais acentuado[55]. Verifica-se, nos textos, uma crescente condenação das imagens. Se as formas religiosas mais antigas toleravam sem problemas as imagens de Deus, a partir dos séculos VIII e VII a.C., há uma tendência para suprimir qualquer tipo de imagem de divindades e, sobretudo, do próprio Deus, YHWH. A proibição de imagens divinas está presente de maneira muito especial no Livro de Deuteronómio, cujo núcleo está datado da segunda metade do século VII a.C., chegando aí inclusive ao ápice da negação de qualquer imagem visual na história da revelação de YHWH a Israel: “(...) não vistes qualquer imagem/forma no dia em que falou YHWH no Horeb de dentro do fogo; não fareis para vós imagem de escultura sob a forma de ídolo, masculina ou feminina” (Deuteronómio 4, 15-16).

Na análise desta quarta fase da história do monoteísmo no antigo Israel, devemos estar atentos a duas questões importantes:

a) a existência de liderança feminina e a diversidade religiosa neste período, especialmente a adoração a Asherah como consorte de YHWH. Expressões proibidas ou interditadas supõem fiéis praticantes na base da sociedade;

b) a pergunta até que ponto a reforma de Josias foi capaz de suprimir tais religiosidades nas camadas populares em Judá e nas regiões periféricas ao norte e no sul (deserto). A descoberta de um templo javista na região desértica ao sul, em Kuntillet Ajrud, datado do século VII a.C., com inscrição relativa a “Yahveh e sua Asherah” parece colocar limites à Reforma. Algo semelhante se pode perceber em Hirbet el Qom, Tell Miqneh e em Elefantina, no Egipto[56]. Há, pois, claros limites inclusivamente territoriais para a reforma e, juntamente com isso, as reinvenções e recriações próprias que os sujeitos religiosos, isto é, as pessoas simples, faziam neste momento da história da religião[57].


Quinta fase: monoteísmo absoluto ou clássico

A quinta fase, e talvez a mais marcante, está fortemente relacionada com o período e a experiência do Exílio. Aqui, o «monoteísmo já está afirmado em sentido absoluto – Javé é o único existente»[58].

A convicção monoteísta é colocada na boca do profeta Dêutero-Isaías [2º Isaías], cuja actuação em geral é situada junto aos exilados na Babilónia. Aí se lê: “Eu sou YHWH e fora de mim não existe outro Deus” (Isaías 45,5)[59]. Diante da supremacia da religiosidade babilónica fiel a Marduk, afirma-se, no contexto do Exílio e com ecos posteriores, o poder criacionista de YHWH sobre "todo o universo". Este é também o momento histórico das formulações incisivas de YHWH como Deus criador, conforme atestadas no mito cosmogónico de Génesis 1[60]. O exílio babilónico é, provavelmente, o caldeirão histórico-cultural em que os mitos cosmogónicos de origem babilónica são re-significados e adaptados para uso próprio em Judá[61].

O monoteísmo absoluto, excludente ou clássico afirmou-se em Israel de modo mais contundente no período do pós-exílio, com o retorno de parcelas da antiga elite sacerdotal exilada na Babilónia, designada a “golah”. O pós-exílio é o tempo em que, no antigo Israel, acontecem as formulações decisivas das tradições e dos textos referenciais e sagrados da história religiosa do povo hebreu. É neste período que deve ser localizada a formatação decisiva do Pentateuco ou da Torá. As projeções dominantes neste período tornam-se marcantes para todos os outros períodos posteriores.

Neste período, há algumas tendências importantes a ressaltar:

a) a afirmação do domínio exclusivo de YHWH, manejado pelo sacerdócio masculino no segundo templo em Jerusalém;

b) a supressão de referências a outras divindades, sobretudo femininas, na literatura produzida e moldada neste período[62]. Em vários textos deste período, verifica-se uma tendência para apagar a memória (“erasio memoriæ”) da representação de outras divindades, especialmente da Deusa Asherah;

c) junto com a supressão das representações de outras divindades, verifica-se um processo de demonização ou diabolização de outras experiências e expressões religiosas combatidas pela tendência oficial. O caso mais típico é a interpretação da serpente em Génesis 3. O símbolo “serpente” em si é polissémico, podendo remeter para uma diversidade de experiências e sentidos. No entanto, no relato mítico de Génesis 3 a serpente é colocada na “isotopia do negativo”, passando a ser interpretada como a matriz e o amálgama de todas as expressões religiosas entendidas como concorrentes e alternativas ao culto a YHWH[63]. Ao nível histórico da produção do relato, há que ver a atuação de grupos sacerdotais, vinculados ao santuário central, isto é, o chamado “segundo templo”, que, por meio de narrativas míticas, dão forma de maneira decisiva ao imaginário religioso com prerrogativas somente para YHWH e para o universo masculino.


Síntese e resistências

A afirmação do monoteísmo javista absoluto ou clássico no antigo Israel nos séculos VI e V a.C. tem atrás de si um longo processo. Momentos de inclusividade sincrética e momentos de exclusividade monoteísta alternam-se neste processo. A partir das práticas dos sujeitos religiosos em Israel, certas expressões foram ganhando força; em determinados momentos históricos, outras práticas e expressões foram sendo tabuladas em textos tornados oficiais ou normativos. O «shema Israel» (Deuteronómio 6,4) e a afirmação «Eu sou YHWH e fora de mim não há outro Deus» (Isaías 45,5) são sínteses textuais de processos históricos e de fé; são o resultado que se tornou normativo para a redação e a formulação de tradições e textos normativos da religião oficial de Israel a partir do pós-exílio. A partir daí, há uma retroprojeção desta síntese para quase toda a literatura canónica da Bíblia Hebraica, especialmente a Torá, cuja formatação decisiva se deu neste período. O monoteísmo excludente ou clássico é a síntese oficial de um longo processo, cujas origens vão sendo afirmadas e enunciadas em construção contrastante com o politeísmo cananeu, do qual Israel sempre fez parte.

Tendo-se este monoteísmo absoluto ou clássico como resultado histórico de um processo, deve-se, porém, trabalhar com resistências durante todos os períodos, lembrando que a religião efetiva, ou a religiosidade no quotidiano, é uma questão de invenção criativa ou recriação constante a partir dos próprios sujeitos da fé.

Assim, por exemplo, nos momentos derradeiros posteriores à destruição de Jerusalém e na interpretação deste evento dramático, o povo de Judá invocava a Rainha dos Céus (Jeremias 44), dizendo que o abandono de sua veneração era a causa da catástrofe[64]. A isso se contrapõe a voz do profeta Jeremias, que representa a voz oficial, “deuteronomista”, dizendo que a desgraça da destruição foi consequência do abandono da adoração exclusiva a YHWH. Também o livro de Ester faz uma interessante releitura messiânica da deusa Ishtar, talvez até como contraponto ou complementação à religiosidade oficial javista.

A resistência mais significativa, também no sentido de recuperação de uma divindade feminina, aparece na figura da “hokmah” ou Sabedoria conforme é expresso em Provérbios 8,22-26[65].

A sabedoria é afirmada como figura feminina em Provérbios 1-9 («não desprezes os ensinamentos de tua mãe, pois serão uma coroa de adorno para a tua cabeça e um colar para o teu pescoço») e até se verifica um processo de hipostatização, isto é, a sabedoria, figura feminina, tabulada pela vertente oficial, é afirmada como a companheira de YHWH na obra da criação. «Não haverá ali um resto - ou uma recuperação? - da Deusa?», pergunta Croatto neste contexto[66]. Essa recuperação do feminino no divino terá consequências em épocas posteriores, por exemplo, com a incorporação de expressões cúlticas a deusas “pagãs”, no processo de expansão do cristianismo, amalgamados na figura de Maria.

Há muito para desvendar no emaranhado da formação da identidade cultural do povo do antigo Israel. Sem dívida, a construção do imaginário monoteísta foi motivo de significativos conflitos ao longo da história do povo, mas também foi elemento outorgador de identidade.

Durante todo este trabalho apenas apontei para alguns momentos constitutivos do processo de formação do ideário monoteísta, que necessitam ser muito mais elaborados em seus detalhes e nuances históricos. É importante, contudo, perceber que todo este processo deve ser entendido dentro das coordenadas de um longo desenvolvimento histórico e dentro da dinâmica de um sincretismo religioso, no qual atribuições e funções de determinada divindade são transferidas para outra no mesmo compasso em que, na base social, isto é, junto aos sujeitos religiosos, há um processo de amalgamação e inculturação das expressões e representações religiosas. Ao longo de todo este processo são criadas representações teológicas, nas quais o Deus YHWH passa a receber cada vez mais atributos, destacando-se o de Deus da justiça que luta ao lado dos empobrecidos.



Haroldo Reimer, «Da diversidade à singularidade, in “Inefável e sem forma – estudos sobre o monoteísmo hebraico”, Editora Universidade Católica de Goiás-OIKOS 2009, Brasil, pp. 21-52, ISBN 978-85-7843-093-1.



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[1] A “Perspectiva sincrónica” diz respeito à disposição e leitura do texto na sua superfície em que se procura entender a sua organização estrutural, sem aferir o perfil diacrónico dos textos, isto é, sem fazer a pergunta: “quando e em que determinado contexto surgiu um texto ou se esse texto é anterior ou posterior?”.

[2] «No terceiro ano do reinado de Oseias, filho de Elá, rei de Israel, começou a reinar Ezequias, filho de Acaz, rei de Judá. Tinha vinte e cinco anos quando subiu ao trono; reinou vinte e nove anos em Jerusalém. Sua mãe chamava-se Abi, filha de Zacarias. Fez o que é recto aos olhos do SENHOR, conforme o exemplo de David, seu pai. Destruiu os lugares altos, quebrou as estelas e cortou os símbolos de Achera. Despedaçou a serpente de bronze que Moisés tinha feito, porque, até então, os israelitas queimavam incenso diante dela. Chamavam-na Neustan. Ezequias pôs a sua esperança no SENHOR, Deus de Israel; não houve outro como ele, entre todos os reis de Judá que o precederam ou lhe sucederam. Conservou-se unido ao SENHOR, nunca se afastou do seu seguimento e observou todos os mandamentos que o SENHOR prescreveu a Moisés. Por isso, o SENHOR esteve com ele e Ezequias era bem-sucedido em todas as suas empresas. Sacudiu o jugo do rei da Assíria e livrou-se do seu domínio. Derrotou os filisteus até Gaza e devastou o seu território, desde as simples torres de vigia, até às cidades fortificadas. No quarto ano do reinado de Ezequias, correspondente ao sétimo do reinado de Oseias, filho de Elá, rei de Israel, Salmanasar, rei da Assíria, veio sitiar a Samaria. Ao fim de três anos apoderou-se dela. A Samaria foi tomada no sexto ano de Ezequias, correspondente ao nono do reinado de Oseias, rei de Israel. O rei da Assíria levou os filhos de Israel cativos para a Assíria, instalou-os em Hala, nas margens do Habor, rio de Gozan, e nas cidades da Média. Isto aconteceu, porque não deram ouvidos à voz do SENHOR, seu Deus; pelo contrário, quebraram a sua aliança, recusando-se a ouvir e a praticar o que ordenara Moisés, servo do SENHOR.» (2 Reis 18)

[3] Sacrifícios à rainha do céu - Então, todos os homens que sabiam que as suas mulheres ofereciam incenso a deuses estrangeiros, e todas as mulheres presentes em grande número e todo o povo residente em Patros, no Egipto, responderam a Jeremias: «Nós não escutamos o que nos dizes em nome do SENHOR, mas cumpriremos todas as promessas que fizemos de queimar incenso à rainha do céu e de lhe oferecer libações, tal como procedemos nós e os nossos antepassados, nossos reis e nossos chefes, nas cidades de Judá e nas ruas de Jerusalém. Então, tínhamos fartura de pão, vivíamos na abundância e não conhecíamos a desgraça. Porém, desde que deixámos de queimar incenso à rainha do céu, e de lhe oferecer libações, tudo nos falta e somos dizimados pela espada e pela fome. Quando queimávamos incenso à rainha do céu e lhe oferecíamos libações, foi, porventura, sem consentimento dos nossos maridos que fizemos as tortas com a sua imagem, e lhe fizemos libações?» Então, Jeremias falou a todo o povo, aos homens e às mulheres e a todos aqueles que lhe tinham dado esta resposta, dizendo: «Quanto ao incenso que queimastes nas cidades de Judá e nas ruas de Jerusalém, vós e vossos pais, vossos reis e chefes e todo o povo, pensais que o SENHOR não se recordava e não o tinha presente? O SENHOR já não podia suportar por mais tempo a maldade dos vossos actos e das vossas abominações; por isso, a vossa terra foi convertida em ruína, espanto e maldição, sem habitantes até ao dia de hoje. E se vos adveio a calamidade presente, foi porque oferecestes incenso, pecastes contra o SENHOR, não ouvistes a sua voz, não observastes as suas leis nem os seus preceitos.» Depois, Jeremias disse a todo o povo e a todas as mulheres: «Ouvi a palavra do SENHOR, vós todos de Judá que residis no Egipto. Assim fala o SENHOR do universo, Deus de Israel: Vós e as vossas mulheres não só o dizeis com a boca, mas executai-lo com as mãos, dizendo: “Temos de cumprir as promessas que fizemos de oferecer incenso e libações em honra da rainha do céu”. Pois bem! Cumpri os vossos votos, mantendo as vossas promessas. Por isso, ouvi a palavra do SENHOR, judeus que habitais no Egipto: Eis que juro pelo meu grande nome, diz o SENHOR, que de nenhum modo será mais invocado o meu nome, em todo o Egipto, por nenhum homem de Judá, dizendo: “Pelo Senhor, DEUS vivo”. Eis que vigiarei sobre eles para seu mal e não para seu bem. Todos os judeus que residem no Egipto morrerão pela espada e à fome, até ao seu total aniquilamento. Só um pequeno número escapará da espada, voltando do Egipto à terra de Judá. Então, os sobreviventes de Judá que vierem estabelecer-se no Egipto saberão qual é a palavra que se cumpre, se é a minha ou se é a deles. Eis o sinal pelo qual reconhecereis que vos pedirei contas neste lugar, para que saibais que verdadeiramente se cumprirão contra vós as minhas palavras de desgraça - oráculo do SENHOR. Assim fala o SENHOR: “Vou entregar o faraó Hofra, rei do Egipto, nas mãos dos seus inimigos, nas mãos dos que lhe querem tirar a vida, assim como entreguei Sedecias, rei de Judá, nas mãos de Nabucodonosor, rei da Babilónia, seu inimigo, que procurava tirar-lhe a vida.” (versão da Difusora Bíblica, Portugal)

[4] Referimo-nos às ‘Reformas’ empreendidas especialmente por três reis de Judá: Josafat (870-848 a.C.), Ezequias (716-687 a.C.) e Josias (640-609 a.C.). Cada uma destas reformas estaria acompanhada de conjuntos de leis e normas, como por exemplo, o Código da Aliança (Êxodo 20,22-23,19), o Decálogo Cúltico (Êxodo 34,12-26), o Decálogo Ético (Êxodo 20, 1-21; Deuteronómio 5) e o Código Deuteronómico (Deuteronómio 12-26).

[5] Valho-me aqui de pesquisas de Bernhard LANG, «Die Jahwe-allein-Bewegung», in LANG, B. (Ed.), “Der einzige Gott. Die Geburt des biblischen Monotheisnus”, Munique: Kosel Verlag, 1981, p.47-48, bem como a sua obra mais recente: «Jahwe, der biblische Gott: ein Porträt», Munique, Kosel Verlag, 2002.

[6] VOLTAIRE, «Dicionário filosófico», São Paulo, Martins Claret, 2002, ‘entrada’ sobre “religião”.

[7] É interessante notar que, para Schmidt, a cultura original do monoteísmo original estaria isenta de formulação mítica: «A concepção de um grande Deus único, no qual reside a essência da Religião, é fundamentalmente “amítica”: puro criador do céu e da terra, mas indiferente ao devir da humanidade, o Ser Supremo não se envolve nos acontecimentos nem nas motivações» (Marcel DETIENNE, «A Invenção da Mitologia», Brasília-UnB e Rio de Janeiro-José Olympio, 2ª edç., 1998, p. 42). A própria linguagem mítica, tida como posterior, seria constitutiva do processo de deturpação da pureza monoteísta original.

[8] Sobre isto, ver mais adiante.

[9] A pergunta acerca do “perfil diacrónico” dos textos históricos está relacionada com a pergunta acerca do provável momento histórico do seu surgimento. Na perspectiva diacrónica pergunta-se pelo surgimento, redacção, composição, etc. dos textos, independentemente da alocação temporal que o texto recebe na estrutura narrativa do cânon bíblico.

[10] Cf. Ariel Finguerman, «La Elección de Israel - estúdio histórico comparado sobre la doctrina del “Pueblo elegido”», coll. Tiempo Axial, José María Vigil, Ed. Abya Yala, Quito Ecuador, sept. 2008 [Seguem-se apenas algumas notas das páginas 19 e 20]. editorial@abyayala.org
«A partir do século XIV – com o erudito Joseph Ibn Kaspi ‒ referia-se a existência no Pentateuco de dois nomes diferentes para designar a divindade bíblica: Elohim – “Deus” em hebraico – e o Tetragrama [YHWH], vulgarmente traduzido por Jeová ou Yahvé. Quatrocentos anos depois, Jean Astruc, médico da corte francesa, e o professor alemão Johann G. Eichhorn lançaram quase simultaneamente a hipótese das duas fontes para a formação do Pentateuco, cada uma delas responsável por um dos dois nomes. Mais tarde, um jovem académico alemão, De Wette, identificou na sua tese de doutoramento uma outra fonte, independente das duas anteriores, que também estava no livro do Deuteronómio. Em 1853 a ideia adquiriu força com Hermann Hupfeld que ampliou as investigações estabelecendo as quatro fontes distintas que é possível encontrar no Pentateuco. Estudiosos do século XIX, em especial das universidades protestantes alemãs, fundamentalmente Julius Wellhausen, consolidaram a teoria conhecida pelo nome de ‘Hipótese Documental’ para explicar a formação do Pentateuco: as fontes Elohista (E) e Yavista (Y) seriam as mais antigas (a primeira composta durante o reino setentrional de Israel no século VIII a.C. e a segunda na Judeia no século IX a.C.), a Deuteronómica (D) estaria ligada à reforma religiosa do rei Josias (621 a.C.), enquanto a sacerdotal (P, da língua alemã “Priesterkodex”) reflectiria as preocupações da classe sacerdotal ligada ao Templo de Jerusalém no período pós-exílico babilónico. Actualmente existem muitas divergências entre os estudiosos no que se refere à datação e à autoria das fontes, mas, tal como assinala Antonio Fanuli em “Problemas e Perspectivas das Ciências Bíblicas”, a Hipótese Documental continua a ser substancialmente um modo válido de conceber a formação do Pentateuco e um instrumento imprescindível do estudo científico” (p. 14).» Quanto à questão de a ideia da “Eleição de Israel” surgir pela primeira vez no Pentateuco, as opiniões divergem: «O estudioso alemão Julius Wellhausen, um dos grandes nomes da Crítica Bíblica, defendeu como um dos pontos essenciais da sua obra que, quer a ideia da Aliança, quer a do monoteísmo eram concepções tardias da história israelita pelo que não seriam contemporâneas de Abraão e Moisés. Segundo a sua opinião, tais concepções do pensamento israelita teriam surgido no tempo dos profetas e posteriormente trasladadas, ficticiamente, para uma época anterior. Este autor alemão não desvaloriza os acontecimentos ocorridos aquando do Êxodo e concorda com a corrente maioritária que diz que foi ali que começou a história da nação hebraica. Contudo, segundo ele, a religião seguida por Moisés era semelhante a outras religiões do seu tempo, nas quais a relação do povo com o seu Deus era muito natural, directa, sem necessidade de elaborações complexas tais como a “Aliança”. Israel tinha a sua divindade, assim como Moab tinha a sua própria divindade, os filisteus tinham a sua, etc., etc., etc. Wellhausen escreve no seu “Prolegomena to the History of Ancient Israel” que “somente quando a existência de Israel começou a ser ameaçada pelos sírios e assírios é que os profetas Elias e Amós construíram uma divindade superior ao povo [com temor do povo] rompendo assim o laço natural que os unia, e inventaram, em seu lugar, uma relação dependente de condicionantes de cariz moral (p. 417).” Como apoio desta hipótese, pode observar-se que a palavra “berit” - pacto – aparece muito raramente nas fontes bíblicas anteriores ao século VII a.C., época dos profetas e que a formulação clássica do Pacto se situa no Deuteronómio, livro que data da mesma época.» [Este ponto sempre suscitou muita discussão – clicar aqui para ler mais] [É no período histórico destas profundas mudanças que adquire um papel, até aí original, “a função social dos templos”, cf. «Historia social del antíguo Israel» por Rainer Kessler, Ed. Sígueme, 2013]

[11] Sobre isto, ver especialmente Albert de PURY (Org.), «O Pentateuco em questão», Petrópolis: Vozes, 1996; e Jean Louis SKA, «Introdução à Leitura do Pentateuco». São Paulo: Loyola, 2003.

[12] Ver a respeito Erhard S. GERSTENBERGER, «Teologias no Antigo Testamento», São Leopoldo. CEBI/EST/Sinodal, 2002.

[13] Para uma visão de conjunto, ver Nota de pé-de-página N.5: cf. LANG, «Die Jahwe-allein-Bewegung».

[14] Abraham KUENEN, «The Prophets and Propheci in Ancient Israel». Londres, 1877, p.585. Tradução e destaque HR. Cabe ressaltar que o livro deste pesquisador surgiu alguns anos depois do inglês CharIes Darwin ter publicado o seu livro «Descent of Man» (1871).

[15] Ver Max Weber, «Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva», 3ª ed., Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994.

[16] V. NIKIPIIOWEZTKY, «Ethical monotheism», en: Daedalus, 1975, p. 80, Ver também Paul GARELLI e V. NIKIPROWETZKY, «O Oriente Próximo Asiático», São Paulo: Pioneira, 1982.

[17] Para uma visão crítica das contribuições, porém em sentido positivo, ver a obra Wolfgang SCHLUCHTER (Ed.), «Max Webers Studie über das antike Judentum. Interpretation und Kritik», (stw 340), Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1981.

[18] O primeiro volume do original alemão foi publicado em 1957 e o segundo, em 1960. No Brasil, esta obra foi publicada pela ASTE em 1973, recebendo nova edição, com revisão completa da tradução, em 2006.

[19] G. von Rad, «Teologia AT», vol. 1, p. 42.

[20] Sobre isso ver agora Thomas RÖMER, «A chamada história deuteronomista», Petrópolis: Ed. Vozes, 2008. Cf também, deste mesmo autor alemão, «A invenção de Deus» (existe edição em francês e em espanhol): “El judaísmo fue el primero en confesar la existencia de un único Dios que era, al mismo tiempo, dios de Israel y dios del universo. Esta idea de un dios único fue asumida después por el cristianismo y el islam. Sin embargo, si miramos más de cerca la Biblia judía y la Biblia cristiana, así como el Corán, encontramos textos que admiten la existencia de otros dioses. ¿Cómo ese dios de Israel, entre una pluralidad de divinidades, llegó a ser Dios? Tal es el enigma que esta inmersión en las fuentes del monoteísmo busca esclarecer, recorriendo a lo largo de un milenio las etapas de su «invención». ¿De dónde viene este dios? ¿Cuáles eran sus atributos y su nombre? ¿Cómo era venerado? ¿Por qué las otras divinidades desaparecieron? A la luz de la crítica histórica, filológica y exegética, y de los más recientes descubrimientos de la arqueología y la epigrafía, Römer ofrece las respuestas de una investigación apasionante, siguiendo las huellas de una divinidad de la tormenta y de la guerra erigido, tras su «victoria» sobre sus rivales, en dios único, universal y trascendente. Thomas Römer (Mannheim 1955), reconocido especialista en el Antiguo Testamento, ocupa la cátedra de «Entornos bíblicos» en el Collège de France.”

[21] Victor MAAG, «Kultur, Kulturkontakt und Religion», Gottingen: Vandenhoeck & Ruplecht, 1980, p. 111-119; 256-299. Esta postura recebeu críticas e revisões por outros autores académicos. Ver Fritz STOLZ, «Monotheismus in Israel», In: Othmar KEEL (Ed.) “Monotheismus im Alten Israel und seiner Umwelt». Freiburg, 1980, p. 155-163.

[22] Noman K. Gottwald, «As Tribos de lahweh. Uma sociologia da religião de Israel liberto - 1250-1050 a.C.». São Paulo: Paulus. 1986.

[23] GOTTWALD, «As tribos de Iahweh», p. 622. (Destaques de Haroldo Reimer): Para uma visão de conjunto, deve-se ler toda a parte do livro sobretudo “A religião da nova sociedade igualitária: modelos idealistas, estrutural-funcionais e cultural-materiais históricos”. Aí o autor desdobra as características principais do que ele considera o monojavismo no Israel pré-estatal.

[24] Gottwald, mais tarde, ao fazer uma reapreciação-revisão da sua obra, escreve a páginas tantas: “En su trabajo «Las fuentes del poder social», Michael Mann [“The Sources of Social Power. Vol. 1. A History of Power from the Beginning to 1760”, Cambridge University Press, Cambridge, pp. 34-72] demuestra ampliamente la evidencia arqueológica prehistórica de que las comunidades humanas repetidas veces desarrollan una organización social en un alto nível de estratificación, com organizaciones tribales redistributivas, pero rechazando un poder político centralizado. No se dio ninguna evolución social general más allá del horizonte neolítico del poder social disperso. En otras palavras: el Estado no aparece como un crecimiento «natural» de todas las sociedades estratificadas. Apareció, eso sí, en algunos puntos específicos en el espácio-tiempo, y a partir de ahí se expandió por medio de la imposición y la imitación. La gran esperanza es que esta «prisión de hierro» (M. Weber) del Estado y de clases sociales será superada algún dia. Ésta es la fuente del «optimismo silencioso» en que algunos lectores encuentran en «Las Tribus de Iahweh».” In «Revisión de “Las Tribus de Yavé”», Servicios Koinonia, ReLat 374.

[25] Obra publicada pela editora Vandenhoeck & Ruprecht, em Göttingen. Esta obra está em processo de tradução para português; já existe tradução para o espanhol.

[26] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», v. 1, p. 117-120.

[27] Milton SCHWANTES, «História de Israel, Vol. 1: Local e Origens». São Leopoldo, Oikos, 2008, p. 107ss.

[28] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», vol. 1, p. 119-120.

[29] Sobre isso, ver Lester L. GRABBE (Ed.), «Can a "History of lsrael" be written?», Sheffield Academic Press 1997.

[30] Israel FINKELSTEIN e Neil Asher SILBERMANN, «A Bíblia não tinha razão», São Paulo: A Girafa, 2003.

[31] A respeito ver Philip R. DAVIES, «In Search of ‘Ancient Israel’», Sheffield: Sheffield Academic Press, (1992), 2ª ed. 1995.

[32] Para uma revisão autocrítica dos seus trabalhos, cf. Norman K. GOTTWALD, «Revisitando as Tribos de Iahweh». In: Haroldo REIMER e Valmor da SILVA (Eds.), “Libertação-liberdade. Novas perspectivas”. São Leopoldo: Oikos, Goiânia: Ed. da UCG; ABIB, 2008, p. 37-48. («O Antigo Israel – espaço, fontes e historiografia»).

[33] Tivemos acesso à tradução deste trabalho publicado in LANG, «Der einzige Gott» [“O Deus único”], p. 9-46.

[34] Este talvez seja um ponto frágil da proposta do autor, na medida em que com isso se postula uma oposição entre “Israel” e “Canaã”, o que tendo em atenção os dados da investigação se torna cada vez mais questionável, uma vez que é difícil uma distinção clara, em termos étnicos, entre israelitas e cananeus.

[35] Sobre a Reforma de Josias, ver o trabalho de Shigeyuike NAKANOSE: «A Páscoa de Josias. Metodologia do Antigo Testamento a partir de 2Rs 22,1-23,30», São Paulo: Paulinas, 2000. (cf. «Monoteísmo e identidade»)

[36] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», v. 1, p. 226-290.

[37] Publicado pela Editora Chr. Kaiser, Gütersloh, 1997.

[38] Frank CRÜSEMANN, «Elias e o Surgimento do Monoteísmo no Antigo Israel», in “Fragmentos de Cultura”, v. 11, n. 5, Goiânia, 2001, p. 570.

[39] Este nome deve-se ao facto de o Prof. Othmal Keel haver sido na época o professor titular da disciplina de Antigo Testamento na Universidade de Freiburg, Suíça, sendo também o responsável pela maior coleção de artefactos iconográficos do antigo Próximo Oriente.

[40] Publicado em coedição por Universitätsverlag de Freiburg e por Vandenhoeck & Ruprecht, de Göttingen, em 1994.

[41] DIETRICH, «Einleitung», p. 23. Tradução de Haroldo Reimer.

[42] Uma exposição mais detalhada está sendo preparada pelo autor e deverá ser apresentada sob o título de «O Uno e a Diversidade ‒ Uma história do monoteísmo hebraico e da diversidade religiosa no antigo Israel».

[43] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», v. 1, p. 226.

[44] Frank CRÜSEMANN, «Elias e o surgimento do monoteísmo no Antigo Israel», Goiânia, p.77. A disposição sincrónica dos textos bíblicos apresenta a actuação de Elias como “histórica”, mas também é possível contar com a possibilidade de retroprojeções historiográfico-religiosas especialmente sobre a figura de Elias.

[45] Deve-se, porém, trabalhar com a suspeita de que os textos originários do profeta Oseias do século VIII a.C. possam ter passado por processos de releitura aquando da sua recepção no Reino do Sul, após a destruição do Reino do Norte, no sentido de acréscimos de partes de textos com polémicas advindas de épocas posteriores, por exemplo, do período pós-exílico, dirigidas talvez contra outras divindades como Achera. Sobre isso, ver Osvaldo Luiz RIBEIRO, «Ela não é minha mulher. O programa religioso da “golah” em Os 2,4-15», in: Fragmentos de Cultura, Goiânia, 2003, v. 13, n. 5, p. 1017-1046; e Pedrinho SECRETTI, «Deus ciumento: análise exegética de Oseias 2,4-15». (Dissertação). Goiânia, Universidade Católica de Goiás, 2006.

[46] Sobre isso, ver também Haroldo REIMER (Org.), «Oseias. Juízo, misericórdia, conversão». São Leopoldo: CEBI, 2005.

[47] Osvaldo Luiz RIBEIRO, «Nehushtan. Pesquisa exegética, fenomenológica e histórico-social sobre a origem, a supressão e o suporte social do culto à serpente de bronze em Israel com base em Nm 21,4-9; Is 6,1-7 e 2Rs 18,4». Dissertação, Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, Rio de Janeiro, 2002, p. 97.

[48] O. L. RIBEIRO, «Nehushtan», p. 70.

[49] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», v. 1, p. 283.

[50] CRÜSEMANN, «A Torá», passim.

[51] Assim CRÜSEMANN, «A Torá»; Haroldo REIMER e Ivoni RICHTER REIMER, «Tempos de graça. O jubileu e as tradições jubilares na Bíblia». São Leopoldo: CEBI/Sinodal, São Paulo: Paulus, 1999.

[52] Frank CRÜSEMANN, «Preservação da liberdade – O Decálogo em perspectiva histórico-social». Tradução de Haroldo Reimer. São Leopoldo: Sinodal/CEBI, 1995, p. 24.

[53] Sobre isso ver o trabalho de Ana Luísa CORDEIRO, «Asherah, a deusa proibida», in: Ivoni RICHTER REIMER [Org.], “lmaginários da Divindade”. São Leopoldo: Oikos, Goiânia: Editor da UCG, 2008, p. 25-48.

[54] CRÜSEMANN, «A Torá», p. 159-283; ALBERTZ, «Religionsgeschichte», v. 1, p. 304-360.

[55] Sobre isso, ver Haroldo REIMER, «Não verás o corpo de Deus. Anotações sobre a corporeidade de YHWH na Bíblia Hebraica», in Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, n. 38, Petrópolis, 2001, p. 45-54.

[56] J. Severino CROATTO, «A Deusa Aserá no antigo Israel. A contribuição epigráfica da arqueologia». Revista de interpretação Bíblica Latino-Americana, n. 38, Petrópolis, 2001, p. 32-44, esp., p. 36-39.

[57] ALBERTZ, «Religionsgeschichte», insiste muito na análise da dimensão da “piedade pessoal” (“persönliche Frömmigkeit”).

[58] J. Severino CROATTO, «A sexualidade da divindade. Reflexões sobre a linguagem acerca de Deus», in Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, n. 38, Petrópolis, 2001, p.25. Mercedes Lopes: «Género e discurso religioso».

[59] Ver também 2º Isaías 40,25 [«A quem pois me comparareis que seja igual a mim?»]; 43,10b-11 [«...eu é que sou Deus. Antes de mim, não havia deus nenhum, e depois de mim também não haverá. Eu e só Eu é que sou o Senhor.»]; 44,6b-8b [«Eu sou o primeiro e o último. Não há outro Deus além de mim (…) acaso há outro Deus além de mim? Não há outro rochedo, que Eu saiba»]; 46,9 [«Eu sou Deus e não há outro.»].

[60] Haroldo REIMER, «Toda a criação. Bíblia e ecologia», São Leopoldo: Oikos, 2006, p. 19-44.

[61] Élcio SANT'ANNA, «Os mitos cosmogônicos no Antigo Testamento», (Dissertação) - Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, Rio de Janeiro, 2002; ver especialmente RIBEIRO, «Cosmogonia de inauguração».

[62] CROATTO, «A sexualidade da divindade», p. 25.

[63] J. Severino CROATTO, «Quem pecou primeiro? Estudo de Gênesis 3 em perspectiva utópica», in Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, n. 37, Petrópolis; São Leopoldo, 2000, p. 15-27.

[64] Sobre isso, cf. o importante estudo de Renate JOST, «Fauen, Männer und die Himmelskönigin [“Mulheres, Homens e a Rainha do Céu”], Exegetische Studien», Güterloh: Chr. Kaiser; Gütelsloher Verlagshaus, 1995. Ver também Erhald S. GERSTENBERGER, «Jahwe - ein patriarchaler Gott?», Stuttgart: Kohlhammer, 1988, p.27-37 [lschtar, die HimmeIskönigin].

[65] Silvia SCHROER, «A justiça de Sophia: tradições sapienciais bíblicas e discursos feministas». Concilium, Petrópolis, n. 288, p. 69-81 [nas pp. 5/77-86, 717-727, N. 288 da versão em castelhano: cf. R.I.T. “Concilium”, N. 288, EVD, Noviembre 2000: «En el poder de la Sabiduría: Espiritualidades Feministas de Lucha», (eds.) E. Schüssler Fiorenza y Mª Pilar Aquino]. Ver também o valioso estudo de Mercedes LOPES, «A mulher sábia e a sabedoria mulher». São Leopoldo, Oikos, 2007.

[66] CROATTO, «A sexualidade da divindade», p. 20. Ver também Ana Luísa CORDEIRO, «Recuperando o imaginário da Deusa: estudo sobre a Divindade Aserá no Antigo Israel». (Dissertação) Goiânia, Universidade Católica de Goiás, 2009.

(Fim)